24/06/2005
Investir mais e distribuir melhor os recursos entre regiões e escolas
LUCIANA FARNESI
Da equipe de trainees
Maíra Soares/Equipe de trainees |
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Aluno em sala de aula na Escola Estadual Henrique Dumont Vilares, em São Paulo |
Quem estuda mais ganha mais. Por isso, injetar recursos no ensino é tratado habitualmente como "investimento" e não "despesa". Essa é uma verdade para o mundo inteiro, mas em especial para o Brasil. Aqui, quem estuda mais ganha muitas vezes mais. Assim, nossa distribuição de renda (a segunda pior do mundo, segundo a ONU) reflete a desigualdade educacional do país.
O financiamento do ensino público brasileiro foi apontado como problema por 12 dos 23 entrevistados. Eles sentenciam: o Brasil investe pouco em educação. E distribui mal o dinheiro.
O resultado, as carteiras de trabalho demonstram: o salário médio do brasileiro que tem o superior completo é cinco vezes maior que o daqueles que têm apenas o ensino fundamental completo. É a mais alta diferença entre 22 países selecionados pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) para o estudo "Investindo na Educação", divulgado em 2000.
O Brasil gasta o equivalente a 4,3% do PIB com a educação pública, informa o Inep. Para garantir qualidade à escola pública, seria preciso investir 8% do PIB, conclui o relatório final do Grupo de Trabalho sobre Financiamento da Educação, realizado por iniciativa do Ministério da Educação em 2001.
Além disso, o dinheiro é distribuído de forma irregular. Em 2004, o gasto médio por aluno do ensino fundamental no Sudeste (R$ 101 por mês) representou o dobro do gasto no Nordeste (R$ 49,50 por mês), segundo o TCU (Tribunal de Contas da União).
E o gasto médio nacional com o estudante de universidades públicas é 14 vezes maior que com o do ensino básico, de acordo com a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). No Chile, em comparação, a diferença é de quatro vezes.
"É um equívoco colocar mais dinheiro na universidade", diz Gabriel Chalita, secretário da Educação do Estado de São Paulo. "Os países que melhoraram a educação mexeram no ensino básico, não no superior", completa. João Batista Oliveira, consultor na área de educação, concorda: "A taxa de retorno social [ganho para a sociedade] do ensino básico é muito maior que a do superior".
A solução para o problema do financiamento educacional no Brasil, em princípio, não gera discordância: todos os 12 especialistas que tocaram no tema acreditam que são necessários mais recursos ou, ao menos, sua melhor distribuição. De onde tirar o dinheiro, contudo, é a questão para a qual não há resposta definitiva.
A Constituição determina que o governo federal invista em educação ao menos 18% da receita líquida dos impostos (para Estados e municípios, o gasto mínimo é de 25%). Uma emenda constitucional, contudo, diminui esse valor. É a DRU (Desvinculação de Receitas da União), mecanismo que permite ao governo federal usar livremente 20% dos recursos destinados a gastos sociais, inclusive de educação. Com isso, os 18% vinculados constitucionalmente para os gastos educacionais da União caem para 14,4%. É uma diferença de R$ 4,3 bilhões.
Uma das maneiras de aumentar os recursos para o ensino público seria acabar com a DRU. Foi o que pediu o ministro da Educação, Tarso Genro, na proposta do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica). O Ministério da Fazenda, entretanto, vetou a idéia.
Acabar com a dedução do Imposto de Renda relativa aos gastos das famílias com educação seria outra fonte de recursos, segundo o relatório do Grupo de Trabalho sobre Financiamento da Educação. Cada família pode abater gastos de até R$ 1.998 por ano com ensino, o que reduz a arrecadação da Receita Federal em mais de R$ 1 bilhão todos os anos, afirma o relatório. Para o economista Gustavo Ioschpe, o fim dessa dedução corrigiria uma "distorção inaceitável, que é oferecer escola privada para os filhos dos ricos subsidiada pelo Estado".
Dinheiro em mãos, como distribuí-lo também causa polêmica. Quem cuida do ensino fundamental, em geral, são os municípios. Os Estados encarregam-se principalmente do ensino médio e a União investe nas universidades. Cristovam Buarque e Simon Schwartzman, presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade, defendem que o governo federal contribua mais com o ensino básico, desafogando os municípios.
Lisete Arelaro, chefe do Departamento de Administração Escolar e Economia da Educação da Faculdade de Educação da USP, acredita que é preciso mais. Ela prega uma reforma tributária que altere a atual concentração dos recursos nas prefeituras que arrecadam mais impostos.
Para tratar o problema, a iniciativa do Ministério da Educação é o Fundeb, atualmente em discussão no Congresso Nacional. Se aprovado, o fundo redistribuirá recursos do ensino básico entre as cidades, no âmbito de cada Estado. A redistribuição dos recursos entre os Estados, contudo, não é contemplada no projeto.
Leia relatório sobre financiamento da educação em
www.inep.gov.br/estatisticas/gastoseducacao/