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Sono
04/12/2004

Males do sono ganham nova classificação

Distúrbios passam de 80; médicos afirmam que diagnóstico é tardio

CARLOS IAVELBERG
Da equipe de trainees

João Wainer/Folha Imagem
Maria Inês de Oliveira, 60, realiza exame para avaliar a qualidade de seu sono
Embora existam dezenas de doenças capazes de prejudicar o sono, quem sofre com alguma delas pode levar mais de dez anos para descobrir e, então, iniciar o tratamento adequado.

Nesse período, quem tem um distúrbio de sono é tratado como indolente e preguiçoso. Em alguns casos, pode até morrer.

Para tentar diminuir essa demora e melhorar a troca de informação entre os médicos, a AASM (academia americana de medicina do sono) deve divulgar uma nova Classificação Internacional dos Distúrbios do Sono em 2005.

A Folha teve acesso a uma versão preliminar da nova lista. Por enquanto, não é possível afirmar quantas doenças serão classificadas, mas médicos brasileiros que também viram a relação dizem que elas serão cerca de cem. A atual lista, editada em 1997, contém 88 distúrbios.

Para fazer a nova versão, o psicólogo Peter Hauri, da AASM, chefiou uma equipe de cerca de 80 especialistas internacionais que analisaram pesquisas sobre distúrbios do sono por dois anos.

"A importância do trabalho é que pessoas de diferentes países e que falam diferentes línguas podem conversar entre si porque têm as mesmas definições dos distúrbios", diz Hauri.

Médicos afirmam que, como muitas vezes as pessoas dormem menos do que as oito horas aconselháveis por causa de algum desses distúrbios, a nova classificação é uma ferramenta importante.

"Sabemos que uma doença do sono pode influenciar negativamente a vida do sujeito quando ele está acordado. Um indivíduo que dorme mal corre maior risco de ter acidente de trânsito e acidente pessoal", diz o neurologista Ronaldo Guimarães Fonseca.

Distúrbios

Da insônia à apnéia, que provoca paradas respiratórias durante o sono, alguns distúrbios podem levar à morte se não forem tratados.

Foi o que o jornalista Márcio Durigan, 40, ouviu de seu médico há dez anos, depois de realizar a polissonografia --exame que avalia a qualidade do sono.

Durante as oito horas em que foi monitorado, Durigan teve 800 paradas respiratórias, chegando a ficar 1min40s sem respirar.

Em casos graves como esse, a apnéia, que pode começar com um simples ronco, causa pressão alta e problemas cardíacos.

Mesmo que se durma oito horas por noite, a doença impede que o sono seja de boa qualidade e faz com que a pessoa acorde cansada. Por isso, Durigan passou 13 anos dormindo mal e com sonolência excessiva durante o dia.

Até descobrir o problema, o jornalista conta que sofreu preconceito. "A apnéia traz complicações sociais e profissionais muito sérias. Você passa a ser o vagabundo, o indolente, o cara que não tem vontade para nada e está sempre cansado", afirma.

A solução para Durigan foi usar um aparelho chamado CPAP (sigla em inglês para pressão positiva contínua das vias aéreas), que auxilia a respiração durante o sono. Logo na primeira noite com ele, o número de paradas respiratórias do jornalista caiu para 11.

Diagnóstico tardio

Antes de descobrir que tinha apnéia, Durigan procurou médicos que não diagnosticaram seu problema. A suspeita de que sofria da doença veio depois de ler uma reportagem sobre o assunto.

Dos primeiros sintomas até o diagnóstico, Durigan levou 13 anos para descobrir que tinha apnéia. Especialistas afirmam que a demora em diagnosticar algumas doenças do sono varia, em média, de 8 a 12 anos.

A estudante de direito Joana (nome fictício), 26, também encontrou dificuldades para saber que tinha narcolepsia --doença do sistema nervoso central que causa sonolência excessiva diurna e que pode levar a pessoa a ter sonos curtos de 10 a 25 segundos.

Joana só desconfiou que seus cochilos eram uma doença depois que sua tia viu uma reportagem na televisão. A estudante passou a pesquisar o distúrbio na internet. "De todas as características de um narcoléptico, se eu não tinha 100%, tinha 98%", recorda.

Além de sofrer quatro acidentes de carro porque dormiu ao volante, Joana tinha dificuldades para se manter acordada durante as aulas e concentrada para ler os livros da faculdade.

Agora, depois que iniciou o tratamento com remédios, comemora. "Estou lendo o primeiro livro em muitos anos. Ontem consegui ler 46 páginas e nem acreditei", conta, enquanto aponta para a mesa ao lado da cama onde está "O Poder da Cabala".

O estudante de música da Universidade Estadual Paulista Sebastião (nome fictício), 24, também sofre de narcolepsia. Além da dificuldade em se concentrar, ele enfrenta a cataplexia --perda repentina de força muscular-- que, em geral, está relacionada a alterações de emoção ou estresse.

Em momentos de nervosismo ou felicidade, o narcoléptico pode desfalecer. Isso porque, enquanto está acordado e consciente, seu corpo está dormindo, como se estivesse no estágio mais profundo do sono, o REM (leia quadro na pág. Especial 2).

Em uma ocasião, enquanto assistia a uma peça humorística, Sebastião (nome fictício) perdeu toda a força do corpo depois de dar gargalhadas. "Estava na cadeira assistindo à peça e fiquei jogado para o lado. Minha namorada teve de me puxar e me endireitar", conta.

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