São Paulo, segunda-feira, 12 de janeiro de 2004

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Refeição à madrilena acaba quando termina

DA ENVIADA ESPECIAL

Repleta de travessas e cercada de pessoas que parecem que jamais vão arredar suas garupas da cadeira. Bem-vindo à mesa espanhola, na qual nunca falta comida tampouco papo. A dimensão do tempo numa refeição espanhola é elástica. Gasta-se quanto tempo for necessário para comer.
Uma das maneiras de constatar essa agradável relação entre o espanhol e sua refeição é experimentar um cozido madrileno.
Prepare-se para enfrentar sérias dificuldades ao contabilizar as tigelas servidas, pois isso vai longe.
Antes de mais nada, é servida uma sopa de grão-de-bico e macarrão fininho, tipo fidelinho, preparada com o caldo no qual foram cozidos os itens do prato principal. A sopa é vigorosa. Mas não exagere, uma vez que ela é só o aquecimento de uma verdadeira maratona gastronômica.
Depois que todos se fartaram da sopa, começam as rodadas de travessas. Primeiro, os vegetais: grão-de-bico, repolho, cenoura e batata. Esqueça esse papo de cenoura em rodelas ou cubos. Ela pode vir inteira, com a cabeleira de folhas inclusive, e vai assim, incólume, para o prato. Em seguida vêm o frango, a carne, o porco, a costela, o presunto, o mocotó, o toucinho e a linguiça. Um pedaço de cada um para cada conviva.
Agora, façamos as contas: no seu prato há uma colher de grão-de-bico, uma cenoura, uma batata inteira, uma colher de repolho, uma coxa de frango, um pedaço de carne, uma costela, uma cabeça de presunto, um pedaço de osso com mocotó, um quadrado de toucinho e uma linguiça. Dimensione o prato. Errou. Ele fica maior do que é possível imaginar.
O osso recheado com mocotó talvez seja o item que mais cause dúvidas. Afinal, poucas pessoas se mostram dispostas a sugar a gelatina intra-óssea de qualquer bicho. Mas aí os madrilenos explicam como efetuar a operação: "Pegue a gelatina com uma faca e passe-a no pão". Simples assim. O resultado se assemelha a um pão com manteiga. No caso, uma manteiga quentinha, com um gosto um pouco mais forte.
Outro item que centraliza os olhares é a cabeça de presunto. Trata-se da parte mais larga da peça, oposta ao osso, cozida. O resultado é que as faixas de gordura se separam da carne, que fica fibrosa e altamente saborosa.
Refestelados e estatelados em suas cadeiras, os comensais, nesse momento, acreditam ter acabado de quebrar o recorde de quantidade de alimento consumida de uma só vez. No entanto, em cada prato, por mais guloso que seja o seu dono, há sobras.
O cozido, por ser de preparo demorado e cuidadoso, é servido em apenas alguns dias da semana. O restaurante Charolés (r. Floridablanca, 84, tel.: 00/xx/34/91/ 890-5975), em San Lorenzo de el Escorial, a 50 minutos de Madri, serve o prato às quartas e sextas. É obrigatório fazer reservas. (HL)


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