educação
10 /03/2008

Modelo de negócio

Sistema implantado em Pernambuco aplica princípios empresariais na educação. Funciona


Um lugar sob o comando de "gestores", onde os funcionários são orientados por metas, têm o desempenho avaliado dia a dia e recebem prêmios em dinheiro pela eficiência na execução de suas tarefas, pode parecer tudo – menos uma escola pública brasileira. Pois essas são algumas das práticas implantadas com sucesso em um grupo de colégios estaduais de ensino médio de Pernambuco. A experiência não chama atenção exatamente por seu tamanho – ao todo, são 33 escolas do gênero, com 15 000 alunos –, mas, sim, pelo impressionante progresso dos estudantes depois que ingressaram ali. Como é praxe no local, o avanço foi quantificado. Os alunos são testados na entrada, e quase metade deles tirou zero em matemática e notas de 1 a 2 em português. Isso numa escala de zero a 10. Depois de três anos, eles cravaram 6 em tais matérias, em uma prova aplicada pelo Ministério da Educação (MEC). Em poucas escolas públicas brasileiras a média foi tão alta – o que despertou o interesse de especialistas. De saída, há uma característica que as distingue das demais: elas são administradas por uma parceria entre o governo e uma associação formada por empresários da região. Daí as semelhanças com o mundo corporativo. Resume Thereza Barreto, diretora de uma das escolas: "Como qualquer administrador à frente de uma organização, preciso entregar resultados. Neste caso, alunos bem formados".

O programa, implantado há quatro anos por iniciativa dos empresários e que agora colhe os resultados, não é o primeiro no país a aplicar esse tipo de cartilha nas escolas – mas, certamente, é o que fez isso de maneira mais radical. Os professores, por exemplo, são avaliados em quatro frentes: recebem notas dos alunos, dos pais e do diretor e ainda outra pelo cumprimento das metas acadêmicas. Aos melhores, é concedido bônus no salário. Diretores à frente de uma escola cujos alunos não avançam nas médias, por sua vez, são removidos do cargo. Já estudantes como Jéssica Simões de Andrade, 17 anos, assinam um contrato na hora da matrícula, por meio do qual se tornam responsáveis pela preservação de laboratórios e salas de aula. Filha de uma empregada doméstica e de um mecânico que não passaram do ensino fundamental, Jéssica acaba de passar no vestibular de quatro universidades. Optou pelo curso de química industrial da Federal de Pernambuco: "Cheguei a achar que não dava para os estudos". Ela e outros 77% dos jovens desses Centros de Ensino Experimental (CEE), como as escolas são conhecidas, vêm de famílias cuja renda não passa de dois salários mínimos por mês. Até então, eram apenas maus alunos, com pouco ou nenhum interesse pela sala de aula.

O que os fez, afinal, entusiasmar-se tanto pelos estudos? Um grupo de professores de bom nível, não há dúvida, foi um fator determinante. Em meio a milhares de concursados no estado, esses foram escolhidos a dedo, tal como os diretores. Todos passaram por uma prova de conhecimentos específicos, são formados nas áreas em que lecionam e 83% têm uma especialização ou mesmo um mestrado – raridade no cenário das escolas públicas do país. Por contrato, eles ainda prometem dedicação exclusiva à escola, o que lhes garante tempo para atender pais e alunos e preparar as aulas. Essa é também uma prática básica, mas incomum no Brasil. Cada aula segue um roteiro bem amarrado. O professor Djair da Silva, há quinze anos na rede pública e há quatro no CEE, traduz o clima de seus colegas de lá: "Voltar para a escola pública tradicional, nem pensar". Djair e os outros professores não só têm credenciais mínimas para ensinar suas respectivas matérias como ainda são capazes de surpreender os estudantes com assuntos normalmente repudiados, entre eles ciências e matemática. Além de medidores objetivos da eficácia dessas aulas, outra evidência de seu sucesso vem do depoimento de estudantes como Bruno Leonardo, 16 anos: "Adoro estar na escola".

A exemplo do que ocorre em países onde a educação funciona, Bruno e os colegas passam nove horas na escola – e não quatro, como nos demais colégios brasileiros. Isso, evidentemente, ajuda. À exceção de bons laboratórios de ciências e de computadores, não há nada de especial nas instalações. O que diferencia esses prédios de tantos outros da rede pública é, basicamente, sua extrema limpeza e conservação. Não se trata de um programa caro: o gasto por aluno, rateado entre o governo e os empresários, sai por algo como 2 500 reais ao ano – bem menos do que custa um aluno de escola pública em países como Chile e Coréia do Sul. Ainda assim, no caso de Pernambuco, isso representa 60% mais dinheiro do que consome um estudante de qualquer outro colégio estadual. Para multiplicar essas escolas às centenas, portanto, cabe a cada estado fazer as contas e ir atrás de verbas privadas. Alguns deles, como Maranhão e Ceará, estão justamente nesse ponto. De todo modo, o caso dos CEEs pernambucanos ajuda a reforçar a idéia de que, na educação, grandes avanços podem resultar de um conjunto de medidas simples – algumas delas até pouco dispendiosas. Eis o efeito na vida de Lucielle Laurentino, 18 anos, criada na roça pelos avós, hoje na faculdade de geografia: "Quando pensava no futuro, eu me via plantando café. Hoje sonho com um Ph.D.".

Camila Pereira
Revista Veja

   
 
   
 

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