Treinamento Folha   Folha Online
   
Novo em Folha 44ª turma
12/12/2007

Sede do sítio Itaim: História de uma ruína

FELIPE MODENESE
DA EQUIPE DE TREINAMENTO

A casa original da sede do sítio "Itaí" (que significa 'pedra pequena' em tupi) foi construída no final do século 18. Hoje é chamada de sede do sítio Itaim.

Por usar a técnica de taipa de pilão (que utiliza o barro como material de construção), a casa é considerada "bandeirista", caracteriza por sua arquitetura rústica, ser livre da influência do barroco português e ser considerada um marco das primeiras fases de ocupação, expansão e exploração do território paulista.

O primeiro registro da casa é de sua venda por Ana Joaquina Duarte Ferraz em1858.

O sítio teve alguns donos antes de ser comprado pelo general Couto de Magalhães, em 1896. Foi para lá que o herói da Guerra do Paraguai e último presidente da Província republicana de São Paulo se recolheu depois da Proclamação da República.

Seu filho José Couto de Magalhães fez algumas reformas como colocação de assoalhos e forração em alguns cômodos.

Por falência do proprietário, a casa foi arrematada em leilão, sendo que os familiares tinham preferência. Foi comprado pelo pai de Leopoldo Couto Magalhães, que tinha "Bibi" como apelido. Este fez o loteamento da extensa chácara chamada Itaim, sendo a venda completada em 1914. Estava nascendo o bairro Itaim Bibi.

Devido a crises financeiras, seu filho Arnaldo Couto de Magalhães disponibilizou a casa para aluguel.

Na década de 1940, começou a funcionar ali o sanatório Bela Vista, conhecido por receber e tratar doentes mentais de famílias abastadas.

Em 1944, o Instituto Ache, dirigido por Nestor Solano Pereira e Mário Yahn, comprou a propriedade.

Em 1977, a empresa Comercial Bela Vista, presidida por Flávio Solano Pereira, tornou-se proprietária do imóvel.

Por iniciativa de Aloísio Soares, antigo camiseiro da rua Iguatemi e presidente da Associação Amigos do Bairro do Itaim Bibi, o Condephaat foi acionado em 1978 para vistoriar a sede do sítio Itaim.

Foram constatadas as características bandeiristas da construção e "atestado o interesse pelo imóvel". Então, foi aberto o processo de tombamento

Um relatório do conselho (15/ 07/80) diz: "casa tem elementos modificados, porém, conserva ainda o partido bandeirista; reformas no início do século 20".

Folha (16/11/80)
"Em 20 de julho de 1980, um grupo liderado por Naji Nahas adquiriu o terreno para especulação"
Em 25/09/1980, diante da ameaça de ver o antigo sanatório Bela Vista ser destruído para dar lugar a um supermercado, a Associação Amigos do bairro do Itaim Bibi, através de
Aloísio Soares, pede, por carta ao presidente do Condephaat, a preservação da edificação sede do sítio Itaim, assim como de árvores centenárias do entorno da casa.
Naji Nahas foi comunicado do processo de tombamento em 5/11/80

Folha (8/11/80)
Notícia da destruição sem autorização da casa centenária.
Apesar da interdição impedindo qualquer alteração ou reforma, em 14/11/80, a Folha noticiou que as obras de demolição continuavam de madrugada, às escondidas, com a destruição de uma parede de taipa de pilão.

Folha (16/11/80)
"Parece que agora esse remanescente bandeirista está a salvo de maiores estragos".

Folha (18/11/80)
"Comercial Bela Vista S/A entrou ontem com pedido de demolição da casa bandeirista e de outras residências".

Folha (19/11/80)
Diz que os portões são arrombados para levantamento do patrimônio.

Autorização judicial para a Secretaria Estadual de Cultura realizar a cobertura do imóvel destelhado.

Em 21 de maio de 1982, foi publicado no Diário Oficial o tombamento da sede do antigo sítio Itaim como "monumento de interesse histórico arquitetônico" nos seguintes termos: "um exemplar remanescente da arquitetura rural paulistana do século 18, cuja construção em paredes de taipa de pilão obedece ao partido bandeirista, típico de construções residenciais rurais da época".

Em agosto do mesmo ano (1982), um acordo judicial entre Condephaat, Prefeitura e Comercial Bela Vista dá um prazo de 270 dias para a restauração da edificação. Feito o restauro, mantendo o imóvel em observação e dando um uso cultural para este, a empresa poderia construir edifícios residenciais e comerciais no terreno.

O prazo não foi cumprido e o imóvel está em degradação desde então.

O terreno em que jazem os restos da casa tombada têm 120 metros de frente para a avenida Faria Lima, 19 mil m2 de área, e pertence à empresa Bela Vista S/A. Está numa das regiões de maior especulação imobiliária do país. Ali o metro quadrado de área vale cerca de 30 mil reais, o que permite estimar o valor do terreno em 570 milhões de reais. Desde 1995, lá funciona um estacionamento.

Em 2002, o Ministério Público do Estado (MPE) exigiu "o início imediato da reconstrução da casa." Nada aconteceu.

Em agosto de 2003, um compromisso da Bela Vista S/A com o MPE definiu os termos de restauração completa da casa bandeirista. Pelo projeto, elaborado pelo escritório Helena Saia e Associados e aprovado por Condephaat e Conpresp, o patrimônio histórico seria recomposto e ficaria entre dois prédios comerciais.

Já se passaram quatro anos e a construção centenária continua derretendo. A promotora Claúdia Cecília Fedeli, responsável pela ação conta a empresa, disse que a execução demora, mas "vai acontecer".

Nos primeiros seis meses do cronograma seria feita a "limpeza cuidadosa do local". Ao iniciar esta fase, a prefeitura impediu a obra por falta de autorização para o manejo da vegetação. Desde então, entraves burocráticos impedem a restauração, mas não explicam a desproteção das ruínas da casa.

As ruínas das paredes de taipa continuam expostas a intempéries. Não apenas a restauração não foi iniciada, como nada foi feito para proteger o que resta do imóvel. Ainda assim, placas nas laterais do terreno trazem os dizeres:

Segundo o arquiteto e professor Pedro Taddei: "Qualquer infiltração faz com que a taipa esfarele e se transforme em massa. Quer dizer, uma parede de taipa de pilão não protegida pode se desfazer em um ano, seis meses. Quando se percebe, o imóvel cai. Por que não caiu durante séculos? Porque as pessoas usavam. Porque viam infiltração e logo trocavam telhas, faziam um madeirame".

A empresa que administra o imóvel, RS Administração e Construção Ltda, através de seu diretor, Teófilo Rocha, disse que a obra de restauração vai começar em 15 de janeiro de 2008. Ao que tudo indica, até lá, pelo menos, o que sobra da sede do sítio Itaim vai "tomar" toda a chuva de verão.

BLOG

BATE-PAPO PRÊMIOS ESPECIAL
Patrocínio

Content on this page requires a newer version of Adobe Flash Player.

Get Adobe Flash player


Philip Morris
AMBEV


Copyright Folha de S. Paulo. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress (pesquisa@folhapress.com.br).