São Paulo, quinta-feira, 03 de novembro de 2011

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Passado conturbado é marco arquitetônico da capital alemã

Celas da prisão de Rummelsburg, na ex-Berlim Oriental, são hoje apartamentos de um hotel

Com fim do comunismo, cidade, que já convivia com choque do nazismo, passou a ter então dois traumas para deglutir

MARIO CESAR CARVALHO

EM BERLIM

Da prisão de Rummelsburg, na extinta Berlim Oriental, só sobrou a caixa-d'água. As celas foram convertidas em apartamentos. O pátio transformou-se num jardim onde as crianças se esbaldam no verão. O que foi um hospital-prisão agora é um hotel.
O cientista político Cliewe Juritza, 45, passou dez meses preso lá em 1984, por tentar fugir do regime comunista da Alemanha Oriental. Tinha 18 anos. Ao passear pelo jardim, não esconde o desconforto ao ver a alegria da criançada: "Você acha que essas crianças deveriam saber que aqui havia um centro de tortura?".
A dúvida de Cliewe é a dúvida de Berlim: o que fazer com o passado de terror em que a cidade foi dividida por um muro? Já faz 50 anos que o muro começou a ser construído, e não há o menor sinal de que haja uma resposta para o trauma.

HAVIA UM MURO...
O muro de Berlim foi o símbolo mais retumbante da Guerra Fria, o período após a Segunda Guerra em que os EUA e a União Soviética duelaram por territórios. Dividir fisicamente a cidade foi a forma que os comunistas encontraram para estancar as fugas em massa para a parte capitalista de Berlim, ao ritmo de 3.000 pessoas por dia.
Em 1989, a imagem do muro sendo destruído anunciou o fim do comunismo.
Berlim, que já convivia com o choque do nazismo, passou a ter dois traumas para deglutir. A primeira resposta foi tentar apagar o passado indesejado.
Pós-muro, a cidade experimentou uma onda de demolições e construções numa escala que só tinha uma rival no mundo: Pequim. A intenção era transformar a Berlim pós-comunista na nova capital da Europa.
Mais de 20 bunkers feitos pelos soviéticos na época da Guerra Fria foram destruídos, segundo a artista Lina Kim, autora de "Rooms", livro sobre essas construções: "Aproveitei os últimos dias da existência desses bunkers. Fiquei chocada com o descaso com que trataram a história".
A maioria ficava na zona rural. Muitos pareciam casas de campo, mas havia bunkers subterrâneos e até construções com paredes de concreto de um metro e meio de espessura, à prova de bombas.
Era o refúgio militar para espionagem e abrigo para uma guerra nuclear. Na ânsia de varrer o passado, os alemães refugaram uma das marcas mais profundas do país: o apego à história.


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