São Paulo, segunda-feira, 24 de outubro de 2011

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Dependentes usam chá do Daime para se livrar de drogas

Casos ainda estão em estudo pelos médicos, que não sabem qual é o efeito da bebida psicoativa sobre o vício

Usuário de cocaína diz que vontade de se drogar sumiu após o chá; médico alerta para risco de morte

Caio Guatelli/Folhapress
Bebida é preparada em centro em Mogi das Cruzes, SP

CLÁUDIA IZUMI
DE SÃO PAULO

Alcoólatras crônicos e usuários de drogas ilícitas, que se identificavam como "sem solução", afirmam terem abandonado décadas de vício com o chá ayahuasca, conhecido como Daime.
O tratamento com o chá não é divulgado publicamente. As recomendações correm de boca em boca só entre os membros de grupos religiosos que usam a bebida, como o Santo Daime e a União do Vegetal, além de dissidentes.
Médicos e cientistas ainda estudam os efeitos da bebida para saber a causa da suposta eficácia contra o vício.
Dois ex-dependentes afirmaram à reportagem que tomaram conhecimento do chá por indicação de psiquiatras que frequentavam os rituais (para entrar nas seitas, o novato geralmente é apresentado por um membro).
"Pessoas que ingressaram nos grupos do 'vegetal' milagrosamente largaram a bebida depois de 30 a 40 anos de alcoolismo", diz o psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, do Proad (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes), da Unifesp.
O médico, que não indica o chá como tratamento, afirma que o próprio ritual pode ter algo a ver com a recuperação dos dependentes.
"Sabemos que o contexto religioso protege as pessoas das drogas, mas suspeito que não seja somente isso.
Há um efeito químico nisso tudo, que ainda não foi pesquisado", diz o psiquiatra.
O doutor em farmacologia João Ernesto de Carvalho, coordenador da Divisão de Farmacologia e Toxicologia do CPQBA (Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas), da Unicamp, também não tem explicações para justificar o fim da dependência.
"Sob o ponto de vista farmacológico, a pessoa teria de tomar doses diárias do chá, como se ele fosse um antidepressivo, o que não ocorre." Os rituais são realizados, em média, duas vezes ao mês. "Não sei explicar como parei", diz o publicitário Benito Alvarez Rizi, 55, que começou a tomar o chá há cinco anos.
Antes do processo de limpeza, Rizi cheirava cocaína e entornava bebida alcoólica a ponto de ficar cinco dias seguidos acordado. "Desde que comecei a tomar o 'vegetal', a vontade de me drogar sumiu da minha cabeça."
A dúvida é se a ayahuasca pode ter um efeito adverso e criar, por sua vez, uma nova dependência.
"O que pode existir é a dependência psicológica", diz Xavier. "Não é uma droga do prazer ou que dê 'barato' como a cocaína, o álcool ou outra substância. Não é uma experiência agradável que as pessoas queiram repetir."
Diarreia, vômito, náusea e formigamento estão entre alguns dos efeitos colaterais.

USO INAPROPRIADO
O psiquiatra Arthur Guerra, coordenador do grupo de estudos de álcool e drogas da Faculdade de Medicina da USP, o uso do chá como tratamento para dependência não é apropriado.
"Como uma substância com alucinógena vai tratar dependentes? Em vez de você ajudar a pessoa, você pode matá-la."



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