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VALE A PENA VER DE NOVO
Humberto Martins, Marcelo Novaes e Oscar Magrini são
alguns dos atores que fazem sempre os mesmos personagens
Atores são "condenados" aos mesmos papéis na TV
DA REPORTAGEM LOCAL
UMA espécie de "maldição" ronda
alguns atores da televisão brasileira.
É só começar uma nova novela que eles
retornam à TV fazendo o mesmo papel
de sempre. Seja por causa de seu biótipo
ou por vontade dos autores das tramas,
que cismam em escalá-los para interpretar personagens semelhantes aos que fizeram no passado, o fato é que esses atores acabam dando ao telespectador uma
estranha sensação de "déjà vu".
É o caso de Oscar Magrini, que agora
"clona" seu Ralf, de "O Rei do Gado", em
"Marcas da Paixão", nova novela da Record, na qual vive (de novo) um cafajeste. Na mesma produção, Jussara Freire volta a fazer
uma mulher rústica e interiorana, lembrando sua famosa Filó de "Pantanal", e Tânia Alves acrescenta mais
uma nordestina a sua carreira.
Mas os maiores exemplos desse "vale a pena ver de
novo" são Humberto Martins e Marcelo Novaes. Os
dois estão em "Uga Uga", de Carlos Lombardi, nova novela das sete da Globo, nos papéis de Baldochi e Beterraba, respectivamente.
Logo nos primeiros capítulos, já dava para perceber o
"parentesco" de Baldochi com o Bruno de "Quatro por
Quatro", outra produção de Lombardi protagonizada
por Martins. Ambos são sensuais, têm bom caráter e
trazem como grande trunfo os músculos, que enlouquecem as mulheres da trama.
O porte atlético e o jeitão mulherengo, sempre com a
camisa aberta, consagraram Novaes e seu Raí, também
de "Quatro por Quatro" (levada ao ar pela Globo em
94). As mesmas características marcam Beterraba -a
semelhança quase impediu que o ator fosse chamado
para o elenco: com receio de que alguns telespectadores
achassem os dois muito parecidos, Lombardi pensou
inicialmente em Murilo Benício ou Marcos Palmeira
para o papel. Porém os dois estavam com a agenda lotada, e Novaes acabou sendo o escolhido.
"É uma visão simplista e superficial dizer que meus
personagens se repetem. Mas esse tipo de comentário
sempre existiu. O estranho é que, quando inovo demais,
as pessoas também reclamam -o que é bastante normal, já que novela é de graça e tem grande audiência",
afirma Lombardi. Segundo o autor, há diversos fatores
que levam parte do público a apontar coincidências entre, por exemplo, Bruno e Baldochi: "O Humberto tem
uma voz e um visual marcantes. É da natureza dele. Mas
ele também sofre por não ser rotulado de "grande ator".
Quando um suposto "grande ator" faz um papel igual,
ninguém fala mal. Só que, no caso do Humberto, todo
mundo cai em cima".
Para Humberto Martins, é um "equívoco dizer que os
dois personagens se parecem": "As situações são semelhantes porque o estilo do autor se equivale. Todo autor de novela tem um estilo, e o do Lombardi é mais arrojado".
Atriz experiente, Jussara Freire, a Wilma de "Marcas da Paixão", afirma que
"90% dos elencos das novelas são escalados de forma errada, e a Globo adora rotular atores". "Isso, a longo prazo, não
ajuda a formar novos artistas. É um desperdício", afirma. Sobre sua personagem, ela diz: "É claro que meu tipo físico
me leva a fazer "mulheres da terra", assim
como Wilma e Filó. Mas as semelhanças
acabam aí. O que me alegra é que, com a
Wilma, posso ajudar a denunciar a pobreza deste país".
Assim como Jussara, Tânia Alves, a
Zefinha da novela da Record, também
considera um desperdício quando alguns autores insistem em chamar um
ator para o mesmo tipo de papel: "Muitos deles têm uma leitura imediatista do
elenco. Querem que o telespectador bata
o olho e reconheça o personagem. Isso
faz com que atores geniais como José
Dumont, por exemplo, nunca sejam
chamados para interpretar milionários.
É preciso um pouco mais de ousadia".
Com quase 20 anos de carreira na TV,
Tânia se tornou uma espécie de musa
nordestina, ao participar de produções
como "Órfãos da Terra" e "Morte e Vida
Severina", da Globo. "Fiz outros tipos, entre eles a Clotilde de "Ti-Ti-Ti". Mas fico com saudade de fazer uma
mulher mais sofisticada, urbana, mais parecida comigo", diz.
Solange de Castro Neves, autora de "Marcas da Paixão", concorda que é bastante comum um ator ser convidado para fazer algo que já mostrou em outro trabalho. "É mais cômodo e menos arriscado. E, numa novela, você tem de ter algumas certezas. Por isso chamei o
Oscar Magrini para fazer um cafajeste. Sei que ele dará
conta do recado, apesar de não ser, pelo menos nesse
início da trama, um papel que exige tanto dele."
Mas, avisa Solange, um autor tem de respeitar seu
elenco e dar desafios a seus atores: "Assim sendo, convidei a Irene Ravache, que raramente faz papéis de vilã,
para viver Dete, uma mulher ambiciosa e mau-caráter.
Com desafios desse nível, o ator se sente motivado".
(ERIKA SALLUM)
Colaborou VANESSA CAMPOS, free-lance para
a Folha.
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