FHC vê uma revolução que não existe

Ex-presidente lamenta que joguem todos os políticos na mesma vala

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em entrevista em seu escritório na sede do iFHC (Instituto Fernando Henrique Cardoso) - Bruno Santos - 18.abr.2018/Folhapress

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Cruel ironia: no mesmo dia (quarta-feira, 6) em que o jornal Washington Post publicava artigo de Fernando Henrique Cardoso, vinham a público emails em que o ex-presidente pede ajuda a Marcelo Odebrecht (sim, ele, o famoso condenado) para a campanha de dois candidatos ao Senado pelo PSDB.

Onde está a ironia? No fato de que, no artigo, FHC queixa-se timidamente de que a catarata de denúncias “tornou impossível perceber que nem todos os casos de corrupção são semelhantes, que um determinado líder político não usou fundos de campanha para benefício pessoal, que outro [líder político] pode ter cometido crime mas seu partido não e assim por diante".

Soa como habeas corpus preventivo para seus amigos do PSDB entalados na Lava Jato e/ou outros escândalos, mas o próprio ex-presidente admite que não cola: “Aos olhos de um público revoltado, todos os políticos parecem um bando de trapaceiros culpados de ladroagem. Tanto a classe política como o governo perderam credibilidade e legitimidade".

A divulgação dos emails para Marcelo Odebrecht acaba colocando o próprio FHC, “aos olhos de um público revoltado", no conjunto de “todos os políticos".

Pode ser injusto misturar todo o mundo, mas o fato inegável é que foram os próprios políticos que construíram esse formidável descrédito reconhecido por 11 de cada 10 analistas e, agora, por um intelectual que tem dois lados, o de sociólogo e o de político.

Tentar culpar a Lava Jato pelo descrédito da classe política ou é má-fé ou ignorância. Equivale a culpar o espelho pela feia imagem que ele expõe.

Vejamos, pela palavra do próprio FHC a The Washington Post, como funcionam as coisas no Brasil:

"Investigações pelo Judiciário trouxeram à luz uma rede sistêmica de conluio corrupto entre governo, partidos políticos e companhias públicas e privadas. O privilégio e o compadrio substituíram a concorrência como motor tanto da vida econômica como da política".

O que queriam os políticos e os críticos da Lava Jato? Que ela mantivesse o “conluio corrupto"? A investigação apenas tirou os lençóis da cama em que fornicavam políticos e empresas, só isso.

Fernando Henrique acha que a situação de descrédito do mundo político está criando “condições revolucionárias na qual vingadores estão se preparando para cortar as cabeças dos poderosos e são aclamados pela população [ele usou a palavra ""populace” que talvez fique melhor como “populacho”].

Essa suposta revolução, sempre segundo FHC, tende a terminar com “a chegada de um líder providencial, um salvador carismático ou um homem forte que venha pôr fim à anarquia na terra".

Minha opinião: não há o mais leve sinal de revolução em marcha ou mesmo subterrânea, se por ela se entender a mobilização da sociedade para mudar um estado de coisas insuportável. A mobilização no Brasil é do tipo vaga-lume: acende aqui e ali (Diretas-Já, “fora, Collor", 2013, “fora, Dilma", “fora, Temer”) e logo se apaga.

Nem há um líder providencial ou salvador carismático à vista. Não me venham com Jair Bolsonaro, que não passa de um troglodita. Pode até ganhar mas não será por seu carisma, e, sim, pelo descrédito dos outros.

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