São Paulo, domingo, 26 de março de 2000


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CRÍTICA

Quem quer ser como Silvio Santos?

Francisco Martins da Costa

PARA Silvio Santos, os Estados Unidos são o melhor lugar do mundo e, para trazer um pouquinho desse "paraíso" às suas colegas de trabalho, o homem do baú está transformando sua emissora numa réplica tupiniquim de uma rede norte-americana -com tudo que isso significa de bom e de ruim.
O empresário acabou de fechar um acordo de centenas de milhões de dólares para ter o direito de exibir em primeira mão filmes de sucesso produzidos pelos estúdios Warner e Disney.
Os "reality shows", produto típico da TV dos EUA, têm em Ratinho sua sucursal brasileira, ainda que os casos aqui apresentados sejam mais bizarros e miseráveis.
Além dos filmes e do programa de Ratinho, a emissora ainda é o lar da Oprah Winfrey brasileira (Hebe Camargo) e da versão tropical do Emmy (o Troféu Imprensa), além das novelas latinas -outro produto muito popular na terra de Bill Clinton.
Para completar, enquanto a febre dos "game shows" campeia nos EUA, Silvio lança mão de seu "Show do Milhão", inspirado exatamente naquele programa que atualmente é um dos maiores sucessos da TV ianque, o "Who Wants to Be a Millionaire" (Quem Quer Ser um Milionário).
Lançado para tapar um buraco nas férias de verão do ano passado na rede ABC, "Millionaire" surpreendeu e alcançou as audiências mais altas da TV norte-americana no período.
Em viagem aos EUA, no segundo semestre de 99, Silvio Santos se encantou com o programa e, de lá mesmo, ordenou que fossem colocadas no ar chamadas anunciando um misterioso programa que prometia "mudar a vida das pessoas".
Quando voltou, lançou o "game show" no Brasil e faturou muitos milhões -cada um dos candidatos a participar do programa teve de comprar uma revista que custava R$ 3, e foram vendidos mais de 2 milhões de exemplares.
Só uma pequena parcela desse dinheiro, no entanto, foi distribuída na forma de prêmios.
A conta é simples: foram arrecadados mais de R$ 6 milhões, mas ninguém levou o prêmio máximo.
A conclusão é que o grande milionário do jogo é a banca -o próprio apresentador.
O sucesso do programa dos EUA vem se repetindo (ainda que em menor escala) aqui no Brasil. Com a exibição do "Show do Milhão", o SBT atinge cerca de 20 pontos no Ibope, um índice excelente para os padrões da emissora.
Tanto nos EUA como no Brasil, o jogo é visto por muita gente, mas poucos reconhecem o poder do programa de entreter o telespectador. Enquanto por aqui a atração é apreciada pelo povão por sua "dificuldade", mas acompanhada pelos mais instruídos apenas por seu caráter "trash", nos EUA ela foi banida da festa dos Emmy distribuídos aos programas do horário nobre apesar de ser exibida à noite pela rede ABC.
Com isso, "Who Wants to Be a Millionaire" vai competir na cerimônia dos Daytime Emmys, uma premiação de segunda classe nos EUA, dominada por telenovelas (as soap operas) e "talk shows" escandalosos.
A justificativa para a discriminação seria a inexistência de uma categoria para os "game shows" na festa dos Primetime Emmys -o que é inexplicável, afinal, após o sucesso de "Millionaire", quase todas as emissoras atualmente têm gincanas e competições em pleno horário nobre.
Regis Philbin, o apresentador da atração nos EUA, que sempre foi uma celebridade do segundo escalão no país, desfruta agora, aos 66 anos, de todas as regalias que a fama pode proporcionar.
Aqui no Brasil, o papel de condutor do jogo cai como uma luva para Silvio Santos. Ele consegue criar suspense nas questões mais prosaicas e jamais deixa o ritmo da atração desandar e o interesse do telespectador cair.
Mas se tem uma função que o programa não consegue cumprir é a de fornecer algo instrutivo aos telespectadores. Mesmo em questões tolas como "Quem é a namorada do Pateta?" a produção patina e aceita como resposta "Clarabela", que é a namorada do personagem Horácio nos quadrinhos de Walt Disney.
Em outra edição, o jogo só serviu para evidenciar o baixíssimo nível dos universitários convidados a dar dicas aos participantes. Quando a pergunta era "Bruxelas é a capital de que país europeu?", três estudantes da banca sugeriram que a candidata escolhesse como resposta a Suíça.
Pior foi quando o próprio Silvio Santos disse que o escritor argentino Jorge Luis Borges é brasileiro.


Excepcionalmente nesta edição o artigo de Fernando de Barros e Silva não é publicado


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