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IDAS E VINDAS
"Quero fugir da mesmice afro-brasileira"
Curador e artista plástico baiano foi ao Benin para compor mostra que revive o país em museu de SP
SILVIO CIOFFI
EDITOR DE TURISMO
Emanoel Araujo revolve o
ambiente cultural paulistano
organizando, no museu Afro
Brasil, que dirige, exposição
que traz luz sobre o Benin.
Aberta no dia 16 com a presença do atual presidente beninense, Thomas Yayi Boni (leia
texto nesta página), e pelo governador de São Paulo, José
Serra, de quem Emanoel Araujo foi o secretário municipal da
Cultura, a mostra também evidencia laços ancestrais entre o
Brasil e o Benin, reunindo imagens atuais e obras de artistas
contemporâneos beninenses.
Leia a seguir trechos de entrevista concedida por Emanoel Araujo à Folha:
BENIN
"Uma curiosidade sobre o
Benin e a sua história me acompanha há muito tempo, desde
que me interessei pela relação
da Bahia com a África. Sempre
tive vontade de ir lá. Minhas referências eram, além de Pierre
Verger, o Waldeloir Rêgo e a literatura em torno desse assunto, que envolve etnologia e antropologia. Na realidade, fui ao
Benin muito interessado na
contemporaneidade da África,
para sair um pouco da mesmice
do folclore afro-brasileiro."
PONTE
"O candomblé e o vodum são
parecidos. A religião é igual: lá
como cá temos Ogum e Xangô,
mas a Bahia, de certa maneira,
reinventou a África. Só que lá
essas divindades são cultuadas
em áreas diferentes, não são
agrupadas como no Brasil. Pessoas de etnias diferentes vieram para cá."
CONTEMPORANEIDADE
"E queria explorar a contemporaneidade africana, expor
obras de artistas como Romuald Hazoumé, beninense
agora presente nos grandes
museus do mundo. E há artistas fortes de hoje com trabalhos que podem ser vistos no
museu Afro Brasil (www.mu
seuafrobrasil.com.br), como
Aston e Cyprien Tokoudagba.
Aston fez brinquedos expostos na mostra "Benin Está Vivo
Ainda Lá", e também uma instalação de um navio negreiro.
Essa exposição que está no
museu Afro Brasil é uma prévia: haverá reforço de obras a
partir de outubro, pois o que eu
queria de fato é que tivéssemos
um entendimento mais profundo e político -e menos folclórico- do que é o Benin hoje.
Quero ainda trazer a moda,
mostrar que eles tem uma liberdade enorme, que vão à
praia de traje de seda. E os bordados! Vamos trazer também
um costureiro e um bordador.
E um escultor também."
AGUDÁS
"O presidente Yayi Boni
mencionou a questão dos agudás. Cerca de 5 ou 10% da população beninense descende de
escravos ou comerciantes baianos -os agudás- que emigraram de volta para o golfo do Benin, depois da Abolição da Escravatura, formando uma sociedade que está lá até hoje. Há
nomes como Souza, Costa, Rego, todos pronunciados de modo afrancesado. E comidas, como "feijoadá" e "kousido". Ainda
guardam traços culturais que
os ligam a seus ancestrais que
vieram do Brasil, festejam o
bumba-meu-pai, o Senhor do
Bonfim, as mulheres se vestem
à brasileira. A avenida do Brasil,
ainda leva do forte português
até a praia, em Porto Novo."
DAR AS MÃOS
"Não acho que devamos fazer
apadrinhamentos, paternalismo, mas podemos reconhecer
esses laços -e me encanta a
possibilidade de o Brasil, com o
agronegócio, através da embaixada brasileira que há agora lá,
dar uma mão ao Benin, país que
é pobre e que nos diz respeito.
Ajudar na lavoura de algodão,
com o álcool combustível e
energia -há lá muito apagão, a
energia vem de Gana.
Angola é um país potencialmente rico e o Brasil está lá.
A China, por outro lado, está
ligada ao Benin, onde tem interesses econômicos, explora minérios e faz construção civil."
TURISMO
"Nosso turista é "meio europeu". Gosta de ir a Paris e a Portugal, que aliás é uma maravilha, também ligado a nós por laços de sangue, históricos e afetivos. Mas há americanos fazendo turismo no Benin, visitando praias, as florestas no
norte do país, interessados em
religião -e não se vê por lá viajantes brasileiros. A relação do
Benin, por motivos étnicos,
culturais e religiosos, é com Cuba e com o Brasil. Não dá para
dizer que as cidades são belas
pelo nosso padrão, na África as
coisas não têm a mesma perenidade. Existem monumentos,
mas a história das colonizações
bate fundo, como também foram complicadas as influências
na época do comunismo.
O turismo lá não é um turismo cartesiano, à francesa. Eles
são, à maneira deles, livres, alegres, um povo tranqüilo, ingênuo, falando uma língua próxima do iorubá. E estamos no coração daquelas pessoas."
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