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FAZENDO ÁGUA
Enquanto o consumo aumenta e a escassez preocupa, o mercado de águas fabrica mais promessas e fica cada vez mais sofisticado
Insossa, inodora e incolor?
DÉBORA MISMETTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Bons tempos aqueles em que
você só precisava decidir entre
"com" ou "sem gás", na hora de
comprar uma garrafa de água.
O que move o mercado hoje são
águas "especiais", saborizadas
ou de propriedades funcionais.
Segundo a consultoria Zenith, que acompanha o setor
em escala global, a classe de
produtos que mais cresceu em
2007 foi a das bebidas com menos de 25% de suco -onde entram as águas com sabor. Esse
segmento cresceu 6,7%, alavancado pelo surgimento das
bebidas funcionais. A água mineral cresceu em 6,1% e ultrapassou os refrigerantes.
No Brasil, a Danone acaba de
lançar a água Bonafont, que
tem como atrativo o baixo nível
de sódio. Além de não contribuir para o acúmulo da substância, a novidade ajudaria a
eliminar o sódio presente no
organismo. Mas o rótulo nada
informa a respeito, porque a lei
brasileira não permite.
O presidente da Abinam (Associação Brasileira da Indústria
de Águas Minerais), Carlos Alberto Lancia, diz que o setor luta há anos para anunciar as funções terapêuticas de seus produtos. "Água não é tudo igual.
Deixamos de criar um mercado
por causa de barreiras", afirma.
Outro mercado importante é
o das águas "premium". Ainda
não há essas bebidas de luxo
produzidas em território nacional, mas isso deve mudar
com o início da fabricação da
Equa. A origem da água será um
aqüífero da floresta amazônica.
O produto teria menos partículas dissolvidas do que qualquer
outro à venda hoje. Para o presidente da Abinam, o país ainda
não está pronto para esse tipo
de água. "O mercado brasileiro
não paga o preço disso", diz
Lancia. Mas há quem pague.
Mesmo sem função para organismo ou uma origem especial, as águas encontram meios
de subir seus preços com investimento em design de embalagem. A francesa Evian contrata
estilistas para desenvolver garrafas em edição limitada. Em
2007, Christian Lacroix fez
duas versões: a mais cara foi leiloada por US$ 23 mil (R$ 54
mil). Para 2009, o lançamento
da marca são as garrafas boladas por Jean-Paul Gaultier.
Segundo Paulo Al-Assal, diretor do birô de tendências Voltage, essas águas luxuosas estão
na contramão do movimento
de consumo consciente. "Você
está comprando uma garrafa
ou a água?". Ele afirma que as
águas especiais que podem cair
no gosto dos brasileiros são
mesmo as funcionais.
A americana Function
Drinks tem uma cartela de sabores que prometem ajudar a
relaxar, a perder peso e até a
evitar doenças. Um deles é o
Urban Detox (desintoxicação
urbana), que limparia o corpo
de poluentes e daria uma mãozinha para superar a ressaca.
Para Dan Waitzberg, professor de gastroenterologia da Faculdade de Medicina da USP, os
efeitos prometidos pelas águas
funcionais são possíveis. "Há
componentes antioxidantes,
como o chá verde e a vitamina
C", diz Waitzberg, 57. Mas é
preciso estar atento à concentração das substâncias em cada
dose das bebidas. "O Urban Detox tem 24 mg de vitamina C
em cada garrafa, sendo que a
quantidade recomendada por
dia é de 90 mg. As pessoas se esquecem de comer frutas e legumes e esperam alternativas industrializadas ao que a natureza oferece de graça", diz.
Produtos reduzem desperdício
CYRUS AFSHAR
DA REPORTAGEM LOCAL
Mangueira na mão e água
jorrando para lavar o carro ou a
calçada. Mais do que um símbolo do desperdício que acontece todos os dias nas cidades, a
cena é motivo de preocupação.
No Estado de São Paulo, a disponibilidade hídrica é pobre
(2.200 m3 por habitante) e, em
sua capital, o nível é crítico, segundo a classificação da ONU:
apenas 200 m3 de água por pessoa. Segundo Ricardo Chahin,
coordenador do Programa de
Uso Racional da Água da Sabesp, cerca de 50% da água consumida pelos paulistanos é "importada" de bacias vizinhas. E
boa parte dessa água é destinada ao consumo doméstico.
Algumas medidas simples podem fazer a diferença. Este mês
a Sabesp lançou um programa
para incentivar a medição individual em condomínios, que resulta em uma conta "personalizada". Essa mudança deve gerar
uma economia de até 20%.
