São Paulo, sexta-feira, 22 de fevereiro de 2002
 

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Desinformação aumenta sofrimento

Andre Sarmento/ Folha Imagem
Thalita Lucchesi, 11, teve forte dores no pulso diagnosticado como "manha" até ser atendida na Central da Dor do Hospital do Cancêr (SP)


CÍNTIA CARDOSO
GIOVANA TIZIANI
DA EQUIPE DE TRAINEES

Falta de informação e preconceito fazem com que o Brasil não trate a dor tão bem quanto deveria.

A conclusão pode ser tirada a partir de dados do INCB (sigla em inglês para Organização Internacional para Controle e Fiscalização de Narcóticos) referentes ao consumo de morfina, principal analgésico no combate a dores moderadas e intensas.

Segundo o relatório, o Brasil consome 364 doses diárias por milhão de habitantes, enquanto a Dinamarca tem uma média de consumo diária de 6.962 doses.

Para o médico Antônio Carlos de Camargo, 49, chefe do centro de terapia de dor e cuidados paliativos do Hospital Amaral Carvalho, em Jaú, interior de São Paulo, a subutilização da morfina no Brasil é resultado do preconceito e ignorância da maior parte dos profissionais de saúde em relação à prescrição do medicamento.

A desinformação em relação à dor começa na formação dos profissionais de saúde. "Esse é um assunto pouco conhecido mesmo entre os médicos mais experientes ", afirma o médico José Oswaldo de Oliveira Jr., 48, fundador da Central da Dor do Hospital do Câncer (SP). Entre as 101 faculdades de medicina existentes no Brasil, cerca de 10 oferecem aos alunos a oportunidade de se familiarizarem com o tema.

Centros especializados em tratamento de dor ainda são poucos, cerca de 70 (1 para cada 2,5 milhões de habitantes), enquanto nos EUA existem 2.667 (1 para cada 104 mil).

Embora esses dados mostrem uma realidade pouco animadora, especialistas brasileiros afirmam que é crescente o número de artigos publicados sobre o tema, o que reflete um maior interesse da classe médica. Segundo João Augusto Figueiró, 50, médico psicoterapeuta do Centro de Dor do Hospital das Clínicas da USP, a assistência no Brasil deve melhorar nos próximos anos.

Figueiró apresentou ao Ministério da Saúde, em 1997, o Programa Nacional de Educação Continuada em Dor e Medicina Paliativa da Associação Médica Brasileira. Entre as propostas, está a inclusão da disciplina de terapia da dor no curso de medicina.

Será feita campanha nacional- nos moldes da que combate o câncer de mama-, organizada pela ONG Aliviador. Uma caravana vai percorrer 30 cidades para chamar a atenção da população e dos profissionais de saúde.

Em São Paulo, a associação, a prefeitura e o Hospital das Clínicas da USP estão treinando médicos para montar nos 41 distritos da cidade centros de tratamento da dor. Regina Milori Cosentino, uma das coordenadoras do projeto, explica que o objetivo é oferecer ao paciente com dor atendimento especializado já no posto de saúde próximo à sua casa.

Trabalho em equipe

Durante o tratamento, fatores biológicos, psicológicos e sociais são levados em consideração. Por essa razão, o atendimento envolve profissionais de diversas áreas .

Nos casos de pacientes fora de possibilidade de cura (com Aids ou câncer, por exemplo), a presença de uma equipe multiprofissional ainda se faz mais necessária para que o paciente e sua família aprendam a lidar com a doença.

Para isso, foram criados os centros de cuidados paliativos. No Brasil, a oferta desse serviço é limitada: são 21 unidades, segundo levantamento de Marco Tullio Figueiredo, chefe do ambulatório de cuidados paliativos da Unifesp. O número é baixo para atender aos mais de 300 mil doentes de câncer no país.

Segundo a OMS, 79% deles morrem com grande sofrimento."Só existe sofrimento demais porque existe medicina paliativa de menos", conclui Camargo.



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