São Paulo, quinta-feira, 12 de janeiro de 2006

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TERRA DE PINGÜIM

Jornada do irlandês ao pólo Sul acabou com navio preso no gelo; para sobreviver, tripulação ficou mais de 16 meses à deriva, em banquisas

Shackleton virou herói com fracasso dramático

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA NA ANTÁRTIDA

Embora o conquistador do pólo Sul tenha sido o norueguês Roald Amundsen, em 14 de dezembro de 1911, é ao irlandês Ernest Shackleton que são rendidas todas as homenagens quando se fala em expedicionários antárticos.
Filho de uma família de classe média irlandesa, casou-se com Emily Dorman, filha de um rico advogado. Isso fez que ele lutasse para ser reconhecido socialmente -e não fosse considerado simplesmente um marido à sombra da mulher.
Shackleton era fascinado pelo pólo Sul. Já tinha viajado para lá com o capitão Robert Falcon Scott, em 1902 (Scott e Amundsen foram protagonistas da famosa corrida ao pólo Sul. Scott chegou ao ponto em disputa 33 dias após o norueguês e morreu a caminho do retorno ao seu acampamento-base, de fome e cansaço).
Entre 1907 e 1909, Shackleton dirigiu sua própria expedição, no navio Nimrod, tendo de dar meia-volta a apenas 155 km do pólo. Pelo feito, recebeu o título de cavaleiro do império britânico, tornando-se sir.
Após a conquista de Amundsen, entretanto, chegar ao pólo Sul não era mais uma aventura interessante, mas cruzar o continente antártico sim, já que ninguém havia feito até então.
Assim, organizou a Trans Antartic Expedition, que, a bordo do Endurance, atravessaria a Antártida de um extremo ao outro, entrando pelo mar de Weddell e saindo pelo de Ross, onde seriam resgatados pelo navio Aurora.
Shackleton e seus 27 homens iniciaram a aventura em 1º de agosto de 1914, saindo do porto de Londres. Um dia depois começaria a Primeira Guerra, que durou até 1918. Sua viagem foi tranqüila até janeiro de 1915, quando seu navio foi aprisionado pelo gelo no mar de Weddell.

Encalhado
Seus homens tentaram inúmeras vezes liberar a embarcação, mas foi em vão. Tiveram que salvar o que era mais importante antes de o Endurance fosse esmagado e afundasse.
Viveram em barracas, à deriva, em banquisas de gelo, comendo focas, pingüins e leões-marinhos e usando sua gordura para cozinhar e obter iluminação.
Depois de mais de um ano nessas condições e vendo que a situação de seus homens chegava a um ponto muito perigoso, Shackleton embarcou seu grupo em dois botes salva-vidas e rumou em direção à ilha Elefante, numa viagem de 16 dias.
Depois de 16 meses sem pisar em terra firme, conseguiram desembarcar na ilha, mas descobriram que, assim que chegasse a maré alta, seu acampamento ficaria submerso. Procuraram, então, outro lugar, mais seguro. Mas Shackleton sabia que ninguém iria salvá-los naquela ilha e, quatro dias depois, decidiu sair em busca de ajuda.
Embarcou com cinco de seus homens no bote James Caid, de sete metros, com destino à Geórgia do Sul, a 1.500 km dali. Tiveram de enfrentar tormentas, nevascas e ondas com mais de quatro metros para atracar na baía de Haakon, na Geórgia do Sul, 17 dias depois. Mas entraram pelo lado sudoeste da ilha, onde não existia vida humana.
Assim, o irlandês escolheu dois de seus homens e, juntos, cruzaram montanhas e campos nevados, caminhando 27 km em 36 horas -sem dormir. Chegaram a Stromness, e o gerente de uma usina baleeira os acolheu. O irlandês pediu então um navio para resgatar seus homens, o que conseguiu dois dias depois.

Resgate
Incansável, Shackleton tentou salvar seus 22 homens na ilha Elefante três vezes. Acabou conseguindo na quarta tentativa, a bordo do navio Yelcho, da Marinha chilena. A tripulação ficou 137 dias esperando por essa ajuda.
Seu maior orgulho foi, sempre, o fato de não ter perdido nenhum homem nessa odisséia, que terminou em 30 de agosto de 1916.
Shackleton morreu durante outra expedição ao pólo, em Grytviken, na Geórgia do Sul, em 5 de janeiro de 1922, aos 47 anos. Está sepultado nesse povoado, e seu túmulo é o único que está voltado para o sul. (JAIME BÓRQUEZ)


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