São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 2011

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FINA

Simplesmente Jodie

por FERNANDA EZABELLA, de Los Angeles

Perseguida por maníacos (na vida real) desde que estrelou "Taxi Driver", Jodie Foster é uma das atrizes mais reclusas de Hollywood. Prestes a lançar seu terceiro filme como diretora, ela recebeu Serafina para uma conversa franca num quarto de hotel

Jodie Foster estará, em breve, num cinema perto de você. Isso, convenhamos, não configura uma grande novidade – aos 48 anos, a atriz celebra 45 de carreira em 2011. Novidade mesmo é estar diante de seus inconfundíveis olhos azuis e de seu nariz, caprichosamente pontudo, num quarto de hotel.
Duplamente premiada com o Oscar, Jodie Foster é uma das atrizes mais reclusas de Hollywood. Avessa a fotografias, fala pouco de sua vida pessoal, menos ainda de seus amores –e até hoje, imagine a curiosidade dos tabloides sensacionalistas, não se sabe quem é o pai de seus filhos.
Apesar dessa conhecida aversão a tocar nos assuntos que só lhe dizem respeito, Foster parece justificar-se ao conversar abertamente sobre "a solidão que cultiva desde menina", quando passou a sustentar a família com comerciais e seriados de TV –o primeiro, aos 3 anos, foi um anúncio do protetor solar Coppertone.
"Esse sentimento nasceu comigo", coloca a mão no peito, com um quê de dramática. "Vem também do fato de eu ter sido uma criança meio prodígio", continua a atriz, que tem três irmãos mais velhos e foi criada apenas pela mãe. "Aos 5 anos, entendia as emoções dos adultos de uma forma complexa. Isso foi um presente incrível mas também um fardo muito grande."
Jodie Foster termina em maio o período de três anos em que esteve longe das telas.
Estreia, nos Estados Unidos, "Um Novo Despertar", sua terceira investida como diretora de cinema. Também atua, claro, ao lado do amigo e encrenqueiro Mel Gibson.
"Um Novo Despertar" é um drama cuja história, de tão peculiar, nos leva a duvidar que alguém em sã consciência possa ter investido em tal roteiro. A trama é tão descabida que fica difícil comprar o tom realista do filme. Nele, um executivo prestes a se matar (Gibson) encontra alento num fantoche de castor (!) que acha no lixo. O sujeito passa a se expressar pelo brinquedo. A partir desse fato insólito, sua vida renasce.
Quando "Um Novo Despertar" estava em fase de pós-produção, Gibson meteu-se na sua mais recente confusão –uma briga com a então namorada russa Oksana Grigorieva, que o acusou de violência doméstica. A sentença chegou neste mês: o ator pegou três anos de liberdade condicional.
A estréia de Jodie Foster como diretora aconteceu em 1991, aos 28 anos, com o elogiado "Mentes que Brilham" – depois, em 95, veio "Feriados em Família".
"Tenho sorte por alguém me pagar para fazer algo que amo e que, no fundo, faria de graça. No final, só quero um DVD para mostrar para a minha mãe", diverte-se. Era a mãe, aliás, quem escolhia seus papéis até os 16 anos. Também costumava levar a filha aos cinemas que exibiam diretores europeus, como Chabrol, Truffaut, Fellini.
Como atriz, Foster desacelerou o ritmo de produção desde meados dos anos 90 –passou a fazer "apenas" um filme por ano, em média. "A maioria dos atores não tem vida própria, vão de filme em filme. Fiz isso quando era jovem. Hoje não tenho as mesmas ambições", diz. "Faço por amor mesmo."
Jodie trabalhou com diretores do quilate de David Fincher, Spike Lee, Robert Zemeckis, Neil Jordan e Woody Allen. Nenhum deles, no entanto, lhe proporcionou o impacto de Clarice Starling, a agente do FBI em "Silêncio dos Inocentes" (1991), responsável pelo segundo Oscar de sua carreira.
O primeiro prêmio da academia, aliás, fora conferido a ela três anos antes, com "Acusados", em que viveu uma vítima de estupro. Na época, aos 26 anos, a atriz já tinha currículo de mais de 20 filmes –entre eles "Taxi Driver" (1976). No celebrado longa de Martin Scorsese, Foster é a adolescente Iris, uma das mais memoráveis prostitutas da história do cinema.
Se o filme de Scorsese lhe valeu a fama, foi também por causa dele que Jodie Foster passou a sofrer a perseguição de maníacos na vida real –o que ajuda a explicar sua aversão aos holofotes. Um deles a seguia na faculdade e deixava bilhetes ameaçadores na porta de casa. Em 1981, na tentativa de assassinato do então presidente Ronald Reagan, o atirador declarou ter a intenção de homenagear a atriz.
Jodie Foster não tem seguranças. Em compensação, evita até mesmo que seus filhos circulem em lugares públicos. Charles e Kit, de 13 e 10 anos, nasceram durante o período em que Foster morava com Cydney Bernard, uma ex-produtora com quem viveu por 14 anos.
Criticada pela comunidade gay por não assumir publicamente sua homossexualidade, Foster foi capa da principal publicação GLS americana, "Out", em 2007. Era uma reportagem em que a revista cobrava dos astros de Hollywood que saíssem do armário.
Meses depois, a atriz fez uma homenagem pública à parceira, ao lhe dedicar um prêmio. "À minha linda Cydney, que está sempre ao meu lado nas dificuldades e nas alegrias", disse Foster no discurso.
"Gosto de ficar sozinha, de ser responsável pelas minhas coisas. Ninguém entende, mas me sinto ótima", desconversa Jodie. "Se existe uma assinatura nos filmes que faço, é que todos tendem a falar de solidão. Todo o mundo já passou por isso de alguma forma, e está tentando descobrir como sobreviver intacto."
Ainda assim, Foster se diz uma pessoa comum, que se veste com jeans, camiseta e rabo-de-cavalo, como se apresentou para esta entrevista: "Sim, eu sou uma pessoa leve. Mas é engraçado, porque eu amo os dramas. Quando vou à Blockbuster, nem me passa pela cabeça alugar comédias românticas".

Garota Prodígio
Dois oscars e parcerias estreladas

"Taxi Driver" (1976)
Faz uma prostituta de 12 anos perdida na vida, amiga do lunático motorista interpretado por Robert De Niro

"Acusados" (1988)
Filme que deslanchou a fase adulta de sua carreira ao interpretar uma mulher que batalha por justiça após ser estuprada por uma gangue num bar

"Silêncio dos Inocentes" (1991)
Seu papel mais marcante, como a agente do FBI que
conta com a ajuda de um maluco canibal preso para encontrar outro serial killer

"Nell" (1994)
A atriz considera sua melhor atuação, como uma mulher isolada do mundo que nunca teve contato com outras pessoas

"O Plano Perfeito" (2006)
Interpreta uma misteriosa negociante com pinta de executiva durante um intrincado assalto a banco em Manhattan


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