Alguns produtos também ajudam a combater o desperdício.
As empresas do ramo de metais
e louças sanitárias Roca e Deca
lançaram em 2007 e neste ano
descargas de dois níveis (3 litros
e 6,8 litros) que poupam até
60% de água. Os vasos sanitários respondem por 14% do
consumo doméstico de água.
"A tendência clara, que já
aconteceu na Europa, é que esse
modelo [fracionado] se torne
mais barato e o antigo desapareça", diz Sérgio Melfi, gerente de
vendas e marketing da Roca.
Outro produto que pode ajudar a poupar água é o arejador.
Localizada no bico da torneira, a
peça mistura a água com o ar,
aumentando o volume consumido, sem aumentar o gasto de
água. A economia pode chegar a
76%, segundo a Sabesp.
O esforço de economizar em
casa não é inútil. Mais de 70%
do faturamento da Sabesp vem
das contas das residências. Os
paulistanos consomem 220 litros por dia em média (incluindo aí uso comercial e industrial), nível considerado excessivo. O recomendado pela ONU é
de 110 litros por pessoa. "O
maior vilão não é a torneira, são
as pessoas. Usando a água racionalmente em casa, a economia
pode chegar a 10%", diz Chahin.
"O problema é que há uma
inércia muito grande quando o
assunto é água. As pessoas pensam que vivemos em um país
com muita água, o que é verdade. Mas há escassez nos grandes
centros urbanos", afirma Wilson Passeto, da ONG Água e Cidade, que trabalha a questão do
uso consciente da água em escolas e empresas. Chahin ressalva,
porém, que o consumo de água
por habitante vem baixando em
São Paulo. "Durante os "apagões" de água de 2001 e 2003,
houve racionamento, e o consumo baixou. Quando o fornecimento voltou, o consumo ficou
abaixo do que era antes".
Mas boa parte do desperdício
acontece antes de a água chegar
à população. No Brasil, 45% da
água é perdida -principalmente em vazamentos-, segundo
estudo de 2007 do Instituto Socioambiental. No Estado de São
Paulo, o número cai um pouco e
chega a 30%, e, na capital paulista, 18% da água vai embora
pelo ralo antes de ser usada.
Apenas 2,5% da água do mundo não é salgada. Desse total,
apenas 0,3% está na superfície,
em rios e lagos. De acordo com a
FAO, 923 milhões de pessoas
têm pouco acesso à água, e o
quadro deve piorar: até 2025,
quase 2 bilhões de pessoas vão
morar em países ou regiões com
absoluta falta de água.
>> A brasileira Bonafont, tem BAIXO TEOR DE SÓDIO e vem de uma fonte em Minas Gerais.
R$ 0,99 a garrafa de 500 ml, da Danone
>> ÁGUA FUNCIONAL Urban Detox, que promete ajudar a desintoxicar o corpo de poluentes e diminuir os efeitos da
ressaca. US$ 1,50 (R$ 3,50) cada uma, vendida em caixa com 24 unidades no site da fabricante, www.functiondrinks.com
>> A CANADENSE AQUADECO vem de "geleiras formadas antes da era glacial". US$ 11,50 (R$ 27) cada uma, em caixa com
6 unidades, no Aqua Maestro, www.aquamaestro.com
>> CRAVEJADA DE CRISTAIS, a garrafa é uma edição especial Dubai da Bling h2o.
Custa 2.500 euros (R$ 8.200) na Spring Water Shop, www.springwatershop.com
>> NOVO SABOR PÊSSEGO, da linha de águas da Ouro Fino, lançado em novembro
>> FEITA PARA CRIANÇAS, a Balance Water tem "extratos semelhantes aos florais de Bach", diz o fabricante.
US$ 1,67 (R$ 3,95) cada uma, vendida em caixa com 24 unidades, no Aqua Maestro, www.aquamaestro.com
>> A garrafa de água mineral com BAIXO TEOR DE SÓDIO da Ouro Fino é "assinada" pela atriz Priscila Fantin
>> GARRAFAS DESENHADAS PELOS ESTILISTAS Jean-Paul Gaultier, e Christian Lacroix, para Evian. Custa 4,95 euros cada uma
(R$ 16,20) na Spring Water Shop, www.springwatershop.com
>> ÁGUA FUNCIONAL Y Water, feita para crianças, tem altas concentrações de zinco e magnésio, o que pode não ser uma vantagem,
dependendo da quantidade consumida. US$ 1,67 (R$ 3,95) cada uma, vendida em caixa com 24 unidades, na www.amazon.com
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