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FERNANDO GABEIRA
Três refeições por dia e oito horas de sono
Numa dessas noites de verão, acordei sobressaltado.
O coração disparou, e os pulmões
puxaram o ar com uma ânsia de
afogado. Sonhei que não conseguia respirar e custei a emergir na
escuridão do quarto.
O que seria isso, pensei? Fui à
internet pesquisar sobre problemas do sono e me defrontei com
um novo mundo. Pensei que estava sofrendo de apnéia do sono,
uma doença que ataca cerca de
10% dos homens de minha faixa
de idade. O quadro da doença é
meio assustador. Ela mata com o
tempo porque as pessoas perdem
o ar e o recuperam inúmeras vezes durante uma noite.
A doença força o coração, além
de ser responsável por inúmeros
quadros de pressão alta e derrame. Sem contar o fato de que seus
portadores são forçados a cochilar inúmeras vezes durante o dia.
Nos Estados Unidos, a doença é a
segunda responsável pelos acidentes de trânsito, com os motoristas cochilando ao volante.
O segundo passo era descobrir o
que havia no Brasil para diagnosticar e tratar doenças do sono.
Comecei pessimista, mas acabei
encontrando o serviço da Unifesp
(Universidade Federal de São
Paulo), do hospital Albert Einstein e do Sleep - Laboratório dos
Distúrbios do Sono, aqui no Barra Shopping, no Rio. Todos bem
equipados e atualizados sobre as
últimas descobertas científicas no
ramo.
Já existe hoje a possibilidade de
mapear o sono com uma noite no
laboratório e também existe uma
pequena máquina que, aplicada
ao nariz, possibilita à pessoa ter
um sono profundo e reparador.
O único problema é que os planos de saúde e o próprio governo
não a financiam, preferindo pagar cirurgias, que, na maioria esmagadora dos casos, não resolvem o problema.
Essa rápida passagem pelos laboratórios do sono, onde constatei que não sofria de nada, exceto
de ansiedade pelo momento histórico e pessoal, aproximou-me
das pessoas que realmente sofrem
de apnéia do sono ou mesmo de
insônia pura e simples. Só quem
dorme mal algumas noites pode
imaginar o que isso significa em
termos de perda de concentração,
irritabilidade e tristeza.
Duas vertentes me interessam
agora. Uma é fortalecer a medicina do sono no Brasil, que já tem
nível internacional, a outra é estimular uma discussão preventiva
sobre a higiene do sono.
Vivemos numa sociedade que
rouba sono. Perdido entre inúmeros textos diferentes, sites e documentários na televisão, eu costumava tomar oito cafés por dia.
Também dormia assistindo a um
último noticiário na TV, cheio de
noticias bárbaras que, por sinal,
já havia visto durante o decorrer
da tarde. Tudo isso contribui para que o sono seja intranquilo ou
se perca durante horas preciosas.
Por enquanto vou fazer lobby
com meu querido ministro da
Saúde, Humberto Costa, que é
um excelente psiquiatra, para
que avalie a possibilidade de financiamento das pequenas máquinas que podem resolver a vida
de milhares de pessoas. E para
que o tema "higiene do sono" entre no quadro das campanhas
educativas do ministério.
Quem sabe na era pós-Lula, na
qual todos teremos três refeições
por dia, será possível também garantir oito horas de sono profundo? E a falta de sono, sob alguns
aspectos, é pior que a falta de comida. O sono nos vence e nos surpreende em momentos delicados.
Minha proposta é tratar apenas
os casos mais frequentes e que
realmente contam na vida produtiva. Vejo na revista do "New
York Times" como o avanço na
pesquisa revela inúmeros outros
distúrbios que ignorávamos no
passado e começam a ser revelados pela medicina do sono.
Espero que os amigos que se tornaram autoridades na área da
saúde compreendam a importância de avançarmos o máximo no
Brasil. Muito do que investirmos
será economizado através da redução do número de infartos,
derrames e desastres automobilísticos, além da recuperação da
produtividade individual.
Lembro-me de quando defendíamos o coquetel gratuito para
os soropositivos. Havia uma resistência da equipe econômica, e o
coquetel acabou economizando
dinheiro, com o esvaziamento dos
leitos e a redução na compra dos
caros remédios contra infecções
oportunistas.
Como em todo princípio de governo, nunca se dorme bem por
causa do excesso de trabalho. A
hora é essa de iniciarmos nossa
pequena campanha.
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