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I. BREVE HISTÓRICO

A representação nº 2, de 1999, apresentada no dia 8/12/99 por diversos Partidos Políticos, aponta irregularidades envolvendo o Senador Luiz Estevão, identificadas nos trabalhos desenvolvidos pela Comissão Parlamentar de Inquérito, criada por meio do Requerimento n.º 118/99, para apurar irregularidades em órgãos do Poder Judiciário.

Recebida a representação pelo Conselho de Ética e de Decoro Parlamentar, presidido pelo Senador Ramez Tebet, e designado como seu relator o Senador Jefferson Peres, procedeu-se à citação do Senador Luiz Estevão, em 1º/3/2000, oferecendo-lhe cópia da representação e abrindo-lhe prazo para apresentação de sua defesa, nos termos do art. 15, II da Resolução n.º 20, de 1993.

O Senador Luiz Estevão apresentou sua defesa, em 15/3/2000, às fls. 324 à 512, requerendo, preliminarmente, a extinção do processo, sem apreciação do mérito, sob o argumento de: 1) que há preexistência de processo político em curso; 2) vício na expressão de vontade dos partidos políticos que subscreveram a representação; e, 3) renúncia dos partidos do direito de representação, quando do encaminhamento das conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito, instaurada pelo Requerimento n.º 118/99, ao Ministério Público. No mérito, requereu a defesa a improcedência da representação, sob o argumento de que os fatos relatados eram anteriores ou não pertinentes ao exercício do seu mandato, além de não configurarem comportamento incompatível com o decoro parlamentar.Acompanhando a defesa, o Senador apresentou os documentos de fls. 513 a 1774, dentre eles, contratos particulares para o fim de justificar transações financeiras entre as empresas do Senador e o Grupo Monteiro de Barros, além de laudos periciais com objetivo de atestar a autenticidade dos referidos contratos. Ofereceu, ainda, rol de testemunhas, cuja oitiva alegou necessária aos esclarecimentos dos fatos.

Após a apresentação da defesa, o Conselho de Ética, com o conhecimento e a intervenção do Senador Representado, procedeu as diligências e a instrução probatória que entendeu necessárias, dentre as quais: a realização de nova perícia sobre os contratos particulares apresentados pela defesa e a oitiva de testemunhas.

Em 29 de maio, o Ministério Público Federal, por intermédio de seu Procurador-Geral encaminhou a esta Casa Legislativa novos documentos acerca do envolvimento do Senador com a obra do TRT de São Paulo.

No dia 31 de maio, procedeu-se à leitura do relatório do Senador Jefferson Peres e concedeu-se prazo de 10 (dez) dias úteis para alegações finais em face do relatório produzido, bem como sobre os documentos encaminhados pelo Procurador-Geral da República, marcando-se reunião para votação do relatório.

Apresentadas as razões finais, o Senador Jefferson Peres reiterou os termos de seu parecer, deixando consignado o seguinte, conforme notas taquigráficas da sessão do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar:

As preliminares levantadas pela defesa como falhas gritantes no meu relatório, teria trazido fatos novos desconhecidos pela defesa, com testemunhos secretos de onze fantasmas, são improcedentes, são distorções do relatório. As testemunhas, os onze fantasmas, pelo menos quatro se materializaram aqui em depoimentos. Quando um dos itens da representação era exatamente que os funcionários que trabalharam na CPI teriam sido pressionados e até ameaçados pelo Senador Luiz Estevão. Chegou ao meu conhecimento que esses funcionários, alguns pelo menos, estariam apavorados, dispostos a não depor. E tive um encontro informal com cada um deles, todos os onze, inclusive os três arrolados pela defesa e mais um, o quarto, depôs aqui também. Portanto, no máximo, seriam sete fantasmas, não onze. O que me disseram esses funcionários, por mim ouvidos informalmente? Quatro se dispuseram a depor. Os três arrolados pela defesa e um, Senhor Marcion, que disse que não se importaria de depor, se fosse chamado, viria. Dos outros sete, quatro me disseram que não gostariam de depor, que preferiam não ser chamados. E três me pediram encarecidamente que não os chamassem (...) E mencionei em meu relatório. Não tomei e não usei o depoimento deles dizendo que acusaram e confirmaram que o Senador os teria ameaçado. Não está dito isso em meu relatório. Não há depoimentos que a defesa não pôde contestar. Apenas mencionei que não chamei esses funcionários para não constrangê-los. Até porque com o depoimento dos três arrolados pela Defesa e mais do Sr. Marcion ficou constatado, pelo menos no meu entendimento, que o Senador pressionou sim os funcionários. Pelo menos encararam os atos do Senador como pressão. (...) Quatro depuseram; quatro fantasmas se materializaram aqui. E não usei depoimentos secretos no meu relatório.

Eu não embasei as minhas acusações ao Senador Luiz Estevão nos processos que estão correndo no Supremo contra ele, eu mencionei esses processos. Eu mencionei para mostrar - está dito no meu relatório - que o envolvimento do Senador em inquéritos policiais e processos criminais tinham ocasionado grave dano a sua reputação. A defesa falar sobre isso é um fato. O cidadão que se vê envolvido - se é ou não inocente é outra história - em sucessivos ou vários processos, inquéritos policiais e processos criminais tem a sua reputação gravemente afetada. Foi o que eu disse. Era irrelevante a defesa tentar mostrar que o Senador era inocente nos processos que ainda não transitaram em julgado. Era irrelevante isso. Portanto, eu não embasei o meu parecer, mas apenas mencionei. Eu poderia nem ter especificado os processos. Eu poderia ter simplesmente dito: o Senador Luiz Estevão já se viu envolvido em vários processos criminais. Pronto! Qual é a importância? Isso enseja a anulação por cerceamento de defesa? (Pausa).

