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Inquisição tolerou efeminados, diz pesquisador
da Reportagem Local
Efeminados como o Zé Mulher
de ``Xica da Silva'' podem até parecer estereótipos, mas eles existiram e ``tiveram espaço'' em
Minas Gerais, no século 18.
A conclusão é do antropólogo
Luiz Mott, presidente do Grupo
Gay da Bahia, professor da Universidade Federal da Bahia e autor, entre outros, do livro ``O Sexo Proibido - Gays, Virgens e Escravos nas Garras da Inquisição''
(editora Papirus).
Segundo o pesquisador, ``havia espaço para negros ou brancos desenvolverem comportamento até ostensivamente efeminado, como esse Zé Mulher''.
Primeiro, porque a população
de Minas Gerais, na época, era
predominantemente masculina.
``O desequilíbrio sexual permitia aflorar uma sexualidade muito diversificada, atípica, bestialista'', diz, baseado em pesquisa
junto aos arquivos da inquisição.
Mott afirma que ``havia uma
certa tolerância'', pelos inquisidores, com os hermafroditos ou
``mafroditos'', como eram chamados os efeminados.
Mott cita o caso de um sacristão de Sabará que ``foi acusado
de ser extremamente devasso''.
``O padre da freguesia do sacristão escreveu uma carta a Lisboa dizendo que se tratava de um
beato muito piedoso, dono do
mais rico presépio da cidade, e
que tinha o costume, de vez em
quando, de, segundo expressões
do vigário, fazer algumas pulsões
nos órgãos genitais dos rapazes.
E o padre considerou que não era
matéria tão grave que merecesse
um processo. Não aconteceu nada, de fato'', conta.
Ao todo, Mott encontrou nos
arquivos do Santo Ofício mais de
30 processos de moradores de
Minas Gerais (mais de cem no
Brasil) acusados de sodomia,
mas ``só dois ou três (pelo menos dez no país) chegaram a ser
presos, um deles era padre''.
A inquisição foi mais cruel com
judeus. Segundo Mott, cerca de
500 judeus no Brasil foram denunciados, dos quais 200 acabaram presos e 20, queimados.
Os acusados eram julgados em
Portugal, diferentemente de
``Xica da Silva'', em que o julgamento de Zé Mulher será feito
pelo contratador, no Brasil.
Segundo Mott, comissários do
Santo Ofício faziam espionagem
no Brasil e mandavam informações a Portugal.
O processo era lento. Em Portugal, a mesa inquisitorial do tribunal examinava a documentação e, se julgasse que havia indícios de sodomia, determinava ao
comissário (no Brasil) que fizesse um inquérito e interrogasse
várias pessoas secretamente.
Caso se confirmassem as denúncias, o processo voltava a
Lisboa. Lá, os inquisidores analisavam, novamente, se havia indícios. Só então determinavam a
prisão, o sequestro dos bens e a
deportação para Lisboa, onde
havia um julgamento final. A pena variava do açoite à morte.
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