Treinamento Folha   Folha Online
   
Sono
04/12/2004

Noites em claro inspiram artistas

PAULA LEITE
Da equipe de trainees

Samir Baptista/Folha Imagem
O artista Luiz Paulo Baravelli em seu ateliê, onde trabalha à noite
Glauco Mattoso acorda depois de um pesadelo, como acontece praticamente todas as noites. Não consegue voltar a dormir. Para passar as longas horas de insônia (ele fica oito horas na cama, mas diz que dorme cerca de metade disso), compõe poemas mentalmente. Mattoso memoriza os poemas e no dia seguinte não precisa mexer muito neles. O tema deles, muitas vezes, é a seqüência noturna de sono, pesadelo, vigília, orgasmo e sono novamente por que ele passa.

O poeta perdeu a visão há cerca de dez anos e tem pesadelos por causa disso. "Meus pesadelos, depois que eu fiquei cego, são muito nítidos. Eu me lembro de tudo por causa da memória visual. Quando acordo, o susto é maior ainda, porque aí eu lembro de novo da cegueira."

Mattoso, 53, não quer tomar remédios para insônia: "Se eu começar a usar, eu sei que não vou parar mais". Ele toma chá para se tranqüilizar e também tem orgasmos para relaxar. Para Mattoso, o sexo é uma espécie de terapia.

O poeta diz que as coisas que aconteceram com ele se repetem nos pesadelos. "No sonho, eu sou cego, mas vejo tudo o que acontece em volta e está tudo colorido. Ou então eu sonho que estou enxergando e vou ficar cego. Esses são os mais apavorantes."

Milton Hatoum, 52, escritor, acredita que sua insônia não tem efeitos negativos. Ele não consegue dormir antes das 2h, mas acorda entre 6h30 e 7h, por força do hábito. Em Manaus, onde morava, Hatoum acordava cedo porque gostava do sereno das manhãs. "Sou de uma região onde ainda existe uma alegria solar", diz. Ele mora em São Paulo desde 1999, mas já tinha morado na capital paulista nos anos 70.

Autor de "Relato de um Certo Oriente" e "Dois Irmãos", Hatoum diz que a noite está presente em sua obra e cita a personagem surda-muda do "Relato", guiada por uma sensibilidade noturna. "Muita gente vê a insônia como um transtorno. Eu acho que é uma espécie de iluminação."

Assim como Hatoum, o artista plástico Luiz Paulo Baravelli valoriza a luz, mas gosta da elétrica, que o ajuda à noite. Ele diz que seu trabalho tem a ver com essa luz difusa. Seu ateliê na Granja Viana tem a iluminação dividida por seções e ele gosta de poder controlar a luz, apagando uma seção e acendendo outra para poder se concentrar cada vez em uma obra diferente.

Baravelli acha também que a introspecção é natural à noite. Ele só pinta nesse período. Durante a tarde, faz coisas práticas, como ir ao dentista ou mexer na oficina.

Segundo o artista, muitos acham que sua vida é uma farra, mas, na verdade, sua rotina é disciplinada. Ele dorme às 6h e acorda às 15h todos os dias, e come em horários regulares, só que seis horas depois da maioria das pessoas.

Baravelli diz que segue esse horário desde criança. Ele conta que, no final dos anos 40, havia um programa de músicas no rádio ("do Miguel Vacaro Neto", conta) que começava às 23h. Baravelli tinha 12 anos e ficava escutando o programa escondido, debaixo das cobertas, em vez de dormir.

Rodrigo Andrade, 42, artista plástico, gosta do sossego da noite. Ele se considera notívago e sente necessidade de ficar sozinho e em silêncio. O artista diz que, enquanto de dia pensa em outras coisas, à noite ele cria um "espaço mental" e pensa no trabalho.

Leia mais
  • Soneto insone
  • BLOG

    BATE-PAPO PRÊMIOS ESPECIAL
    Patrocínio

    Content on this page requires a newer version of Adobe Flash Player.

    Get Adobe Flash player


    Philip Morris
    AMBEV


    Copyright Folha de S. Paulo. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress (pesquisa@folhapress.com.br).