Saiba mais sobre a legislação sobre drogas em vigor no Brasil

Descriminalização da maconha é tema de processo parado no STJ desde 2015

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São Paulo

A chamada nova Lei de Drogas, de 2006, manteve o uso de substâncias ilícitas como crime, mas retirou a pena de prisão do rol de sanções. O texto, porém, não fixou qual quantidade indica uso ou tráfico, o que é definido caso a caso por delegados e juízes.

A descriminalização do porte começou a ser discutida no STF (Supremo Tribunal Federal) em 2015. O processo estava com o ministro Alexandre de Moraes, que herdou o pedido de vista de Teori Zavascki, morto em 2017. Moraes o liberou sexta (23) para julgamento, que ainda não tem data marcada. 

Em São Paulo, o número de flagrantes realizados pela polícia a usuários de drogas tem caído de forma contínua no estado, enquanto houve aumento das autuações por tráfico. Especialistas têm explicações distintas para o fato —desde política de segurança até possível desestímulo por parte dos policiais diante da pouca efetividade das prisões por porte. 

Como é a legislação sobre drogas hoje? A lei prevê punições para quem “adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo” substâncias ilícitas. Há uma diferença na punição por porte de droga (que seria para uso pessoal) e por tráfico, mas a legislação não fixa critérios para definir o que é consumo próprio e o que é tráfico. Tudo o que é dito é que "para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente". O porte também inclui quem "para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica", mas, novamente, não é dito o que seria considerado "pequena quantidade". 

Quem decide o que pode ser considerado porte ou tráfico de drogas? Quando uma pessoa é detida com drogas, o enquadramento como tráfico ou consumo costuma ser feito pelo delegado. A decisão final é da Justiça.

O que acontece com quem for autuado por porte? E por tráfico? Nos dois casos a pessoa responde a um processo penal, mas a punição para porte é muito menos severa e não inclui cadeia em caso de condenação.

Se for tráfico... 

  • Condenado está sujeito a pena de 5 a 15 anos de reclusão, a serem cumpridos inicialmente em regime fechado, além de multa. Autuados por tráfico não têm direito a fiança nem indulto e a progressão de pena também tem critérios mais rígidos

Se for porte...

  • Advertência sobre os efeitos das drogas
  • Prestação de serviços à comunidade
  • Comparecimento a programa educativo
  • Em caso de descumprimento das medidas estipuladas pela Justiça, pode ser aplicada multa

DESCRIMINALIZAÇÃO

Por que a lei sobre drogas está sendo contestada no STF? A Defensoria Pública, que entrou com recurso extraordinário contra a condenação de um réu em Diadema (Grande São Paulo) pego com três gramas de maconha, sustenta que a pena criminal fere os princípios da intimidade e da vida privada, previstos na Constituição.

O que está sendo julgadoOs ministros do STF irão decidir se é constitucional o artigo 28 da lei 11.343/06, que criminaliza o porte pessoal de entorpecentes.

Argumentos a favor 

  • Legislação atual fere o princípio da privacidade, já que o consumo de drogas não causa danos a terceiros
  • Lei também viola o princípio da isonomia, ao tratar coisas semelhantes (como álcool e maconha) de forma desigual
  • A regulamentação das drogas facilitaria o controle sobre o uso, sendo mais eficaz do que a proibição
  • Mudança pode reduzir a população carcerária, já que a falta de parâmetros hoje faz com que muitos usuários sejam presos como traficantes

Argumentos contra

  • A droga não prejudica só quem a consome, mas também as pessoas ao redor 
  • A liberação pode causar aumento do número de usuários e do índice de pessoas com transtornos mentais 
  • O sistema público de saúde já não tem estrutura para atender viciados em drogas lícitas, como álcool
  • Definir quem é traficante e quem é usuário de acordo com a quantidade de droga seria falho, já que um criminoso também pode transportar quantidades pequenas 

Em que pé está o processoA questão estava parada desde setembro de 2015, quando o ministro Teori Zavascki pediu vista do processo. Após a morte de Teori, seu substituto, Alexandre de Moraes, "herdou" o pedido de vista. Na sexta (23/11), Moraes liberou o processo para julgamento.

Quando será o julgamento? Ainda não foi definida uma data. Cabe ao presidente do STF, Dias Toffoli, incluir a questão na pauta de julgamentos. A pauta de todas as sessões deste ano, até dezembro, já foi divulgada e não inclui o caso, mas pode ser alterada. Toffoli, contudo, já disse que não pretende julgar matérias polêmicas neste ano.

Antes do processo der paralisado, quem já havia votado? Três juízes já votaram: Luís Roberto Barroso e Luiz Edson Fachin disseram ser a favor da descriminalização apenas da maconha. Relator do caso, Gilmar Mendes defendeu posição mais abrangente, pela inconstitucionalidade da lei com relação a todas as drogas, não apenas a maconha. Barroso sugeriu que o porte de até 25 gramas de maconha seja parâmetro para configurar o uso pessoal. Fachin, por sua vez, propôs que o Congresso estipule as quantidades máximas permitidas. 

Descriminalização e legalização são a mesma coisa? Não. Descriminalização significa que o ato deixa de ser punido no âmbito penal. Em alguns casos, contudo, a prática pode ser alvo de punições civis ou administrativas, como pagamento de multa, por exemplo. A legalização, por sua vez, significa que o ato passa a ser permitido e pode ser regulamentado por lei, que estipula regras e condições para a prática. Um exemplo: se o STF descriminalizasse o uso da maconha, a pessoa que fosse pega com a droga não será mais presa, mas o comércio continuaria sendo ilegal e ela poderia ser obrigada a fazer um curso oferecido pelo Estado. Se o Congresso legalizasse a maconha, o comércio e a produção poderiam ser regulamentados pelo poder público. É o que acontece com o tabaco e o álcool: os dois são legalizados, mas a legislação proíbe a venda para menores e fixa impostos para a comercialização.

E o que diz a Constituição? O artigo 5ª diz que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas”.

Quais serão os efeitos da decisão do STF? Apesar de não mudar a lei, o entendimento do Supremo tenderá a ser seguido por outros tribunais em casos semelhantes ainda em julgamento. Espera-se que os ministros também discutam parâmetros específicos para diferenciar usuários de traficantes.

Um novo entendimento da lei poderia ser aplicado a casos antigos? Sim, é possível que condenados peçam a revisão da pena caso se enquadrem nas novas regras. As mudanças no ordenamento jurídico só podem alterar condenações judiciais se elas forem em benefício do réu

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