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o pornógrafo

Em fotos pra lá de explícitas, mostra de Terry Richardson é puro bas-fond
O fotógrafo Terry Richardson chacoalha Nova York com "Terryworld", uma exposição na prestigiosa Deitch Gallery que desafia os limites da arte e da pornografia. Fiel a seu estilo de vida, ele se revela em situações explícitas, corajosas, mas sempre bem-humoradas. Depois de surgir nos anos 90, na esteira da fotografia naturalista da época, ele vive retorno triunfal e renova sua estética de moda com a atual campanha da Miu Miu.

Moda - Por que você optou por uma exposição sem incorporar o que fez anteriormente de moda?
Terry - Richardson Queria fazer uma coisa só, não queria misturar. E estava sentindo uma certa urgência em fazer esse tipo de trabalho agora, fazer tudo de uma vez, para não ter que fazer algo assim de novo.

Moda - "Terryworld" mostra você nu em praticamente todas as fotos, em momentos de puro erotismo com várias mulheres, com travestis e até com seu estagiário japonês...
Terry - Eu queria fazer o máximo, eu queria ir o mais longe possível. Mas acho que também é uma exposição alegre, vejo muita gente sair da galeria sorrindo.

Moda - Você estava curioso para ver as reações das pessoas? É uma coisa meio voyeur?
Terry - Fico sempre curioso em saber o que as pessoas pensam e como elas reagem, especialmente depois de ver essa exposição, a mais pessoal que já fiz. O que me deixa satisfeito mesmo é ter feito exatamente o que eu queria. Poucas pessoas têm esse luxo.

Moda - O que o motivou a fazer uma mostra como essa?
Terry - O demônio, o diabo (risos). Quando começamos a fazer o que mostram as fotos, achei que era isso o que eu tinha que fazer. Simples assim. O sexo, o exibicionismo, tudo isso era urgente para mim. Não sei se é crise de meia-idade, mas sei que quero fazer muito sexo, quero ficar nu e quero que todo mundo veja. É definitivamente sobre mim. Eu, eu, eu. Tem muito da minha relação com minha mãe, tem um certo caráter psicológico que eu estava tentando consertar ou até mesmo tentando encarar pela primeira vez, minhas relações com as mulheres, com meu corpo. Eu não me sentia bem nu. Tudo isso está nas fotos e todo mundo vê. Não acho o tratamento mais normal do mundo, mas para mim tem funcionado. Tenho me livrado de muita coisa.

Moda - Daqui a dez anos vai gostar do que fez hoje?
Terry - Acho que sim, não tenho arrependimentos. Muita coisa já aconteceu na minha vida. É aquela coisa: "Se eu soubesse antes do que sei agora..." Se eu me desse bem com garotas quando eu tinha 14 anos talvez eu não pensasse tanto em sexo quanto eu penso hoje, aos 40. Mas não faz sentido pensar na vida assim. Todo mundo tem que passar por suas fases: se eu estou passando pela minha adolescência agora, paciência.

Moda - No seu livro "Kibosh", você aparece fazendo sexo oral com uma garota e seus olhos enormes são como de um menino...
Terry - Eu sou doce e fofo (risos). Por isso consigo que meu trabalho chegue ao mainstream. Sei que sou uma pessoa decente e honesta, meus amigos sabem que sou engraçado, que adoro dar risada e que todo mundo envolvido no trabalho está se divertindo.

Moda - Alguma vez você se sentiu desconfortável, ou talvez sem jeito, no meio de um monte de gente vendo você transar com uma amiga na foto, por exemplo?
Terry - Não. Todos os ensaios foram experimentos supernaturais. Nunca falei o que tinha de ser feito. Ficávamos nus e eu começava a fotografar o que ia acontecendo. Nunca sabia o que ia rolar. Às vezes dava em sexo, às vezes a gente acabava vendo TV. Os ensaios aconteceram durante o dia, nunca tinha drogas no meio, nem álcool. Tipo três da tarde, no máximo cinco ou seis pessoas, era exibicionismo mesmo. Não queria fazer nada sujo, com garotas bêbadas ou drogadas de madrugada. Filmamos tudo.

Moda - Quem são seus ídolos na fotografia?
Terry - Larry Clark, Nan Goldin e Helmut Newton, claro.

Moda - Qual é a diferença entre uma campanha para a marca de jeanswear Sisley, em que você parece ter carta branca, e fazer uma campanha para a Miu Miu?
Terry - Até o livro da Sisley teve fotos cortadas. Então, nem com a Sisley tudo que eu fotografo vê a luz do dia. Na moda, as pessoas estão pagando para ter uma imagem que possam usar. Não adianta dar uma de artista e se rebelar, você sabe no que está se metendo quando assina o contrato. Na Miu Miu, por exemplo, eles esperam uma certa sofisticação. Eu tive liberdade para fazer o que eu queria, mas não sou burro de fazer algo que não vá ser usado.

Moda - Você planeja as fotos, faz lay-outs?
Terry - Não planejo nada. Às vezes, até fico meio estressado, mas não consigo fazer de outro jeito. Tem que ser uma coisa espontânea, do momento. Mesmo para a Miu Miu eu não tinha planejado nada. Sabia que seria em estúdio e que atriz Maggie Gyllenhal era a estrela. Tínhamos uns fundos com estampas e cores diferentes que a equipe da Prada trouxe e só. Fomos tentando de tudo. Não ia fazer ela segurar nada fálico só porque sou o Terry Richardson. Ficou bonito e sexy.

Moda - Qual a importância do casting para você?
Terry - Se o casting é bom, o resto não importa. Não confio em hair e make, em retoques e iluminação de alta tecnologia. O que importa mesmo são os modelos. Estou sempre querendo conhecer gente bacana. Não preciso ver o book, não importa se fulana fotografou com Steven Meisel... Sei se vai funcionar na hora que a modelo entra e me diz duas palavras.

Moda - Qual seu próximo projeto?
Terry - Eu vou fotografar gatinhos e cachorrinhos.
marcelo gomes, de nova york
nesta pág. terry richardson no seu estúdio em ny
fotos marcelo gomes / terry richardson
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