São Paulo, quarta-feira, 26 de novembro de 2008

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Dobra sobrevida de pacientes com Aids

Levantamento do Ministério da Saúde indica que o tempo passou de 4 para 9 anos entre diagnósticos de 1995 e 1999

Casos da doença registrados na população com 50 anos ou mais aumentaram 60% de 2000 a 2006; no geral, o crescimento foi de 7%

Henrique Manreza/Folha Imagem
José Araújo, que diz que falta investir na qualidade do tratamento

ANGELA PINHO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Karina Ferreira da Cruz, 21, descobriu que tinha Aids em 1996, quando viu na televisão que a medicação que tomava não era para aumentar sua estatura, como sua avó dizia, mas para o tratamento da doença. Aos nove anos, parou de fazer planos para o futuro. Achava que não iria viver muito.
Hoje, recém-casada e monitora de uma ONG, Karina ilustra estatísticas que mostram que os portadores da doença vivem cada vez mais. De acordo com uma pesquisa divulgada ontem pelo Ministério da Saúde, a sobrevida dos pacientes mais do que dobrou para aqueles que foram diagnosticados entre 1995 e 1999.
Um estudo com pessoas diagnosticadas em 1995 e 1996, acompanhadas até 2000, mostrou que a sobrevida mediana dos doentes de Aids era de quatro anos e dez meses. Trabalho semelhante realizado com pacientes diagnosticados em 1998 e 1999 no Sul e no Sudeste e acompanhados até o ano passado mostrou que 59,4% deles continuavam vivos após nove anos. As regiões concentravam 83% da epidemia na época.
O aumento é explicado pela diretora do Programa Nacional de DST (Doenças Sexualmente Transmissíveis) e Aids, Mariângela Simão, por três fatores: diagnóstico mais precoce, ampliação do acesso aos medicamentos e disponibilidade de drogas mais eficazes.
Coordenador do Unaids (braço da ONU para HIV e Aids) no Brasil e ex-diretor do Programa Nacional de DST e Aids, Pedro Chequer acrescenta ainda o fato de hoje serem mais disseminadas as informações sobre a doença. "O diagnóstico em mulheres, por exemplo, não era usual. A Aids era vista como coisa de usuário de droga e homossexual", diz.
Chequer participou de uma das primeiras pesquisas sobre a sobrevida de pacientes com Aids. Ele acompanhou pacientes que descobriram a doença nos anos 1980. Eles viviam, em média, apenas cinco meses após o diagnóstico.
"Era muito triste. Eu falava que, se ganhasse por atestado de óbito, seria milionária", conta a médica Rosana Del Bianco, do Instituto Emílio Ribas e do Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids de São Paulo, que atendeu os primeiros casos da doença na capital.
Ela relata que, naquele período, havia entre os próprios profissionais de saúde temor de tratar os pacientes, o que só se dissipou com a chegada dos medicamentos contra o vírus.
Isso porque, até a chegada do AZT (medicamento contra a progressão da deficiência imunológica), no final da década de 1980, só era possível tratar as doenças causadas pela redução da resistência do organismo, como tuberculose.
O maior avanço científico ocorreu em 1996, com os coquetéis de medicamentos, que começaram a ser distribuídos no SUS (Sistema Único de Saúde) no final daquele ano.

Mais velhos
A incidência de Aids na população com 50 anos ou mais cresceu 60% de 2000 a 2006, segundo os dados do Ministério da Saúde -80% só entre as mulheres. Na população geral, o crescimento foi de 7%.
No ano passado, foram registrados 4.715 casos em pessoas com mais de 49 anos. O número deve ser ainda maior, porque muitas notificações são enviadas com atraso.
Por causa disso, o Ministério da Saúde iniciou uma campanha para esse público incentivando o uso de preservativo. "O pessoal fica fantasiando que coroa não transa, só faz tricô e joga baralho. Na verdade, faz tricô, joga baralho e depois ainda rola muita coisa", disse o ministro José Gomes Temporão, 57.
Outro público que preocupa o governo é o dos jovens gays, em que a incidência também cresce desproporcionalmente.
De acordo com o ministério, considerando todas as faixas etárias e orientações sexuais, foram notificados, em 2007, 92 novos casos de Aids por dia no país, que tem uma epidemia considerada estável em patamares altos. No Sudeste, há uma tendência de queda e, no Norte e Nordeste, de alta.


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