São Paulo, domingo, 14 de dezembro de 1997.



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TV A LENHA
Circo de cavalinho

MARCELO MANSFIELD
especial para a Folha

Antes da TV, quem queria se divertir tinha de se deslocar um bocado. Em um fim de semana, por exemplo, uma simples tarde de domingo era dedicada ao circo.
No picadeiro, palhaços faziam suas micagens e cachorros vestidos para festa subiam em tamboretes. Havia também números de mágica e as aberrações de sempre: mulher barbada, gêmeos xipófagos, Monga, a mulher que virava gorila, e, entre uma bobagem e outra, meia dúzia de bailarinas gordinhas com pouca roupa.
À noite, quando as crianças iam dormir, os pais se dirigiam ao teatro, para assistir Dulcina de Moraes em "Chuva", Cacilda Becker em "Pega Fogo" e Maria Della Costa em "Depois da Queda".
Com a TV, tudo mudou. Não se ia mais ao circo nas tardes de domingo, porque o circo vinha até em casa. O "Circo do Arrelia" dominava a tarde, pois, de manhã, Fuzarca e Torresmo já tinham esquentado a criançada.
Vicente Leporace comandava, com os alunos de sapateado do professor Ascot, seu programa infantil, onde, entre outros, apresentava-se o hoje diretor de TV e então garoto Roberto Talma. À noite, o teatro legítimo chegava com o elenco da Tupi e seu "TV de Comédia" ou "TV de Vanguarda".
Cacilda Lanuza estrelava "Cala a Boca, Etelvina", enquanto Elias Gleizer e Lisa Negri aterrorizavam em "Cuidado, o Terceiro Degrau da Escada Está Quebrado".
O circo de cavalinho, com suas Mongas e mulheres barbadas, ficou para trás. Pelo menos, parecia ter ficado.
Hoje, quando assistimos a TV num domingo qualquer, vemos que elas estão de volta, as curiosidades absurdas, os sapos que latem, os cachorros que botam ovo, os jumentos que dançam na garrafa. As tortas na cara dos palhaços agora vêm embrulhadas em sensuais banheiras, onde o pastelão é constrangedor. Só ficaria pior se fossem duas pessoas do mesmo sexo tentando catar sabonete num vestiário de clube.
O teatro das Cacildas, Nidias, Sergios e Walmores deu lugar à comédia rasa, anteriormente reservada aos pulgueiros do teatro rebolado, onde um homem de família não levaria sua esposa.
Mas o que se pode fazer? Eu sei: controle remoto neles!! Mude de canal, vá procurar um bom filme. É só sentar e relaxar.
Domingo passado, por exemplo, foi um bom dia para ficar em frente à TV. Chuvinha, pipoca no colo e Mazzaroppi e Odete Lara em "O Gato da Madame", na Bravo Brasil.
Levem minha casa, mas me deixem o controle remoto.



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