|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TERRA DE GELO
Raptados, mortos e descritos como gigantes, bonitos, abomináveis e miseráveis, nativos foram extintos
Índios da região só sobrevivem na memória
DO ENVIADO ESPECIAL À PATAGÔNIA
O "fim da Terra", como se chamava essa margem do mundo, foi
por muito tempo invenção dos
cartógrafos. Antes da expedição
de Fernão de Magalhães, acreditava-se que uma barreira de terra,
de pólo a pólo, impedisse a passagem para as Índias.
Depois de Magalhães, alguns
mapas mostram a "Terra Australis Incógnita", um imaginário
continente abaixo do estreito de
Magalhães, considerado, na época, a única fresta entre o oceano
Atlântico e o Pacífico. Em 1578,
Francis Drake, corsário a serviço
da coroa inglesa, levado por ventos adversos, desceu a costa chilena até 56 de latitude e viu que o
tal continente não existia.
Mas foi preciso esperar quase 40
anos para que os holandeses
Schouten e Le Maire atestassem
que a Terra do Fogo é uma ilha e
que o Atlântico e o Pacífico se encontram abaixo do cabo Horn, a
cerca de 1.000 km da Antártida.
O último grande explorador das
solitudes austrais foi um padre
italiano salesiano fotógrafo e documentarista. Alberto Maria De
Agostini chegou a Punta Arenas
como missionário em 1910.
A cidade era um porto comercial obrigatório para os navios
que iam de um oceano ao outro.
Por quase 30 anos, De Agostini
batizou glaciais, escalou montanhas e sobretudo entrou em contato com os índios. Os yamanas,
selknans, alacalufs, haushs e tehuelches viviam ali havia séculos.
Em seu relato, Antonio Pigafetta, companheiro de viagem de
Magalhães, descrevera os nativos
como gigantes. Darwin se surpreendia com a "diferença entre o
homem civilizado e o selvagem".
Para ele, os índios eram "as mais
abomináveis e miseráveis criaturas". Francis Fletcher, chapelão
que viajara com Drake 250 anos
antes, havia os descrito como
"bonitos e inofensivos".
Seja como for, De Agostini conquistou a amizade de Pacheco,
chefe dos selknans e, graças a ele,
fotografou e filmou a vida e as cerimônias desse povo.
Com as doenças e os fuzis dos
colonos, os nativos refugiaram-se
na memória. A mitologia melancólica acompanha as culturas extintas, lembradas em museus, nomes de ruas e fotos impressas em
mesas de bares ou laterais de ônibus.
(VINCENZO SCARPELLINI)
Texto Anterior: Expedição foi "début" de Charles Darwin no mar Próximo Texto: Descoberta do estreito de Magalhães inclui naufrágio, motim e deserção Índice
|