São Paulo, domingo, 13 de abril de 2008

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Recall iminente

VW afirma que não convocará proprietários de Fox, o que desgasta imagem da marca

Letícia Pontual/Folha Imagem
O carioca Pedro Saldanha perdeu a ponta do dedo médio da mão direita ao tentar rebater o banco traseiro de seu Fox em 2006

FABIANO SEVERO
DA REPORTAGEM LOCAL

Quando amanhã os Ministérios da Justiça, Público Federal e Público Estadual de São Paulo, da Bahia e de Santa Catarina e o Procon-SP perguntarem à Volkswagen se ela irá anunciar o recall do banco traseiro do Fox, a resposta será negativa.
A afirmação é de Thomas Schmall, presidente da VW, em entrevista exclusiva à Folha (leia na pág. 12). Mesmo sob o risco de o caso parar na Justiça, ele apelará a "soluções técnicas" para não convocar 477 mil Fox, CrossFox e SpaceFox, cujo mecanismo de rebatimento do banco traseiro já feriu pelo menos dez pessoas.
A montadora fez acordo com cinco que entraram na Justiça. Haverá mais uma ação nesta semana. Pedro Saldanha, 33, técnico de som no Rio, perdeu a ponta do dedo em 2006.
"Falaram para eu pegar a ponta, com unha e tudo, e levar ao hospital o mais rápido possível. Então pensei: "Não vou pegar a ponta do meu dedo. Isso é loucura". Foi a cena mais bizarra da minha vida." Os médicos lhe informaram que não era possível religar os tendões.
"Acho que a Volks deveria fazer o recall. Dos 8 acidentes, 7 poderiam ter sido evitados."

Falsa bondade
É a mesma opinião de Joaquim Burin Filho, professor do curso de gestão automotiva da FEI (Fundação Educacional Inaciana). "Uma determinada empresa não é boazinha porque está fazendo o recall. É sua obrigação corrigir um erro de projeto, e com urgência."
Burin cita o caso da Ford, que, em 2000, travou uma disputa judicial com a Firestone para definir quem assumiria a culpa pelos 3,5 milhões de pneus defeituosos do Explorer. Nos EUA, eles provocaram a morte de 203 pessoas e o ferimento de outras 700.
No Brasil, o maior recall pertence à Chevrolet, que convocou 1 milhão de proprietários de Corsa em 2000.
Ivan Pinto, professor de gerenciamento de marcas da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), diz que o recall é benéfico para a imagem se a empresa, assim que detecta a falha, bota a "boca no trombone" e conserta o problema. "Não foi o caso da VW."
O primeiro acidente com o banco do Fox é de 2004, mas só em fevereiro de 2008 foi criado um mecanismo para evitar o acidente. É um anel de borracha que impede que se coloque o dedo na argola do banco.
"O recall deve ser feito quando o produto tem alto grau de periculosidade, e o número de acidentes mostra que o sistema é perigoso", alerta Carlos Alberto Nahas, assistente da diretoria de fiscalização do Procon.

Queda
O professor da ESPM conta que é raro uma empresa grande reconhecer o erro. "Se a VW agir após a imposição da Justiça, terá grande probabilidade de arranhar sua imagem e perder vendas." E isso já ocorreu.
Segundo a Fenabrave (federação das concessionárias), entre janeiro e fevereiro, as vendas de Fox e CrossFox caíram 18%: de 11.172 para 9.105 carros. A VW explica que o mês de fevereiro costuma ser fraco por ter menos dias úteis e Carnaval.
Só que, na própria gama da VW, o quadro é diferente. O Gol caiu 3% em fevereiro. O Fiat Palio e o Chevrolet Celta recuaram 3% e 1%, respectivamente.
O Fox ainda se mantém na quinta posição do ranking geral de vendas. Seu crescimento em março, porém, foi menor que o dos rivais. Subiu 8%, enquanto o Gol cresceu 28%; o Palio e o Celta, 10% cada um.
Pinto acredita que a VW possa reverter o quadro. A Johnson&Johnson, em 1982, recolheu 31 milhões de frascos de Tylenol após a morte de sete pessoas em Chicago. Havia veneno em alguns comprimidos, posto por um ex-funcionário.
A saída foi inventar as atuais embalagens invioláveis. Em seis meses, recuperou as vendas -e a confiança do cliente.


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