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ARTIGO
Para fazer um programa ético e popular
Para finalizar a
série de artigos sobre qualidade e ética na TV, escritos
por dirigentes das
principais redes de
televisão do país, o autor do texto
de hoje é o diretor do "Domingão
do Faustão", da Rede Globo.
ALBERTO LUCHETTI
especial para a Folha
Como fazer um bom programa
popular nas tardes de domingo?
Convém, antes de tudo, eliminar
a idéia de que o simples é fácil. Pelo contrário: é muito difícil. Não
se deve também se deixar seduzir
por idéias pré-concebidas, imposições da preferência de minorias
e transposições de modelos externos. Um bom programa se faz para a família no instante de lazer.
Sobretudo em casa, num dia de
recesso e descanso, ela deve ser
respeitada, elevada, preservada
em seus valores éticos e morais e
estimulada em sua cidadania.
No dia-a-dia, a família na poltrona da sala ou em outros cômodos da casa, com um ou mais aparelhos de TV ligados, não pode jamais ser menosprezada e submetida ao bizarro, ao pornográfico, à
exploração da tragédia e da miséria humanas.
O domingo é atípico e, ao contrário dos demais dias da semana,
exige de quem pensa e produz um
bom programa popular de TV a
mais aguda preocupação com o
coletivo. Em nenhum outro dia
ou situação, a sociedade está tão
bem representada e completa.
Tais conclusões não são resultado do achismo ou de compêndios
de faculdade de comunicação.
São fruto de um aprendizado em
curso. De um exercício dominical
na tentativa de compreender o
coletivo e descobrir sua face mais
lúdica, identificar o senso e o gosto de uma sociedade inquieta,
com o controle remoto apontado
para o nosso trabalho.
Há um ano e meio empenhado
em manter o programa dentro
dos padrões de qualidade da Rede
Globo e preocupado em não permitir que o "Domingão do Faustão" fosse vítima da frequente
confusão entre o popular e popularesco, resolvi reunir a produção
do programa e criar um decálogo
-uma espécie de código de ética
interno. Estabelecemos ali algumas regras, a partir de então observadas com rigor no nosso cotidiano, e aperfeiçoamos o conceito
do programa, diferenciando-o de
outros que procuram caminhar
no mesmo gênero.
O passo seguinte foi consultar
dados do Departamento de Pesquisa da Rede Globo sobre o "Domingão do Faustão". Estávamos,
enfim, indo ao rumo certo? As
conclusões nos estimulam ainda
mais.
Há dois pontos fundamentais a
serem destacados do resultado.
Primeiro, a pesquisa diz que um
bom programa de domingo precisa ser alegre, e o humor é a principal característica do apresentador Fausto Silva, cercado de quadros divertidos e humoristas por
todos os lados. Os números demonstram que a maioria do universo consultado assiste ao programa pelo que ele oferece de lúdico e de entretenimento.
O segundo ponto é que o programa é hoje adequado a toda a
família, e a pesquisa diz isso, reforçando nossa luta pela preservação dos conceitos de respeito e
de responsabilidade, traduzida no
critério de escolha das atrações e
na fidelidade ao decálogo.
A pesquisa indica também nosso acerto ao investir em atrações
pouco previsíveis. Assim, relançamos Reginaldo Rossi, identificamos um fenômeno musical fora da mídia chamado Frank
Aguiar e adotamos um rapaz que
surgiu da platéia num domingo,
ao acaso, e se transformou em
símbolo de simpatia e perseverança. O cantor Júnior representa
hoje o que 88% dos entrevistados
na pesquisa querem: novos talentos e o triunfo do anônimo, a vez
do cidadão que supera obstáculos
monstruosos para alcançar a consagração. E, inspirados em Júnior,
lançamos o Concurso Nacional
de Novos Talentos, para revelar
cantores e cantoras, cujo vencedor gravará um CD e será contratado pela Rede Globo.
A pesquisa concluiu que é possível manter a liderança e a audiência com qualidade. O "Domingão do Faustão" é o programa de domingo mais lembrado
por 72% dos entrevistados. O público fiel ao programa, chamado
de telespectador regular, era de
48% em abril de 1998 e cresceu
para 67% em agosto de 1999.
No último ano, o "Domingão"
venceu no Ibope em mais de dois
terços de suas edições. E Fausto
Silva é apontado como o apresentador preferido, com votação
duas vezes maior do que a do segundo colocado.
A pesquisa confirma nosso conceito e o decálogo, além de desmentir a tese de que TV popular é
necessariamente de baixa qualidade. Ela mostra também que estamos no caminho certo ao convidar o coletivo a opinar e a ajudar
a fazer o programa, transformando-o em telespectador ativo e dele
extraindo nossas atrações, como é
o caso de Júnior.
A nossa opção literal é pelo receptor fazendo TV mais do que
vendo TV. Queremos um programa em permanente mudança, afinado com seu tempo e seu telespectador, em vez de um modelo
acabado e concebido em gabinete.
Alberto Luchetti é diretor da Rede Globo de
Televisão
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