A baleia, o gênero e os jovens
Projeto do Escola Sem Partido não é apenas inepto e burro, mas também equivocado
Conteúdo restrito a assinantes e cadastrados
Você atingiu o limite de
5 reportagens
5 reportagens
por mês.
Tenha acesso ilimitado: Assine ou Já é assinante? Faça login
Qual frase é a certa: “a baleia macho perseguiu o filhote” ou “a baleia macha perseguiu o filhote”? A maioria dos gramáticos prefere a primeira construção. Mas “maioria” não significa “todos”.
Napoleão Mendes de Almeida, de longe o mais conservador de nossos filólogos, insiste na segunda formulação. Ele tem um argumento singelo. A regra geral das línguas flexivas estabelece que adjetivos concordam em gênero, número e caso com o substantivo que modificam. Como “baleia” é um substantivo feminino, diz Napoleão, o adjetivo que o determina, não importa qual seja, também vai para o feminino. O resultado são formas como “baleia macha”, “tatu fêmeo” e “mulher macha”.
O Escola Sem Partido (ESP), o consórcio entre a bancada da Bíblia e militantes direitistas, patrocina um projeto de lei que, entre dispositivos que vão do anódino ao maluco, proíbe o uso da palavra “gênero” em todas as disciplinas (pelo menos foi isso o que concluí da confusa redação do substitutivo ao PL 7.180/14).
Se esse estrupício for mesmo aprovado, Napoleão teria dificuldades para explicar seu sistema de concordância para substantivos epicenos. “Gênero”, afinal, designa não apenas a diferenciação cultural entre homens e mulheres, empregada na tão temida “ideologia de gênero”, mas também uma categoria gramatical (masculino, feminino ou neutro) e um grupo taxonômico (reino, filo, classe, ordem, família, gênero, espécie). Professores de idiomas e de biologia teriam de fazer malabarismos para ensinar sob a proibição do uso do termo.
O projeto do ESP, porém, não é apenas inepto e burro. Ele é também equivocado. Ao pretender que pais tenham uma espécie de poder de veto sobre o que é ensinado aos seus filhos, priva a educação de uma de suas principais funções, que é a de dar aos jovens elementos para que formem suas próprias convicções, que não precisam ser idênticas às de seus genitores. A tarefa da escola é expor o jovem ao mundo.