Voluntários chegaram a conseguir mover o cursor na tela do computador ao pensar em algumas letras

CHARLIE BROOKER
DO "GUARDIAN"

Desde aproximadamente 1998, quando a humanidade começou a avançar rapidamente pela história do progresso, nós nos acostumamos com máquinas que, de essenciais, se tornaram obsoletas com o passar de um trimestre. VHS, Walkman, aparelho de fax, CD-ROM, pager e modem dial-up: todos enviados para a mesma ala do museu que abriga a calandra e o arado puxado a cavalo.
Agora está quase na hora de despejar outro dispositivo obsoleto no lixo histórico: seu corpo. Na semana passada, pesquisadores da Universidade Washington apresentaram um novo sistema de computador controlado pela mente.
Sistemas tradicionais de controle pela mente requerem que o usuário coloque um conjunto de sensores de EEG (eletroencefalograma) na cabeça antes de pensar com afinco sobre determinadas ações. As ondas cerebrais resultantes são então cruamente interpretadas, e o dispositivo reage de acordo com elas. Mas o uso prático é restringido graças ao crânio humano, que abafa alguns sinais e amplifica outros.
É nessa hora em que entra a eletrocorticografia --basicamente, o ato de inserir sensores diretamente na superfície do cérebro. Uma vez feito isso, é possível conseguir sinais muito mais confiáveis. Os pesquisadores já tiveram voluntários que controlavam um cursor na tela imaginando sons de vogais diferentes. Assim que conseguirem refinar esse processo ainda mais, oferecendo ao usuário a capacidade de direcionar o cursor e clicar sobre as coisas, a era do mercado de massa de iPads Wi-Fi controlados pela mente pairará sobre nós.

CONTROLE DA MENTE
Isso é realmente tão sinistro? Todos os computadores já são controlados pela mente. Minha mão talvez direcione o mouse, mas nada disso acontece sem que minha mente ordene. O que a nova interface faz é excluir o intermediador corporal, deixando os seus dedos livres. Mas qual é o problema disso?
O problema é que o corpo é a proteção crucial existente entre a caprichosa mente humana e a máquina servil. Pense sobre quantas respostas furiosas de e-mail você escreveu às pressas somente para, no momento final, parar e refletir enquanto seu dedo paira indeciso sobre a opção Enviar. O simples fato de que uma pequena ação física é necessária para, realmente, realizar tal ato costuma ser suficiente para criar um momento de reflexão.
Quando computadores controlados pela mente transformarem-se em uma realidade comum, você terá digitado e enviado aquela mensagem na velocidade em que se move um dedo. E, embora seu cérebro possa ser ótimo no controle de máquinas, qual a sua capacidade de controlar o seu cérebro?
O que aconteceria se, daqui a dez anos, você estivesse assistindo a um desenho estrelado por um coelho, um pouco provocante e sedutor, e o modo proposital com que ele balança o rabo algodoado ao saltitar, leva-o a pensar, momentaneamente, em sexo.
E, antes de você se dar conta, seu cérebro buscou uma imagem de um coelho pornô, vinda dos piores cantos da internet e está retransmitindo isso de forma horripilante e obscena na tela holográfica de 96 polegadas no momento em que sua esposa e seu filho chegam das compras?
Reconheça, se for sincero, que há todo um mundo de porcarias rotineiramente borbulhando e aparecendo em nossas cabeças, e que não queremos um computador interpretando tudo isso sem sermos questionados.
Lembre-se: não seja tolo de pensar que o lançamento de um iPhone, que liga para a sua namorada quando você lembra do rosto dela, é algo maravilhoso. Se o lado travesso da sua mente escapulir do corpo e colocar as próprias mãos diretamente no volante, a humanidade pode esperar por seis meses de caos imprevisível e pelo Juízo Final.

Tradução de FABIANO FLEURY DE SOUZA CAMPOS


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