A saída é mais jornalismo

Não se combate o erro ou a distorção com censura, mas sim com mais notícias

Conteúdo restrito a assinantes e cadastrados Você atingiu o limite de
por mês.

Tenha acesso ilimitado: Assine ou Já é assinante? Faça login

Fake news é expressão nova para tema velho.

 Os “Protocolos dos Sábios de Sião” foram forjados no começo do século passado. Tratava-se da suposta ata de uma reunião de lideranças sionistas com planos para controlar o sistema financeiro e a imprensa ocidental; depois utilizada por Henry Ford e pelos nazistas para atacar os judeus.

Não foi a primeira vez. As falsificações eram frequentes na antiguidade. O cristianismo, por exemplo, defrontou-se com os relatos forjados de seguidores dos apóstolos, como o famoso pseudo-Dionísio.

Na Idade Média, foram inventadas deliciosas viagens a terras inexistentes e seus animais maravilhosos. Há 16 anos, falsificou-se um encontro entre Charles Dickens e Fiódor Dostoiévski com tamanha sofisticação que chegou a ser citado em duas biografias de Dickens.

Em “Tlön, Uqbar, Orbis Tertius”, Jorge L. Borges presta homenagem a essa antiga arte ao relatar o encontro de uma edição falsificada da “Enciclopédia Britânica” que descreve um país inexistente.

“O Nome da Rosa”, de Umberto Eco, começa com a inventada descoberta de um manuscrito medieval que conta a investigação de crimes em um mosteiro e su a biblioteca. O culpado é um monge, Jorge, cego como Borges.

Por aqui, na República Velha, a imprensa difundiu falsificações, como as cartas atribuídas a Arthur Bernardes com ofensas aos militares. Não houve desmentido que bastasse. Os anos 1950 assistiram à proliferação da imprensa que distorcia fatos para vender jornais ou difamar a divergência, perversamente retratada em “O Beijo no Asfalto”, de Nelson Rodrigues.

A notícia, porém, como alerta Eugênio Bucci, jamais é falsa. Ela pode estar errada ou colorir alguns aspectos, esquecendo outros. Não se combate o erro ou a distorção com censura, mas sim com mais notícias, com o contraponto e o debate.

A jurisprudência americana estabeleceu que notícias não podem ser censuradas, a menos que causem grave e comprovado risco, como a publicação do dia e local da invasão da Normandia pelas tropas aliadas. Jornalistas podem ser punidos apenas caso reportem com demonstrada falta de cuidado. Falsificações não são notícias e podem resultar em ações criminais.

No governo Lula, acusaram-me de ser um agente a soldo do Banco Mundial. Alguns críticos, por má-fé ou incompetência, utilizavam estatísticas de década anterior. Existem relatórios que inventam que apoio sicrano ou beltrano.

Defender a liberdade de expressão implica conviver com afirmações estapafúrdias, mesmo quando o desatino sugere desonestidade. Melhor rir das bobagens que capturam os desavisados. O remédio é ler mais, não menos. A alternativa da censura tem efeitos colaterais desastrosos.

Perfil falso no Facebook usa imagem de Marcos Lisboa, colunista da Folha - Reprodução
 

Relacionadas