São Paulo, sábado, 06 de dezembro de 2008

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MARIA INÊS DOLCI [defesa do consumidor]

LEI DO SAC TEM QUE "PEGAR"


A fiscalização dos call centers tem sido intensa. Continuará assim? Talvez não. Caberá ao cidadão cobrar seus direitos

FOI DADA A LARGADA para a regulamentação dos Serviços de Atendimento ao Consumidor (SACs). Na segunda-feira, empresas e seus operadores suaram frio para (tentar) cumprir as exigências, como atender o consumidor em até um minuto.
A rigor, é uma boa regulamentação, uma vez que o atendimento ao cliente, no Brasil, padece de algumas moléstias graves.
Primeiramente, o descaso absoluto, com espera interminável, transferência entre atendentes, queda da ligação. Além disso, há fidelização na marra, a ferro e fogo, ou seja, a imposição de dificuldades e lentidão propositais, para que o consumidor desista de cancelar serviços ou de cobrar devolução do dinheiro, troca de produto, conserto, visita técnica etc.
Leis, contudo, só são boas se "pegam", um velho cacoete nacional. Se os cidadãos não brigarem pelo cumprimento da lei, ou se não houver interesse explícito dos governos e do Judiciário, nada feito.
Lembremo-nos da lei seca no trânsito. Inicialmente, com a fiscalização policial, caíram os acidentes e as mortes nas vias urbanas e rodovias. O tempo passou, os bafômetros sumiram e, hoje, motoristas aparecem na televisão, despreocupados, afirmando que bebem, sim, e que dirigem após os drinques.
Nos primeiros dias, a fiscalização dos SACs foi intensa. Continuará assim? Talvez não. Caberá ao consumidor, grande interessado, cobrar firmemente seus direitos. Porque o Código de Defesa do Consumidor (CDC) teria morrido se não houvesse constante mobilização de cidadãos, de entidades de defesa do consumidor, do Ministério Público, do Procon etc.
As empresas chiarão, dirão que as exigências são exageradas, que isso afetará seus lucros, que em momentos de crise não se faz tal coisa.
A história é muito útil também nessas horas. Alguém se lembra do que os escravocratas alegavam no Brasil, em 1888? Que o fim da escravidão quebraria a economia brasileira. Pois é. Falaram idênticas tolices sobre o CDC.
O mais ridículo e triste foi constatar que a maioria das agências reguladoras, além de pouco ou nada regularem, não deram a mínima importância à regulamentação do SAC. Não me surpreendeu porque, sendo bem sincera, excetuando-se a agência de saúde suplementar, não sei para que as demais existem.
Foi interessante, quase cômico, ouvir as explicações das empresas e agências. "Excesso de demanda" foi a mais utilizada. Bem, se somente dois ou três consumidores ligarem, é bem provável, mesmo, que não esperem mais de um minuto, com ou sem lei do SAC.
O que traz mais insegurança nas novas normas do atendimento é que uma das vias a que o consumidor deverá recorrer, se o atendimento estiver em desacordo com a lei, serão as agências reguladoras. Que, como sabemos, não costumam nem arranhar os interesses das empresas. Melhor apostar em Procons e correlatos e no Ministério Público.

http://mariainesdolci.folha.blog.uol.com.br


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