São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2008

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QUE FIM LEVOU

Beleza pura

por PAULO SAMPAIO

Aos 58, o "fino que satisfaz" Pedrinho Aguinaga lembra seus tempos de homem mais bonito do Brasil

Pedrinho Aguinaga foi eleito "o homem mais bonito do Brasil" em 1970, numa época em que a beleza masculina ainda era naturalista. Para participar do concurso, promovido pelo programa de auditório de Flávio Cavalcanti (1923-1986), Aguinaga não tomou "bomba" para ficar forte nem depilou o peito. Nunca se submeteu a sessões de bronzeamento artificial, procedimentos estéticos para retoques no rosto ou implante de cabelos. Ele era, para usar um termo eternizado por Caetano Veloso, "beleza pura".

A diferença em relação aos galãs produzidos em série de hoje é que Pedrinho, agora com 58, pôde otimizar o título por um tempo muito maior. Ainda hoje ele é lembrado pelo slogan "o fino que satisfaz", trocadilho de gosto duvidoso que aludia à sua magreza e ao cigarro Chanceller, do qual foi garoto propaganda em 1976.

A promoter carioca Anna Maria Tornaghi se lembra da época. "O Pedrinho era um encanto, lindo, carismático, as pessoas o adoravam, desde o povo de sociedade aos políticos graúdos. Não sei exatamente o que ele fazia, mas era de família boa. Todo mundo o convidava pra tudo, porque levava glamour a qualquer festa."

"Eu era o único que fazia sucesso sem ser da Globo. Estava no mesmo patamar que Marcos Paulo, Denis Carvalho e Tony Ramos"

Sem jamais ter pegado "oficialmente" no batente, Pedrinho fazia bicos em bailes de debutantes, comerciais de TV e alguns filmes. Como não tinha uma ocupação fixa, estava sempre disponível para diversão em qualquer parte do mundo, com as mulheres mais bonitas -e as mais ricas também.

"Conheci a Maria Callas no Brasil, quando ela tinha acabado de se separar do [Aristóteles] Onassis e veio para a Bahia com o [cineasta italiano Pier Paolo] Pasolini. Tempos depois, eu fui a Nova York e ela mandou me chamar para almoçar em sua suíte no [hotel] Pierre. No fim, ela disse: 'Antes de ir embora, Pedro, peraí', e começou a cantar uma ária. 'Lararirárárááá', e os cachorros dela cantando junto."

ATÉ DEMI MOORE

Pedrinho coleciona troféus. Chega a salivar contando seus casos com mulheres como a atriz Marisa Berenson, a cantora Liza Minelli e a então mulher de Mick Jagger, Bianca. "Essa aí, coitada, ficou maluquinha, me perseguiu pelas ruas de Londres de perna quebrada! Rolou assim mesmo." Demi Moore ele diz ter conhecido "quando ninguém sabia quem ela era" (a atriz estava no Brasil para as filmagens de "Feitiço do Rio", em 1984). "Fomos a Angra em uma [camionete] D-20 sem freio, uma aventura." Namorou? (pausa) "Namorar não é o termo", diz, entre o infantil e o cafajeste.

E as brasileiras? "Ihhhh. Tu tem um catálogo aí? Cara, eu era o único que fazia sucesso sem ser da Globo. Tava no mesmo patamar que o Marcos Paulo, o Denis Carvalho, o Tony Ramos."

Pedrinho Aguinaga não tinha o menor problema em ser homem-objeto. Fazia a alegria de socialites do eixo Hippopotamus-Studio 54 com o maior prazer. Sempre gostou de um sobrenome.

Adora contar que circulava em Nova York com a princesa "rata de festa" Diane Von Fürstemberg e o marido, Egon. "E no dia em que eu peguei carona com o Onassis? Ele foi ao lado do motorista e eu atrás, com a Marisa [Berenson], a [socialite] Florence Grinda e a ['jet-setter'] Elza Martinelli."

Pedrinho é "ator registrado no sindicato". Fez participações em dois filmes dos Trapalhões e em "Navalha na Carne" (1997), com Vera Fischer; "Matou a Família e foi ao Cinema" (1991); e "Rio Babilônia" (1982), com Cristiane Torloni e Denise Bandeira, no qual aparece pelado -todos do cineasta Neville d'Almeida.

