São Paulo, domingo, 21 de maio de 2000


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VALE A PENA VER DE NOVO
Humberto Martins, Marcelo Novaes e Oscar Magrini são alguns dos atores que fazem sempre os mesmos personagens
Atores são "condenados" aos mesmos papéis na TV

DA REPORTAGEM LOCAL

UMA espécie de "maldição" ronda alguns atores da televisão brasileira. É só começar uma nova novela que eles retornam à TV fazendo o mesmo papel de sempre. Seja por causa de seu biótipo ou por vontade dos autores das tramas, que cismam em escalá-los para interpretar personagens semelhantes aos que fizeram no passado, o fato é que esses atores acabam dando ao telespectador uma estranha sensação de "déjà vu".
É o caso de Oscar Magrini, que agora "clona" seu Ralf, de "O Rei do Gado", em "Marcas da Paixão", nova novela da Record, na qual vive (de novo) um cafajeste. Na mesma produção, Jussara Freire volta a fazer uma mulher rústica e interiorana, lembrando sua famosa Filó de "Pantanal", e Tânia Alves acrescenta mais uma nordestina a sua carreira.
Mas os maiores exemplos desse "vale a pena ver de novo" são Humberto Martins e Marcelo Novaes. Os dois estão em "Uga Uga", de Carlos Lombardi, nova novela das sete da Globo, nos papéis de Baldochi e Beterraba, respectivamente.
Logo nos primeiros capítulos, já dava para perceber o "parentesco" de Baldochi com o Bruno de "Quatro por Quatro", outra produção de Lombardi protagonizada por Martins. Ambos são sensuais, têm bom caráter e trazem como grande trunfo os músculos, que enlouquecem as mulheres da trama.
O porte atlético e o jeitão mulherengo, sempre com a camisa aberta, consagraram Novaes e seu Raí, também de "Quatro por Quatro" (levada ao ar pela Globo em 94). As mesmas características marcam Beterraba -a semelhança quase impediu que o ator fosse chamado para o elenco: com receio de que alguns telespectadores achassem os dois muito parecidos, Lombardi pensou inicialmente em Murilo Benício ou Marcos Palmeira para o papel. Porém os dois estavam com a agenda lotada, e Novaes acabou sendo o escolhido.
"É uma visão simplista e superficial dizer que meus personagens se repetem. Mas esse tipo de comentário sempre existiu. O estranho é que, quando inovo demais, as pessoas também reclamam -o que é bastante normal, já que novela é de graça e tem grande audiência", afirma Lombardi. Segundo o autor, há diversos fatores que levam parte do público a apontar coincidências entre, por exemplo, Bruno e Baldochi: "O Humberto tem uma voz e um visual marcantes. É da natureza dele. Mas ele também sofre por não ser rotulado de "grande ator". Quando um suposto "grande ator" faz um papel igual, ninguém fala mal. Só que, no caso do Humberto, todo mundo cai em cima".
Para Humberto Martins, é um "equívoco dizer que os dois personagens se parecem": "As situações são semelhantes porque o estilo do autor se equivale. Todo autor de novela tem um estilo, e o do Lombardi é mais arrojado".
Atriz experiente, Jussara Freire, a Wilma de "Marcas da Paixão", afirma que "90% dos elencos das novelas são escalados de forma errada, e a Globo adora rotular atores". "Isso, a longo prazo, não ajuda a formar novos artistas. É um desperdício", afirma. Sobre sua personagem, ela diz: "É claro que meu tipo físico me leva a fazer "mulheres da terra", assim como Wilma e Filó. Mas as semelhanças acabam aí. O que me alegra é que, com a Wilma, posso ajudar a denunciar a pobreza deste país".
Assim como Jussara, Tânia Alves, a Zefinha da novela da Record, também considera um desperdício quando alguns autores insistem em chamar um ator para o mesmo tipo de papel: "Muitos deles têm uma leitura imediatista do elenco. Querem que o telespectador bata o olho e reconheça o personagem. Isso faz com que atores geniais como José Dumont, por exemplo, nunca sejam chamados para interpretar milionários. É preciso um pouco mais de ousadia".
Com quase 20 anos de carreira na TV, Tânia se tornou uma espécie de musa nordestina, ao participar de produções como "Órfãos da Terra" e "Morte e Vida Severina", da Globo. "Fiz outros tipos, entre eles a Clotilde de "Ti-Ti-Ti". Mas fico com saudade de fazer uma mulher mais sofisticada, urbana, mais parecida comigo", diz.
Solange de Castro Neves, autora de "Marcas da Paixão", concorda que é bastante comum um ator ser convidado para fazer algo que já mostrou em outro trabalho. "É mais cômodo e menos arriscado. E, numa novela, você tem de ter algumas certezas. Por isso chamei o Oscar Magrini para fazer um cafajeste. Sei que ele dará conta do recado, apesar de não ser, pelo menos nesse início da trama, um papel que exige tanto dele."
Mas, avisa Solange, um autor tem de respeitar seu elenco e dar desafios a seus atores: "Assim sendo, convidei a Irene Ravache, que raramente faz papéis de vilã, para viver Dete, uma mulher ambiciosa e mau-caráter. Com desafios desse nível, o ator se sente motivado".
(ERIKA SALLUM)



Colaborou VANESSA CAMPOS, free-lance para a Folha.


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