4. Aonde leva uma estratégia eleitoreira
Existe uma imagem largamente utilizada que afirma que os trabalhadores
brasileiros são passivos e atrasados. Em um momento como o atual, em que não
existem grandes lutas, esta ideologia é amplamente difundida. Ao nosso ver,
isto nada tem a ver com a realidade. Os trabalhadores e o povo brasileiro
empregaram enormes energias e muitas doses de heroísmo na luta contra a
opressão e a exploração, principalmente nestes últimos 20 anos.
Primeiro foram os anos de luta contra o regime militar. Em 1977, milhares de
estudantes de todo o país saíram às ruas para pedir a liberdade para os
presos políticos e a anistia, abrindo a luta pelo fim da ditadura militar.
Como fruto dessas lutas foram reconstruídas a União Nacional de Estudantes
(UNE) e mais tarde a União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes).
Em 1978, a greve da Scania detonou a paralisação dos metalúrgicos do ABC e
os trabalhadores entraram em cena. Durante os dois anos seguintes, mais de
três milhões de grevistas lutaram por melhores salários e impuseram na
prática o direito de greve, antes proibido pelos militares.
Como resultado dessas grandes greves, nasceram o Partido dos Trabalha-dores
(PT), o primeiro partido operário do país a apresentar-se de maneira
independente em eleições desde o Partido Comunista em 1946; e a Central
Única dos Trabalhadores (CUT), a primeira Central sindical realmente
nacional.
Em 1984, milhões de pessoas foram às ruas exigindo eleições diretas para
presidente e, apesar da derrota no Congresso Nacional, derrubaram na prática
o regime militar. Cinco anos depois, o país realizava eleições diretas.
Entre 1985 e 1991, milhões de trabalhadores se defenderam do arrocho
salarial imposto pelo mecanismo da inflação com dezenas de milhares de
greves.
Em 1992, de novo, o povo, com os estudantes à frente, foi às ruas e derrubou
um presidente corrupto, impondo ao Congresso Nacional o impeachment de
Fernando Collor de Mello.
Desde 1983, quando se criou o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra,
vem crescendo a organização dos camponeses sem-terra. O MST ganhou uma
dimensão nacional nos últimos três ou quatro anos, com repercussão em todo o
país. O MST já forçou a desapropriação de uma área que corresponderia ao
território de um país como Portugal. Só em 1997, houve 463 ocupações em que
participaram 58.266 famílias.
Depois de uma onda de luta no início da década de 80, fundamental,
inclusive, para a criação do PT, os movimentos de mulheres, negros e
homossexuais protagonizaram importantes movimentos nos últimos anos.
Particularmente a partir de 1988 - quando se comemorava os cem anos da
"abolição" - negros e negras têm sistematicamente denunciado o racismo e a
farsa da "democracia racial" através de importantes manifestações. Em 1995,
a Marcha a Brasília levou cerca de 30 mil pessoas à capital. Em 2000, em
aliança com os movimentos indígena, estudantil e sindical, o movimento negro
desmascarou o governo realizando a belíssima manifestação dos "Outros 500",
em Porto Seguro, a qual foi fortemente reprimida pela polícia de FHC e ACM.
No decorrer de toda a década, o movimento feminista não parou de lutar e,
diante da crescente violência contra gays e lésbicas, as "Paradas do Orgulho
Gay e Lésbico" só cresceram em tamanho e importância.
Tanta luta, tantos sacrifícios, em que muitos deram inclusive suas vidas não
correspon-deram às esperanças dos explorados e oprimidos deste país. A
situação dos trabalhadores e do povo está cada vez pior e não se conquistou
um governo que realmente representasse seus interesses.
A grande pergunta é: por quê? Há um elemento crucial para a classe
trabalhadora brasileira: a política daqueles que encabeçaram suas lutas nos
últimos 20 anos: a direção do PT e da CUT.
Quando surgiram, o PT e a CUT representaram a esperança de uma alternativa
popular, de classe e socialista para milhões de trabalhadores. Infelizmente
esta direção veio, no decorrer desses anos, conduzindo toda esta luta a um
beco sem saída: o da disputa eleitoral, da pressão no Congresso Nacional e
dos acordos com a burguesia como solução para os problemas do país.
Na verdade, a direção do PT vem elaborando na década de 90 uma estrutura
ideológica justificativa, pois não se pode chamar suas elaborações de uma
teoria porque não diferem, em essência, da aceitação do sistema capitalista
e do regime democrático burguês.
Essa ideologia no plano internacional é a defesa da inserção "soberana" e
não subordinada dentro do capitalismo "globalizado". O problema é que no
sistema capitalista mundial existem países desenvolvidos, imperialistas, e
países explorados que são, cada vez mais, verdadeiras colônias dos
primeiros. Os países que, neste século, se tornaram independentes dentro
desse sistema mundial, foram aqueles em que revoluções sociais expropriaram
a burguesia e impuseram outro sistema econômico. A suposta "inserção
soberana" significa na verdade a aceitação da inevitabilidade da dominação
imperialista sob sua forma neoliberal e a procura de pequenas reformas nesse
marco.
No terreno da luta de classes, a direção do PT vem priorizando, como vimos,
a ação institucional no Parlamento e não as lutas diretas dos trabalhadores
da cidade e do campo.
Eles desviaram o grande ascenso grevista de 1989 para as eleições, que
terminaram sendo ganhas por Collor. Quando as massas derrubaram Collor em
1992, a direção do PT, junto com a maioria da burguesia, defendeu a posse
"constitucional" de Itamar Franco, passando por cima da vontade popular, que
queria eleições gerais.
Itamar implementou o Plano Real, tendo FHC como ministro da Economia, e
possibilitou mais uma derrota eleitoral de Lula em 199
4. Em 1999, depois da
manifestação dos 100 mil em Brasília, quando se abria uma possibilidade de
ir a uma greve geral para derrubar FHC, a direção do PT travou as lutas e se
posicionou claramente em seu congresso contra a palavra de ordem "Fora FHC e
o FMI". Mais uma vez se impôs a estratégia eleitoreira da direção do PT,
agora de buscar o "feliz 2002", através de uma vitória eleitoral de Lula.
Caso, mais uma vez sejam derrotados, virá o "feliz 2006".
Toda essa política da direção do PT e da CUT canalizou as lutas populares
para o terreno eleitoral, controlado pela burguesia, e a seguidas derrotas
nas eleições presidenciais (89, 94, 98), levando ainda a que os
trabalhadores e o povo não vejam uma saída para sua situação, a não ser as
eleições. Sem alternativa, muitos acham que é assim mesmo, que a única saída
é eleitoral, e mais uma vez agora se engajam na campanha de Lula 2002.
Outros se desmoralizam e vão para casa, céticos em relação a tudo.
Os que acreditam na estratégia eleitoral com a campanha de Lula, achando que
assim vão mudar o país, vão se chocar com o próprio governo do PT em caso de
vitória (Lula vai aplicar um programa de continuidade da situação atual) ou
com mais uma derrota eleitoral.
Outros ativistas rejeitam este curso da direção do PT, mantendo-se ou não
como petistas. É a eles que dedicamos este programa e a nossa campanha.
Queremos apresentar aqui uma proposta claramente distinta da apresentada
pela direção do PT nestas eleições. Defendemos com orgulho um programa de
esquerda, socialista.