São Paulo, sábado, 02 de fevereiro de 2008

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CRÍTICA DE LOJA
[questão de gosto e opinião]

LADEIRA ACIMA, LADEIRA ABAIXO

Nem tudo são flores no bairro de alma hippie

TETÉ MARTINHO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"Alternativo", originalmente, é o produto de um pensamento que tenta inventar um jeito novo de fazer as coisas. Foi só depois que o termo se colou ao resgate do "simples" e do "natural" para a vida diária dos anos 90 e à tendência ao artesanal em roupas e objetos.
No comércio da Vila Madalena, o espírito original do alternativo vive. Foi lá que nasceram a Livraria da Vila, o ateliê do designer Carlos Motta, as marcenarias Trancoso e Baraúna; foi lá que Ronaldo Fraga, um dos mais inventivos estilistas brasileiros, abriu sua loja paulistana.
Para cada tentativa bem-sucedida de fazer moda e design originais, ainda que em pequena escala, porém, o bairro abriga dez negócios que chegam atraídos por sua fama "alternativa" e se dispõem a explorar o delicado filão do artesanato sem muita inspiração ou noção de perigo.
O resultado aparente é uma derrama de galinhas-d'angolas, tapetes de fiapo colorido e caixas de fósforo decoradas. Mas o mais perverso é que uma cena que teria tudo para virar atração turística de apelo internacional fica com mais altos e baixos do que o relevo do bairro.
A depender da ladeira que você subir, pode se ver na surpreendente Mundaréu, que vende poucas, excelentes e exclusivas peças de artesanato produzidas em trabalhos comunitários, e que integra uma rede global chamada Preço Justo. Lá, você encontra um lindo castiçal de ferro reaproveitado, em forma de homenzinho, por R$ 22.
A poucas quadras, com um nome parecido, fica a Recicla Mundo, cuja oferta de artesanatos acende velas para deuses e diabos mexicanos, marroquinos e mineiros, e onde uma bolsa de água quente com capa de tricô, "reciclada" de seis invernos europeus atrás, custa R$ 72, e um "kit" para plantar cebolinha, consistindo num balde e sementes, R$ 61.
É preciso se safar dessas armadilhas para chegar ao melhor da Vila; coisas como os jogos de cama bordados da Panacéia, os pijamas infantis de coqueirinhos da Para Dormir, as roupas fashion de bebê da Santa Paciência, as calcinhas de malha listradas da Polly Magoo, as xícaras com asas do Estúdio Manus, a papelaria coordenada da Portfólio.
São exemplos de uma idéia contemporânea de artesanal, tendente ao casual/bem-humorado e de preço razoável. Como a oferta maluca da Agá Presentes e o refrigerante de caju da Feira Moderna, essa é a cara da Vila. Não-alternativos podiam voltar para o seu Lar Center.


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