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CRÍTICA DE LOJA [questão de gosto e opinião]
Cacarecos sem limite
Evento organizado por empresas parece, mas não é, venda de garagem
TETÉ MARTINHO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Quando começou a aparecer
por aí, a faixa "Família Vende
Tudo" parecia um convite à
prática conjugada de dois esportes prediletos: vasculhar velharias à venda e xeretar imóveis vazios. De fato, é. O problema é achar, em meio às legiões
de ácaros e às cenas melancólicas de decadência e abandono
incluídos no pacote, algo além
de erros decorativos que o tempo não fez nada para aliviar.
"Família Vende Tudo", pena,
não é venda de garagem, esse
adorável uso dos países ricos
em que as pessoas põem preços
na bugiganga e deixam tudo à
venda na porta. É, antes, um
"evento" organizado por empresas que avaliam os objetos
-às vezes, como o nariz deles-
e estendem a faixa, não sem antes limpar a área do que houver
de minimamente valioso e/ou
interessante e colocar no lugar
os restos da venda da "família"
anterior.
É o que sugere a cacarecada
sem lei e sem limite que a referida frase anuncia, até o fim do
mês, na esquina das ruas Arquiteto Jayme Fonseca e Diógenes
Ribeiro de Lima, no Alto de Pinheiros, por exemplo. A loucura começa na entrada, guardada de um lado por um Buda balinês "em madeira maciça"
(R$ 6.000) e, de outro, por uma
manequim de corpo inteiro,
pelada, careca e de olhos verdes
(R$ 220).
Cruzado este umbral, espere
realmente "tudo": horrendos
entalhes de madeira com motivos nordestinos, dos anos 70;
uma mesa com tampo de vidro
e compartimentos recheados
de sementes, recém-caída em
desgraça; um descanso de prato
em forma de ideograma, idem;
cortinas de tampinhas de lata,
da série "horrores da reciclagem"; gravuras mais baratas do
que suas molduras; e até um
címbalo quebrado pelo qual pedem R$ 50. Pode?
Há itens certamente feitos
agora, como bancos de bonde
"patinados" e bonecos articulados de madeira; e raras velharias de alguma estirpe, como o
"Almanaque Tico-Tico", de
1948, e a "fofoqueira", mesa de
telefone com banqueta grudada e pés-palito (R$ 700).
Além de um conjuntinho
praticamente irresistível para
café de louça e prata (R$ 50), a
melhor coisa da casa era o quintal -desses como não se fazem
mais.
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