São Paulo, domingo, 22 de julho de 2001

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PROFESSORA ELETRÔNICA

Televisão educa quem cedo madruga

Fotos Divulgação
"Vila Sésamo", considerado exemplo de bom programa educativo


Na TV há poucos programas educativos, e a maioria vai ao ar antes das 6h; lei tem conceitos vagos e canais agem como bem entendem

CLÁUDIA CROITOR
DA REPORTAGEM LOCAL

QUER QUE seus filhos assistam a algo educativo na televisão? Então coloque o despertador para tocar por volta das 5h -sábado e domingo. É nesse horário que é exibido o que consta da programação das emissoras de TV aberta como "programa educativo". Mas, a não ser que seus filhos sejam professores do ensino médio ou se interessem por discussões pedagógicas, você terá uma decepção. Esses programas ditos educativos são, na verdade, a mesma atração: "Um Salto para o Futuro", produção do Ministério da Educação voltada para professores.
Com algumas exceções -como os "Telecursos" e atrações como "Globo Ciência" e "Globo Ecologia", exibidas no começo das manhãs pela Globo- isso é tudo o que há na TV aberta comercial com a indicação de programa educativo.
Mesmo assim, tecnicamente, nenhum dos canais está descumprindo a Constituição, que no artigo 221 determina que as emissoras de TV dêem "preferência a finalidades educativas (...)".
"A TV comercial não tem nenhuma legislação que a obrigue a cumprir a Constituição", afirma o sociólogo e jornalista Laurindo Leal Filho, presidente da TVer, ONG que analisa o conteúdo da televisão brasileira. De fato, não há lei que determine o que é um programa educativo, nem que regulamente a inclusão dessas atrações na programação das emissoras.
"Alguém pode argumentar que o programa da Xuxa tem conteúdo educativo. Sob um certo ponto de vista, pode até ser verdade. Ser educativo é um conceito muito amplo, que nenhuma legislação consegue especificar", diz o jornalista Geraldinho Vieira, que dirige a Agência de Notícias dos Direitos da Infância.
E é nessa amplitude que as emissoras podem se apoiar para explicar de que maneira o conteúdo de sua programação segue as normas instituídas pela Constituição. A Globo, por exemplo, segundo Luís Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação, procura "contextualizar todos os programas em um tripé de valores: entretenimento, informação e educação. Mesmo dentro de obras de ficção, como as telenovelas, esta preocupação se faz presente".
Atualmente, é o decreto-lei 236, de 1967, que regulamenta as telecomunicações no Brasil. No artigo 16, o decreto menciona a obrigatoriedade de transmissão de atrações educativas pelas emissoras e determina que os programas "deverão ser transmitidos em horários compreendidos entre 7h e 17h".
Mas um convênio entre o MEC e a Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), assinado em 1991, de certa forma amenizou essa obrigatoriedade. Pelo convênio, renovado a cada dois anos, "as emissoras de televisão divulgarão um programa com duração de 20 minutos aos sábados ou domingos, entre seis e 22 horas" -o tal programa educativo que aparece na programação dos canais abertos, produzido pela TV Escola, do MEC.
Mas o programa não é para crianças -no último domingo, foi exibido um debate com pedagogos sobre a alimentação escolar- nem vai ao ar no horário determinado. As emissoras costumam exibi-lo, geralmente, entre 5h e 6h.
Projetos
Nem o projeto da nova lei de radiodifusão, que foi anunciado pelo ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, e está em processo de consulta pública, deixa mais clara essa questão. Segundo o artigo 88 do projeto, as emissoras deverão "transmitir percentual mínimo de programas educativos e informativos dirigidos à criança, entre as sete e as 22 horas (...)" e deverão "dispor de pedagogos e psicólogos para avaliação de seus programas educativos"; mas não há especificação do conteúdo desses programas.
No Senado e na Câmara tramitam projetos de lei sobre o assunto, mas que também não trazem uma definição clara do que é educativo.
O do Senado, que está sendo avaliado pela Comissão de Educação, diz que a veiculação de programação educativa deve atender "em todos os aspectos, às necessidades educacionais e informativas da criança". Para justificar o projeto, o autor, o senador Pedro Simon (PMDB-RS), cita como exemplo de programa educativo bem-sucedido o "Vila Sésamo", exibido no Brasil nos anos 70.
Na Câmara, o projeto, do deputado Givaldo Carimbão (PSB-AL) visa alterar o artigo 16 do decreto-lei 236, determinando que as emissoras reservem, diariamente, "espaço não inferior a 30 minutos para veiculação de programas educacionais".
Para Vânia Carneiro, professora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e pesquisadora na área de TV e educação, a definição de um tempo mínimo obrigatório para transmissão desses programas é fundamental. "Isso existe nos EUA e só melhorou o nível da programação infantil de lá."
"Mas é preciso redefinir o que é educativo. Este conceito ainda está muito restrito ao conceito de "teleaula", e isso é incompatível com o principal objetivo das emissoras comerciais, a audiência", diz. "É preciso fazer programas que estejam ligados às necessidades do mundo da criança, que contribuam para que ela aprenda a lidar com questões tão diversas como a morte e fazer xixi na cama. "Castelo Rá-Tim-Bum" e "Sítio do Pica-Pau Amarelo" são exemplos disso."
Procurados durante uma semana pela Folha, os diretores de programação da Record e do SBT, que com a Globo são as emissoras de maior audiência, não se pronunciaram sobre o assunto.



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