São Paulo, domingo, 30 de novembro de 2008

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15 MINUTOS

O Endereço do desejo

por ANA RIBEIRO

O Brasil acertou Yoko Ono, 75, como uma “flechada mortal de amor”. Pelo menos é essa a opinião do empresário cultural Emilio Kalil, 57, cicerone da viúva de John Lennon em sua quarta visita ao país, no começo de novembro. Ela diz que vai voltar logo, para rever Parati –que conheceu na viagem anterior, quando trouxe sua exposição “Yoko Ono - Uma Retrospectiva” (em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil até fevereiro passado).

Nesta nova passada por São Paulo, a artista visitou galerias, bateu papo com Tomie Ohtake, assistiu ao espetáculo do grupo de percussão e dança japonês Kodo, comeu nos restaurantes Forneria San Paolo, Arábia, Carlota, Spot e na Casa da Fazenda. E doou ao MAC-USP do Ibirapuera duas obras: “Ex-it – Os Portões do Inferno” e “Morning Beams”, além de uma “Árvore do Desejo”.

Serafina encontrou Yoko Ono na hora do almoço, no restaurante do MAM, sob a marquise de Oscar Niemeyer. Ela é pequena, magrinha, cheia de energia e espantosamente jovem para a sua idade. Diz estar vibrando com a eleição de Obama, mas não votou. Sempre de chapéu (que não tira nem para comer), serve-se experimentando um pouco de tudo, só evita frituras. Dá palpites ao fotógrafo sobre ângulo, enquadramento, luz e pede para ver cada foto tirada dela. Quando acha que chegou a hora, encerra a entrevista com um “aqui está o meu telefone, qualquer coisa liga”. E passa o número de seu estúdio em Nova York.

Qual o significado dos “Portões do Inferno?”
Toda obra de arte tem sempre uma mensagem. Tudo depende de como você a interpreta. No caso de “Ex it - Os Portões do Inferno” (composta de 60 caixões de madeira com mudas de fícus plantadas dentro), é apenas um jogo de luz, mas é também uma lembrança de que da morte, dos massacres, pode brotar a vida.

E a “Árvore dos Desejos”?
A idéia deriva de uma tradição japonesa que conheci na infância. Você tinha de escrever em um papel desejos relacionados apenas ao amor, à saúde e ao dinheiro e pendurá-los em uma árvore, que cresceria e levaria seu desejo para o alto. Mas acho que o desejo é livre, nas minhas árvores cada um tem a livre escolha do desejo. Em Reykjavík, na Islândia, existe a Imagine Peace Tower, que inaugurei em 9 de outubro (aniversário de Lennon) do ano passado. Então, todos os desejos eu mando para lá. Já encaminhei 700 mil pedidos, 50 mil só de São Paulo. Para mandar direto, coloque seu desejo em um envelope e mande para Imagine Peace Tower – P.O. Box 1009, 121 Reykjavík, Iceland.

Esse é o endereço do desejo?
Sim, essa é a caixa postal do desejo. O método é 100% garantido. Por isso eu digo: tome cuidado com o que você deseja.

Qual sua opinião sobre São Paulo?
Adoro São Paulo, é uma cidade grande, e eu sou uma “city girl”. Considero São Paulo a capital do Brasil, mas já estive em Brasília também. E Paraty é uma coisa louca, às vezes me pego pensando nela. Meu filho (Sean Lennon, 33) também ama o Brasil e tem amigos aqui.

Sean é muito parecido com John. Quando olha para ele, a senhora vê o pai?
Sim, muito. Às vezes me espanto com a semelhança entre os dois, chego a levar sustos. E eles são parecidos em temperamento também. Sean é mais meigo. Tenho muito orgulho de John e do fato de ter me relacionado com ele. Meu filho é uma versão mais doce do pai.

Em “Sometime in NYC”, álbum de 1972, John Lennon e a Plastic Ono Band gravaram uma música chamada “Woman Is the Nigger of the World” (a mulher é o negro do mundo). A senhora ainda acredita nessa afirmação?
As mulheres do Terceiro Mundo ainda sofrem muito. Faço uma visita anual a Tóquio, onde moram meu irmão e sua família, e participo de um concerto beneficente em que as pessoas cantam composições do John Lennon. Com a renda arrecadada, são construídas escolas na África. Já foram construídas 75 escolas. A mudança tem de começar pela educação.

Como a senhora acompanhou a eleição de Barack Obama?
Não votei, mas ele era o meu candidato. Acompanhei a apuração sozinha e emocionada. Chorando em meu apartamento em Nova York.

No ano em que morreu, 1980, John lançou o álbum “Double Fantasy”, em que a música “Beautiful Boy” dizia “a vida é o que te acontece enquanto você está ocupado fazendo outros planos”.
Eu acredito que nessa música John previu o que ia acontecer com ele. No seu inconsciente, ele previu a sua morte.

O que é a beleza para a senhora?
A verdade.

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