São Paulo, sábado, 04 de julho de 2009

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CRÍTICA DE LOJA [questão de gosto e opinião]

Nem sempre o que é natural é melhor

Marca de roupas orgânicas capricha mais no social

TETÉ MARTINHO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Se você tem irritação de produto que requer uma bula conceitual para ser apreciado, melhor pular a Eden.
Cercada por espelhos d'água com peixes, em plena Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo, a loja oferece araras esparsas de camisetas, vestidinhos, moletons e jeans cujo estilo calculadamente despretensioso de cores poucas (branco, cinza, verde-água) não chegam a justificar os preços de grife fashion.
Você até suspeita que o rapaz postado à sua espera tenha explicações a oferecer, e que não haverá maneira de escapar delas. Só não pode suspeitar do grau de elaboração do discurso. À primeira chance, ele vai contar que as roupas da marca estão no centro de um projeto social que envolve 400 famílias de agricultores no Paraná; que elas são feitas de algodão "98% orgânico", ou seja, cultivado sem agrotóxico "desde a semente"; que 50% dos pesticidas consumidos no mundo são usados em plantações de algodão; e que um desses químicos, o agente laranja, foi descoberto durante a Guerra do Vietnã, quando era usado pelo exército americano para desfolhar as árvores e enxergar o inimigo com mais facilidade, lá embaixo.
Colhida por essa sessão involuntária de "Apocalypse Now", você já está a ponto de chorar. Mas, em que pese a solidariedade irrestrita às vítimas da crueldade do mundo capitalista -das árvores aos pequenos agricultores-, nada muda o fato de o casaco canguru de algodão cinza da grife ter o caimento de um colete ortopédico, ainda que o toque do tecido seja realmente mais agradável do que a média.
Pelo preço módico de R$ 279, ademais, eu iria correndo para uma cor viva, e linda, de alguma Tommy Hilfiger da vida, com toda a química -que Deus me perdoe. Com exceções discretas, caso das camisetas com estampas de argila, o que sobra em correção ecológica falta naquilo que não pode faltar: charme. Sem agrotóxicos, mas sem graça, os vestidinhos com capuz da marca dão saudade da Putumayo nova-iorquina, que, antes de virar selo de "world music", vendia roupas de algodão cru com tingimentos e bordados inspirados no México e na Índia. Naturais, mas abusadas.


ONDE ENCONTRAR

Eden
r. Harmonia, 271, Vila Madalena, tel. (11) 3818-9500, São Paulo




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