Laudo pericial. A defesa diz que eu não levei em conta o fato do perito contratado pelo Senado não haver respondido aos quesitos da defesa, como não fiz menção aos quesitos que ele respondeu ao Senador Romeu Tuma. E por que não fiz isso?

Porque o perito, ao responder a duas perguntas que lhe fiz por escrito, disse que um laudo pericial para se determinar a data de um documento só tem valor absoluto quando conclui pela falsidade do documento. Se a perícia constatar cientificamente que o documento é falso, ela pode afirmar com absoluta certeza. Aí o laudo tem valor absoluto. “Mas”, diz o perito, respondendo a minha pergunta, “se o laudo constatar pela autenticidade, isso não tem valor absoluto, porque, se a falsificação for bem feita, a perícia não tem como constatar isso.” Não tem valor absoluto um laudo desses. Que importância teria a resposta que o perito daria aos quesitos formulados pela defesa, em primeiro lugar? Nesse caso, para a minha conclusão, nenhuma.

Segundo, competia a mim mandar o perito responder ou à defesa? O Senador é representado nos autos, pelos seus advogados. O Sen. Ramez Tebet abriu prazo para a defesa e, ainda que não abrisse, ele tem livre acesso aos autos do processo. Por que não se importou com a falta de resposta do perito? Por considerar irrelevante, ou por que cochilou? Recorro a um adágio jurídico: a lei não protege os que cochilam. Sua Excelência imputa a mim essa falha?

Nas alegações finais, diz que mencionei que o Senador Luiz Estevão procurou o Ministro Ademar Ghisi e não mencionei que não procurou outros Ministros. Ora, diante da declaração, por escrito assinada pelo Ministro Ademar Ghisi, em que afirma que realmente tinha sido procurado pelo Sen. Luiz Estevão para pedir informações a respeito de uma auditoria que o TCU estava realizando ou teria realizado no TRT de S. Paulo, aquilo me bastou para constatar que o Sem. Luiz Estevão havia se interessado, junto ao Tribunal de Contas da União, a respeito de uma obra com a qual Sua Excelência afirma que nunca teve relação. A declaração do Min. Ademar Ghisi prova isso. É bastante! Por que Sua Excelência não procurou outros Ministros não sei.


Enfim, Excelências, apenas para finalizar, a defesa citou que usei parte do parecer do Senador Josaphat Marinho, quando Sua Excelência deu pela admissibilidade no processo contra o Senador Ernandes Amorim. Ora, se o Senador Josaphat Marinho diz, no seu parecer, expressamente que todos os fatos atribuídos ao Senador Ernandes Amorim eram anteriores ao mandato e diz expressamente que esses fatos, quando e, se recentes, podem se refletir no mandato do Senador e suscitar um processo de cassação, em que deturpei o parecer do Senador Josaphat Marinho? Portanto, se cometi alguma aberração jurídica, estou em boa companhia, com o Mestre Josaphat Marinho.

Finalmente, Excelências, para concluir, não me alongarei mais porque não tenho mais o que fazer, se, dependesse de obediência estrita a procedimentos processuais, se transformássemos este Conselho de Ética e este Senado Federal numa Corte Judiciária stricto sensu, que não é, nem pode ser, é um tribunal ‘lato sensu’, porque é um tribunal político. Se nós e a Câmara dos Deputados fizéssemos isso, o senhor Hildebrando Paschoal não estaria hoje numa penitenciária no Acre, seria ainda membro de um dos Poderes da República, recebendo pelos cofres públicos e legislando para o povo brasileiro. É claro que temos que obedecer ao devido processo legal, senão o tribunal é arbitrário, mas não está sujeito aos procedimentos rigorosos do Código de Processo, que é usado apenas subsidiariamente (...)

O juiz, ao condenar alguém à prisão, destrói uma vida, segrega o ser humano da família, das atividades profissionais e o ferreteia com o labéu de criminoso. Há de haver rigor, sim. Nós, não; estamos, com a competência que nos deu a Constituição, examinando, diante de fatos, de indícios fortes de nossa própria convicção, se o Senador permanece ou não nesta Casa, privado de algo que é temporário: o mandato, sem nenhuma conseqüência maior porque volta a ser um cidadão no exercício de suas atividades profissionais, no seio da sua família. Por isso que aqui não é tão rigoroso quanto no Judiciário.

O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, apreciando a representação e a defesa, decidiu, pelo voto favorável de 11 de seus membros, sendo 3 votos contrários e 1 voto pela abstenção, pela aprovação do Parecer do Senador Jefferson Peres e pela declaração, por esta Casa Legislativa, da perda de mandato do Senador Luiz Estevão, por quebra de decoro parlamentar, nos termos do artigo 55, II da Constituição Federal, combinado com o art. 5º, I da Resolução nº 20, de 1993, do Senado Federal.

Feito este histórico acerca dos fatos constantes do processo, cumpre passar ao exame de sua constitucionalidade, legalidade e juridicidade.



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