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BRASIL CENTRAL
Cidade é cortada por rios chamados Prosa e Segredo; no Mercado Municipal, visitante desvenda hábitos
Horizonte hipnotiza em Campo Grande
HELOISA LUPINACCI
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Perder o olhar no horizonte. Essa talvez seja a mais surpreendente atividade turística a se fazer em
Campo Grande, capital de Mato
Grosso do Sul. Especialmente se o
visitante vem de grandes cidades,
como São Paulo, nas quais encontrar a tal linha que separa o chão
do céu é um desafio.
O céu em Campo Grande é quase agressivo. Transitar pelas estradas nas redondezas da cidade aumenta ainda mais essa sensação.
O olhar se perde, e a vontade de
parar e tirar uma foto do vasto horizonte se instaura.
A população se diverte. Acha
exagero, faz troça com o visitante.
Já está acostumada com o céu de
180 quase sempre azul.
E a poesia intrínseca à cidade
não pára por aí. Qual não é a surpresa que se tem ao descobrir que
os rios que a cortam levam os nomes de Prosa e Segredo. E mais:
pode-se visitar as nascentes do Segredo e do Prosa. E imaginar um
rio que nasce com fios de histórias, como o mar descrito pelo indiano Salman Rushdie em seu livro "Haroum e o Mar de Histórias", que pode ser um bom companheiro na viagem.
Embora não seja exatamente
um pólo turístico, Campo Grande
tem potencial para entreter um
visitante, e muito bem entretido,
por alguns dias. Quem vai, por
exemplo, ao Pantanal, não perderá tempo se dedicar um par de
dias para conhecer a cidade.
E isso vale também para quem
não se emociona com horizontes,
poesias ou nomes de rios.
Atrações
A imigração árabe deixou como
legado um punhado de bons restaurantes e armazéns, a vila dos
ferroviários está intacta ao redor
da estação e uma feira abastece os
notívagos com sobá e yakissoba
(massas de origem asiática) madrugada adentro. Enfim, há muito o que ser visto na cidade.
Um bom começo é ir ao Mercado Municipal -um prédio de
1933 na travessa José Bacha, sem
número. Ali vendem-se de ervas a
chapéus, selas e cortes de carne.
As barracas são o avesso das de
São Paulo. Em vez de ter um balcão atrás do qual fica o vendedor,
essas são como escadas, em cujos
degraus os produtos ficam expostos, e o vendedor fica do lado de
fora, em um banco.
O passeio vale como uma introdução à cultura sul-matogrossense. Dezenas de barracas vendem o
kit para fazer tereré: cuia, guampa
(espécie de canudo) e erva-mate.
O tereré é um tipo de chimarrão
gelado consumido em larga escala
em Mato Grosso do Sul. O hábito
dá a cara da cidade: no fim da tarde, rodas de amigos tomam as
ruas com cuias e garrafas térmicas
com água gelada a postos. Conversam e dividem goles da bebida.
Ainda na feira, é possível comprar adereços para entrar no clima do Estado, maior criador de
gado de corte do Brasil, com um
rebanho de 22 milhões de cabeças. Chapéus de palha, feltro e
couro estão à venda.
O preço varia de R$ 10 a R$ 60. O
acessório é um grande aliado daquele que estiver na cidade e se
deparar com o calor típico. O sol é
de rachar o coco.
Na saída do mercado, há uma
praça com dois quiosques circulares. Ali as bugras, índias das tribos
cadiuéu e terena, vendem seus
produtos, como peças de cerâmica, redes, vegetais e remédios que
curam dores na coluna, gripe e artrite, tudo ao mesmo tempo.
Depois dessa visita, com a cabeça protegida por um chapéu e seu
kit tereré na bolsa, respire fundo e
entre no ritmo da cidade, que,
embora seja capital de Estado,
ainda permite que seus moradores fiquem a procurar o horizonte
com os olhos.
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