São Paulo, domingo, 26 de setembro de 2010

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FINO

Quero ser grande

por VITOR ANGELO

Estilista desde os 12 anos, PEDRO LOURENÇO, rebento de Gloria Coelho e Reinaldo Lourenço, está em fase de crescimento

"Você desenha a parte de cima que eu desenho a parte de baixo", disse Gloria Coelho a seu filho, Pedro Lourenço, então com 15 anos. Eles participavam da exposição coletiva "Conflitos e Caminhos", no Sesc Pompeia, em São Paulo, quando foram convidados para, em dupla, construir um único look.
A lembrança desse episódio surgiu durante a visita de Serafina aos domínios do garoto, agora com 20 anos. Ele ocupa um espaço nos fundos do ateliê de sua mãe, mas ali há outra luz, outro estilo. Com grandes janelas, uma biblioteca e uma mesa imensa, o lugar é todo branco, com muitos espelhos. "Não aguento mais ver minha imagem refletida. Aqui é a prova máxima de que não sou narcisista", diz Pedro, rindo.
Filho de dois dos maiores estilistas do país, Gloria Coelho e Reinaldo Lourenço, Pedro Augusto Lourenço teve seu nome escolhido como homenagem ao avô paterno e ao bisavô materno, ambos chamados Pedro. "Augusto coloquei em referência ao imperador romano", diz o pai, Reinaldo, ao telefone.
Pedro Augusto sabe muito bem quais são suas origens e de onde vêm suas influências. "Tem um lado da minha mãe de ter trazido jogos de videogame, brinquedos funcionais, ser louca por computador, ter mil livros de planetas desconhecidos, todo esse universo digital-tecnológico-espacial. E tem o outro lado, que vem do meu pai, que é essa noção do que vai ser o ‘next’. Daqui a seis meses, todo mundo vai usar tal silhueta, tal proporção. Isso eu peguei dele", diz.
Com os pais, desde cedo, aprendeu a base clássica da feitura de uma roupa. "Eu cresci envolvido por esse ambiente, e quando eles perceberam, era tarde demais para me tirar."
"Pedro é um bom companheiro, tem um olhar novo, vontade e paixão. Uma imagem que tenho dele é a alegria que sentiu quando organizou, ainda criança, um desfile em casa para os amigos", lembra o pai.
Frequentador das passarelas desde pequeno, Pedro sempre foi considerado parte integrante do chamado "mundinho". Reza a lenda que adorava fazer roupas e vestir os empregados. "Eu não me lembro disso, mas tudo era motivo para fazer roupa quando eu era criança. Pegava as telas da minha mãe e ia recortando, criando algo meu. Era uma época em que ela estava muita influenciada pelo império, Napoleão, Josefina e vestidos longos, que eu vestia em mim mesmo e andava pela casa."
Foi graças a essa personalidade teatral que Pedro conheceu seu braço direito, musa e amiga, Mariana Gatti, 28. Aos risos, ela lembra que, "no primeiro encontro, ele fingiu desmaiar e me deixou numa super saia justa. Eu estava sozinha com ele e fiquei desesperada".
Pedro debutou na moda aos 12 anos, quando apresentou oficialmente sua primeira coleção para a segunda marca de sua mãe, a Carlota Joakina, na edição de 2003 da São Paulo Fashion Week. Em 2005, estreou a grife com seu nome. E, em 2007, cozinhou peixes para criar uma coleção.
Sua linha de verão tinha o universo marinho como inspiração, e ele buscava a imagens de peixes para estampas e bordados. Mas não bastava usar o Google, não bastou usar uma foto tirada na peixaria ou no aquário de Santos. "Tínhamos de ‘viver’ o peixe", conta Mariana. "Fomos ao Mercado Municipal comprar peixes inteiros e ao pet shop atrás de peixes dourados. O da peixaria, já morto, teve de ser cozido por horas, para que a pele soltasse naturalmente. E o dourado foi escaneado, para ter as nuances de sua pele transformadas em imagens. O Pedro de máscara de cirurgião e eu chorando. Dramático! Essas imagens geraram desenhos lindos", lembra ela.
Dos experimentos com peixes na adolescência aos elogios da crítica de moda internacional, no ano passado, depois de sua estreia no calendário da semana de moda de Paris, Pedro mudou. Fisicamente, inclusive. Espichou, emagreceu, ganhou um ar sério, adulto. Para o desfile em Paris, uniu-se à KCD (uma das assessorias mais importantes no mundo da moda) e montou uma primeira fila de designer veterano: a editora da revista "Vogue Paris", Carine Roitfeld, a jornalista britânica Hillary Alexander, do jornal "Telegraph", e o editor europeu da "Vogue America", Hamish Bowles, entre outros.Seu mentor em Paris foi Alber Elbaz, responsável pela recuperação do prestígio da lendária marca francesa Lanvin. "Em 2006, ele me pediu para fazer uma coleção de moda praia e me chamou para trabalhar no backstage da Lanvin. Por isso acabei indo pra França."

A BASE DA CULTURA
Pedro é falante, simpático, mas, assim como não foi uma criança padrão, também não é um jovem convencional. Em vez de qualquer banda de rock modernosa, prefere ouvir Bach e Beethoven. E fala sem pedantismo. "É a base da cultura. Precisamos conhecer e entender a base das coisas." Não se interessa por reality shows e o que considera pop são os filmes dos anos 1980 do diretor Brian de Palma.
Pergunto o que ele diria aos críticos que, durante anos, o acusaram de copiar Nicolas Ghesquière, o estilista da marca Balenciaga. "Minha resposta está nesse meu primeiro desfile em Paris. E eu prefiria que eles acreditassem que eu copiava um gênio do que um medíocre."
Sobre sua moda hoje, diz que é "gráfica, luxuosa, espacial. É uma expressão agressiva, forte, e ao mesmo tempo feminina".
Essa imagem de uma mulher forte deve surgir novamente em 1º de outubro, na Escola de Belas Artes, em Paris, às 19h30, quando acontece seu próximo desfile. Pedro silencia sobre o que irá mostrar. Depois de alguma insistência, diz que vai pesquisar mais a parte de baixo do corpo da mulher, exatamente aquela que deixou para sua mãe fazer, cinco anos atrás.

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