"Ele é um ator muito interessante e, mais do que isso, uma personalidade. Fico impressionado como continua mal aproveitado. Ninguém o chama para fazer filmes, novelas", admira-se o cineasta. Na opinião de Neville, "ele ainda está muito

bonito, mas nunca tirou proveito disso, não é de fazer lobby nem de puxar saco de ninguém".

VIDA NA FLAUTA

Monique Evans, mãe de Armando, 30, único filho de Pedrinho, tem outra visão daquilo que Neville considera louvável. Para ela, o pai de Armando sempre foi acomodado.

"Nunca consegui explicar a falta de vontade dele na vida. Era inteligente, talentoso, tinha tudo para ser bem-sucedido, mas acho que faltava coragem para investir seriamente em alguma coisa", diz.

O sucesso na profissão de "homem mais bonito do Brasil" foi possível porque Pedrinho jamais brigou com o título. Ao contrário, abraçou-o sem a menor culpa.

"Adorava dançar... E patinar também", diz ele, levíssimo.

Fala Armando Aguinaga, o filho: "Meu pai era bonito, conseguiu algumas coisas com isso e está satisfeito. Nunca quis provar nada, nem fez o menor esforço para ir além daquilo. Eu também não cobrei o fato de ele ser tão sossegado. Sabia que ele não mudaria".

Monique e Pedrinho se conheceram quando ela ainda era casada com o primeiro marido, Oswald Evans, do qual ficou viúva. "O Pedro me azarava quando eu ainda era casada, mas nunca dei mole. Aí meu marido morreu, e ele me conquistou com coisas bonitinhas. Dava carrinhos de brinquedo dizendo que não podia me dar um de verdade. Fiquei grávida, tive o filho, mas ele só aparecia de dois em dois meses, até que eu disse que não precisava mais vir", conta.

FILHO DE BARÃO

Parte da auto-indulgência de Pedrinho pode ser explicada pela sua própria história. Filho de um dentista "que nunca exerceu a profissão" e de uma americana "maravilhosa", ele se gaba de ter tido um pai "muito mais bonito".

Apelidado de "barão", Fernando Aguinaga reunia, segundo Pedrinho, os seguintes predicados: "Era amicíssimo do [colunista social carioca] Ibrahim Sued, conhecia bons vinhos, andava impecavelmente vestido e tinha uma conversa apaixonante. Circulava entre pessoas de prestígio, como [os ex-presidentes] Juscelino e o Tancredo. Conheceu minha mãe, que era da oficial da marinha mercante americana, em uma viagem a Nova York".

Fernando herdou dos pais alguns apartamentos em Copacabana: "Minha bisavó morava no parque Lage [casarão tombado no bairro do Jardim Botânico] e só bebia água em copo de cristal".

Na adolescência, Pedrinho foi matriculado em um colégio interno, "porque era um marginalzinho". Mais tarde, passou em direito na PUC. "Fiquei um tempão lá, mas não me formei." Despontava a vocação para bon vivant.

O ÚLTIMO PLAYBOY

No momento, Pedrinho está lendo a biografia de Porfírio Rubirosa ("O Último Playboy"), que nasceu pobre na República Dominicana e se tornou milionário apenas se casando com mulheres ricas, como as herdeiras americanas Doris Duke e Barbara Hutton.

"Rubirosa era um duro megalomaníaco, perseguia uma meta, queria ficar milionário como o [armador grego Starvos] Niarchos. Eu não, sempre gostei só de me divertir", diz, puxando mais um trago.

Na entrevista, ele usa black

jeans, tênis, camisa de manga comprida com um suéter amarelo.

"Suéter é o cacete!... Cashmere!", ele explica. "Sou mais Jaguar que Mercedes, entende?"

Hoje, Aguinaga vive sozinho em um apartamento de classe média que herdou, em Copacabana. A mãe mora no mesmo prédio. Ele não tem carro e se veste com um guarda-roupa bastante reduzido; sua renda vem basicamente do que sobrou da herança do pai.

Mas não existe fracasso, nem arrependimento ou sensação de desperdício. "Se eu não fosse tão bonito? Não teria esse trânsito social, viveria de outro jeito. Mas estava escrito."

Assim, confortavelmente instalado no papel de "o homem mais bonito do Brasil", Pedrinho Aguinaga só precisou cobrar da vida o que lhe era de direito.

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