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MARIA INÊS DOLCI [defesa do consumidor]
O GRANDE PAPAGAIO BRASILEIRO
Financiamentos são fundamentais para ativar a economia, mas não com os juros dos bancos brasileiros
MARIA É UM DOS 15 milhões
de brasileiros que têm dívidas acima de R$ 5.000. Ela
sempre foi uma pessoa que primeiro
acredita, e só descrê quando tem
fortes razões para isso. Maria acreditou que chegara a hora de a classe
operária ir para o paraíso. Talvez, a
passeio, ao bairro do Paraíso, logo
após a avenida Paulista. Nada mais
do que isso.
Sua avó, dona Aparecida, também
deve uma vela para cada santo, como se dizia quando ela era uma garotinha. Deve a aposentadoria e
muito mais, pois fez o empréstimo
consignado e uns carnês de crediário. Também não vai para o Paraíso,
quando muito até a Vila Mariana.
Ou à Ana Rosa.
Seu Onofre, que dança com ela no
baile da "melhor idade", como inventaram agora, "e é apenas um
bom amigo", sempre andou de cabeça erguida, pois os cobradores nem
sabiam seu endereço. Hoje, sabem.
Foi difícil resistir à TV digital. Bem, a
dívida está aí, para ficar, mas a TV,
pura enganação, amargo engano.
Até o jovem Duda, com seus 20
anos de praia, recebe todo tipo de
proposta para utilizar o fabuloso financiamento, pré-aprovado, daquele banco que só cobra 6% ao mês.
Mais ou menos a inflação prevista
para 2008. E um dia caiu nessa fria.
Todos devem, não negam, mas duvidam que possam pagar em dia.
Não entendem muito bem como o
que devem pode ser várias vezes superior ao que tomaram emprestado,
em função de juros sobre juros, correção, multas etc. Ninguém falava
nisso na hora de oferecer o crediário, o empréstimo, o financiamento.
À noite, eles dormem mal, demoram a pegar no sono, e qualquer ruído os acorda. Os pesadelos têm muitos cifrões, índices, protestos e cobradores. Durma-se com um barulho SPC desses.
São 15 milhões de pessoas, ou a
população do município de São Paulo somada às de Belo Horizonte e de
Porto Alegre. Todos devem muito,
porque houve uma política deliberada de substituir aumento de renda
por crédito farto.
Ora, financiamentos são fundamentais para ativar a economia.
Mas não com os juros praticados no
Brasil, por bancos com o beneplácito governamental.
Ainda mais quando se tem de pagar serviços básicos em dobro: uma
carga sueca de impostos, serviços
públicos de oitava categoria. Então,
impostos e escola particular. Impostos e plano de saúde. Impostos e segurança privada. Impostos e seguro
para o carro.
Quinze milhões de brasileiros empinam um gigantesco papagaio e devem fazer o impossível para renegociar suas dívidas, talvez ingressando
na Justiça. Pois ao menos terão uma
chance, considerando-se as decisões
recentes do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), com relação a taxas de
juros abusivas cobradas de consumidores de baixa renda.
Um conselho: quem deve mais do
que um terço do salário mensal, exceto as dívidas de longo prazo, para
financiamento imobiliário, por
exemplo, deve estabelecer uma "lei
seca" de gastos, até recuperar o controle de suas finanças. Não há calmante nem sonífero melhor do que
sair da mão dos agiotas mais conhecidos como banqueiros.
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