São Paulo, domingo, 19 de dezembro de 2010

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FINA

Natureza viva

por CRISTINA RAMALHO

A designer paulista Julia Krantz cria móveis e esculturas de madeira com formas orgânicas e toque suave, que convidam ao aconchego

Mãe psicóloga, pai psiquiatra. E Julia achou mais fácil entender o comportamento das árvores. Foi mexer com madeira, aprender a identificar de onde vem e como reage cada espécie, depois transformar pedaços de troncos em mobília ou escultura.
"Sempre gostei de trabalhar com as mãos", diz Julia Krantz, 43, designer de móveis orgânicos, de linhas arredondadas, formas ao mesmo tempo leves e sólidas.
Ela é delicada, fala baixo. Mas não se acanha de carregar pedações de madeira, mexer em serra, dar ordens aos homens que tentam protegê-la do trabalho pesado. "São poucas as mulheres marceneiras, então tem um cavalheirismo bacana aqui, o pessoal tenta me preservar de fazer força".
A paixão por essa matéria-prima vem desde pequena. Aos 10 anos, desenhou uma cama com degraus, igualzinha à que viu John Lennon se deitando no "Help", o filme dos Beatles. "Ele descia uns degraus, a cama ficava abaixo do solo. Eu inventei uma cama com um tablado onde eu subia e descia", conta.
Ela cursou arquitetura na FAU-USP, e se especializou em madeira. No terceiro ano inventou uma cadeira, Tripé, seu passaporte para o mundo dos móveis.
Sofás arredondados, em ripas curvadas, formas que escorregam, sinuosas, e convidam ao aconchego. São os bancos que ela batizou de Bigorna, feitos em sucupira. Mesmo o mais distraído já deve ter visto essas peças no hall do Sesc Pinheiros.

MESTRES ZEN
O prestigiado mestre Hugo França dá o seu aval. Hugo e Julia se complementam à la yin e yang. Ele deixa a natureza falar por si: pega um pedaço de tronco e enxerga mobília no improvável. Ela segue o caminho inverso: vai somando folhas de madeira laminada, ou contorcendo as peças, numa técnica que recria formatos de troncos. "Julia é um contraponto ao que faço. Nossos trabalhos se correspondem muito, e gosto disso", disse Hugo.
Julia abriu sua primeira marcenaria há dez anos, mas fez uma pausa de dois para morar na Holanda acompanhando o marido.
Na volta ao Brasil, foi conhecer o designer japonês Morito Ebine, que admirava à distância . Julia virou o gafanhoto do mestre Kung Fu. Ele ensinou Julia que era preciso entender o comportamento da madeira, e deixar que ela revelasse o que poderia ser.
Juntos, escrevem um livro técnico sobre marcenaria. Juntos, passam horas conversando em Santo Antônio do Pinhal, onde ele vive e ela e o marido compraram o sítio ao lado, os três filhos correndo do lado com a cachorra, Lucy.
Assim vão surgindo a cadeira Suave, o sofá Güel, a cadeira Mir (ao lado), além das peças utilitárias, maciças, e das customizadas. A psicologia pode explicar só se voltar aos desejos da infância. Quando a mãe, de férias, ligou da Alemanha para saber se as filhas queriam fantasias, Julia recusou a de fadinha. Queria ser Robin Hood. Sua alma é da floresta.

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