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Remédio controlado vira festa na balada
Medicamento "tarja preta", indicado para deficit de atenção, é consumido em casas noturnas como estimulante
Médicos alertam para riscos; Anvisa diz que monitora sites e redes sociais para impedir a venda clandestina
GUILHERME GENESTRETI
DE SÃO PAULO
Para "aproveitar" a balada, o enfermeiro André (nome fictício), 24, costumava
tomar comprimidos de ecstasy. Há três meses, trocou a
droga ilícita por Ritalina, medicamento vendido em algumas farmácias apenas com
receita, que fica retida.
Apelidada de "Rita" na
noite, a droga indicada para
tratar deficit de atenção e hiperatividade vem sendo usada como estimulante. Sua
base é o metilfenidato, de
composição similar à anfetamina, que estimula o sistema
nervoso central.
"Você se sente gostoso,
bonito. Dá sensação de poder
e um arrepio bom, como se
você fosse ter um orgasmo",
descreve André. Ele diz aspirar o farelo do comprimido
para sentir o "barato".
O enfermeiro diz ter conhecido os efeitos entorpecentes da Ritalina com amigos médicos.
Antes de saírem para a balada, eles espremem os comprimidos com uma colher e
guardam o pó num saquinho. "Uma cartela com 30
serve para quatro pessoas
cheirarem a noite toda."
O aumento da sede, um
dos efeitos do remédio, costuma ser saciado com vodca.
"Daí tudo melhora: a música
fica mais legal e as pessoas ficam mais bonitas", afirma.
Ele admite que, sob o efeito da droga, fica com até dez
pessoas numa mesma noite.
Quando volta para casa, a
agitação é tanta que só consegue dormir se tomar Rivotril, calmante que também só
pode ser comercializado com
receita médica.
Na casa noturna que ele
costuma frequentar, no bairro da Lapa, em São Paulo, é
comum ver um aglomerado
de jovens descamisados dançando espremidos perto das
caixas de som. "Aquilo é a
Faixa de Gaza", descreve André: "Só tem droga".
A reportagem da Folha
acompanhou uma noite nessa casa noturna. Lá, o estudante de publicidade César,
21, admitiu já ter usado Ritalina na balada: "Sou tímido.
Quando tomo [a Ritalina], fico com mais coragem de chegar perto das pessoas", disse.
O rapaz admite que não é
difícil consegui-la: "Você
acha vendendo na internet".
As histórias de André e de
César não são casos isolados.
Segundo Arthur Guerra,
coordenador do Grupo Interdisciplinar de Estudos sobre
Drogas do Hospital das Clínicas, é comum encontrar jovens tomando medicamentos de forma recreativa.
"Eles querem é sentir uma
coisa diferente", diz o psiquiatra. Guerra alerta para os
efeitos colaterais da "Rita":
taquicardia e até quadros de
paranoia, dependendo do
ambiente em que estiver e da
predisposição da pessoa.
SEM CONTROLE
Elisaldo Carlini, diretor do
Cebrid (Centro Brasileiro de
Informações sobre Drogas
Psicotrópicas, da Unifesp),
lamenta não haver ainda levantamento sobre esse uso
do medicamento, mas confirma que os casos são comuns.
Segundo ele, apesar da
venda controlada, não é difícil comprar o remédio: "Tem
quem importe, quem falsifique receita. O que não falta é
criatividade para venderem
de forma ilegal", afirma.
Adilson Bezerra, chefe de
segurança institucional da
Anvisa, informa que tanto a
venda irregular quanto clandestina desses medicamentos são reprimidas pela Vigilância. A agência mantém
convênio com a Polícia Federal para monitorar sites e comunidades de redes sociais,
além de fiscalizar a venda de
remédios controlados nas
farmácias do país.
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