São Paulo, quinta-feira, 08 de junho de 2006

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CORES DA CIDADE

Obras produzidas no fim da vida de Goya são destaque dessa coleção reunida pelo milionário do aço

Frick retrata um homem, sua fortuna e sua época

DO ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

Henry Clay Frick cresceu em West Orveton, no Estado da Pensilvânia, na segunda metade do século 19. Diferentemente de Pierpont Morgan, cuja família acumulava dois séculos de riqueza, ele tinha poucas possibilidades de encontrar obras de arte de alguma qualidade. Contudo, após ganhar os primeiros milhões de dólares com a indústria do aço, ainda aos 30 anos e depois de uma ida à Europa, a paixão pelo colecionismo se manifestou.
E, para ele, a palavra arte significava principalmente pintura. Em 1895, comprou 30 quadros. E, nos cinco anos seguintes, mais de 90. Em 1907, Isabella Stewart Gardner, desejando obras que não poderia mais comprar, escreveu a Bernard Berenson, seu consultor: "Pobre de mim! Por que não sou Morgan ou Frick?".
Nos últimos anos de sua vida, Frick mandou construir uma mansão, em estilo proto-renascentista, já com a intenção de abrir sua coleção ao público. Quando as portas foram abertas, em 1935 (com Frick já falecido), Lewis Mumford escreveu para a revista "New Yorker": "Os quadros estão perdidos no cenário. Isso pode satisfazer o gosto dos principais renascentistas ou até dos milionários americanos da primeira metade do século, mas não alcança mais o moderno padrão de apresentação". Essa crítica, embora lúcida, parece hoje um tanto drástica, pois o que podia ser um pecado naqueles anos tornou-se, com o passar do tempo, uma virtude: a Frick Collection, tanto a mansão como as obras são o retrato de um homem e de sua época.
É possível admirar Bellini, Ticiano, Vermeer, Fragonard, Ingres, Constable, Turner... Escolhas meio obrigatórias, talvez, para um milionário norte-americano. Sem grandes surpresas. Mas a surpresa é uma obsessão de nossos dias e Mister Frick, não diferente de Mister Morgan, buscava solidez.

Goya
Na Frick Collection há um admirável retrato de dama, que antecipa muitos retratos de Manet, pintado por Goya já velho. A partir dessa peça, foi organizada, entre fevereiro e maio deste ano, uma mostra sobre o último período do pintor.
Com 78 anos, depois de ter superado duas graves doenças, Goya mudou-se da Espanha para a França, onde morreu quatro anos mais tarde. Um dos últimos desenhos mostra um velho num balanço, voando bem alto. Outro, um velho com barba longa, muletas e uma escrita: "Ainda aprendo".
Obra após obra, fica claro que o artista quis, e conseguiu, colocar suas doenças e sua velhice a serviço da arte, sem autopiedade, porém com assombrosa energia e obscura ironia. Pintou-se como um Cristo morto nos braços de seu médico. Retratou-se após curado com cabelos longos e olhar severo. O desenho foi comparado ao retrato de Beethoven. Recentemente foi sugerido que ele se representou como um leão. (VINCENZO SCARPELLINI)


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