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Novo em Folha 45ª turma
01/08/2008

Ignorância sobre lei de adoção faz bebê terminar em abrigo

ANDRÉ LOBATO
da EQUIPE DE TREINAMENTO

Com seis dias de vida, um casal querendo adotá-la e a mãe biológica em pós-parto, Rebeca (a pedido dos envolvidos, todos os nomes desta reportagem são fictícios) foi enviada para um abrigo e deve completar um mês de vida lá. O aniversário será em 12 de julho, um dia antes de o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completar 18 anos.
A decisão de negar a guarda ao casal para quem Úrsula prometera entregar sua filha coube ao juiz Raul Felice, da Vara da Infância e da Juventude do Fórum de Santana, na cidade de São Paulo. Ele afirma que, segundo o ECA, é preciso ter antes certeza de que ninguém da família biológica quer ficar com a criança.
Caso a família não queira, cabe à Justiça dar a guarda a um casal habilitado para a adoção. Nesse tipo de sentença, o juiz prioriza os interesses do bebê e não o sentimento dos pretendentes à adoção. "A adoção não é uma solução para quem não tem filho e sim para uma criança que não tem família."
Para 8 dos 9 juízes de varas da infância ouvidos pela <bf>Folha<xb>, a decisão foi acertada. Apenas um, o magistrado Antônio Carlos Alves Braga Júnior, da Vara de São Miguel Paulista, disse crer que, quando a decisão da mãe biológica de doar para determinado pretendente "é espontânea, natural e atende ao interesse da criança", o "Estado não deve intervir". Entretanto Braga diz que defende a adoção através do Cadastro Nacional de Adoção, em organização pelo Judiciário.

Patricia Stavis/Folha Imagem
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(fo1l)..

Boa fé

Assim como Felice, os demais juízes acreditam que é difícil determinar se há realmente boa fé nesse tipo de adoção. Para alguns, o fato de tentar adotar sem passar pelo cadastro é uma demonstração de má-fé; seria como furar uma fila.
Todos os ouvidos pela Folha, entre juízes e pessoas ligadas à adoção, como membros de ONGs e pesquisadores, temem favorecer o tráfico de crianças ao permitir que as mães escolham livremente para quem vão entregar seus filhos.
Úrsula, 28, e o casal Aguiar contam que seu encontro não foi premeditado: Renata Aguiar, 33, estava em um hospital quando ouviu uma moça dizer que cuidava de uma colega grávida querendo doar a filha. Ela se interessou e passou a dar atenção a Úrsula. Comprou cestas básicas, ajudou a marcar os exames e obter remédios. O casal Aguiar escolheu o primeiro nome da criança, que foi registrada como filha de Úrsula.
Diferentemente de outros casos de tentativa de adoção sem passar pelo cadastro, os Aguiar tentaram oficializar a guarda de Rebeca ainda recém-nascida. Normalmente os pais aguardam meses ou anos, quando é raro o juiz negar a adoção se o ambiente familiar for bom.
"Sugeri que a neném fosse registrada como minha filha e dele, mas não quiseram. Acho que ficaram com medo de eu querer a criança depois." E foi o que aconteceu. Após ver Rebeca no abrigo, decidiu, pela primeira vez, que quer cuidar da filha. Ela tem outras três, que não vê há mais de um ano e de cujos aniversários diz não se lembrar. Úrsula diz que não procuraria mais a filha se o juiz tivesse aceito a adoção. Hoje, diz sonhar com a "neném" e querer "ficar perto dela".
Analfabeta, ex-prostituta, Úrsula engravidou de um cliente num quarto do tamanho de uma vaga de carro onde ela morava, numa boate na zona leste. Independentemente do passado, ela tem direito de recuperar Rebeca. "Arrumei emprego em casa de família e vou morar com minha filha lá", diz.

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