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Sono
04/12/2004

Uma noite em busca do sono tranqüilo

LUÍSA BRITO
THIAGO REIS
Da equipe de trainees

A clínica é do sono, mas a preparação parece a de um salão de cabeleireiros. Pentes, presilhas e secadores de cabelo à mão, os técnicos Gilmar, Débora, Priscila e César se preparam para começar a sessão de "penteados". Os instrumentos são usados para abrir espaço no couro cabeludo e fixar os eletrodos que irão registrar a atividade elétrica do cérebro.

São 21h30 de sexta-feira, 19 de novembro, no Instituto do Sono da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), na capital paulista. Dois pacientes já estão nos quartos. Os outros seis aguardam a hora de ir para a cama. Eles mal olham a TV, ligada num canto alto da sala. Aproveitam para contar suas histórias e compartilhar os problemas da hora de dormir. Todos fazem o exame gratuito pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

Só uma paciente quase não fala. A dona-de-casa Santana Amorim, 60, é a única que tem insônia. Os outros acreditam sofrer de outro distúrbio, a apnéia (leia quadro na pág. Especial 3). Eles não se acanham em contar os problemas que o ronco já lhes causou.

A auxiliar de serviços Maria Inês de Oliveira, 60, por exemplo, diz que chega a dormir no trabalho e é alvo de gozação dos colegas. Seu chefe, revela, quase a despediu, sem pedir explicações.

A paciente espera a técnica Débora colocar os eletrodos em seu corpo (cabeça, rosto, peito e pernas) --"operação" que chega a demorar 30 minutos. Maria Inês fica imóvel. Não tem escolha: está coberta por fios, esparadrapos, usa duas cintas --uma sobre o tórax e outra sobre o abdômen-- e tem um aparelho no dedo para registrar a saturação de oxigênio.

Um a um, todos os pacientes, vestindo os pijamas trazidos de casa, vão sendo preparados para a polissonografia. O exame registra, durante o sono, a atividade cerebral, os movimentos oculares e as contrações dos músculos.

A aparelhagem, de início, assusta. "Vou ter de estar com muito sono para conseguir dormir", comenta o mecânico Flávio Firmino, 44. Operado para se curar de uma apnéia que o deixava até um minuto sem respiração, Flávio fazia o exame para saber se ainda vai precisar usar o CPAP (sigla em inglês para pressão positiva contínua das vias aéreas), aparelho que o ajuda a respirar pelo nariz.

Passar a noite em um lugar diferente mudou os hábitos da auxiliar de enfermagem aposentada Mercedes Pires, 59. Ela levou o travesseirinho que sempre coloca entre as pernas, mas acabou usando-o ao lado do rosto. Também não ficou virada de lado, como de costume. Permaneceu de frente e com os joelhos flexionados.

Apesar de ter dormido quase o tempo todo, Mercedes acordou queixando-se de cansaço e de o sono ter durado apenas meia hora. Segundo os técnicos, ela pode não ter entrado nas fases do sono profundo.

Noite sem terror

A madrugada foi tranqüila. Todos os pacientes, à 1h, já estavam na primeira fase do sono. Deu até para os técnicos se revezarem e tirarem um cochilo. Só os chamados dos pacientes os faziam levantar da cadeira, já que acompanhavam tudo pela tela do computador (na qual eram registrados os sinais dos eletrodos) e pela TV com as imagens dos quartos.

Mas a rotina não é sempre essa. Quando o paciente tem terror noturno ou distúrbio comportamental do sono REM (leia quadro), a atenção é reforçada. "Um cara já se levantou dormindo e quebrou o quarto todo. Os técnicos não puderam fazer nada. Ficaram na porta olhando para evitar que ele se machucasse", diz a técnica Débora Tang, 21.

Apesar de trabalhar num local onde o que importa é o sono, o técnico Gilmar Guedes, 34, dorme apenas quatro horas por dia. Nas madrugadas em que não está no instituto, ele é segurança do Hospital São Paulo. À tarde, faz curso técnico de enfermagem.

Hora de acordar

Seis horas. O primeiro "bom dia" é dado à paciente Hercília Silveira, 74. Ela acorda animada, diz que dormiu melhor que em casa e dá nota oito para a noite.

Pouco depois das 7h, todos estão acordados. Alguns tentam saber dos técnicos o que o exame revelou, mas ficam sem resposta. Para quem esperou mais de dois meses para ser atendido, aguardar uma semana até o resultado não é muito tempo.
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