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São Paulo, sábado, 25 de setembro de 2004

FOLCLORE

O travesso de uma perna só foi criado há 200 anos, na fronteira com o Paraguai; agora, estudiosos querem preservar e divulgar a lenda

O pulo do saci

ERIKA SALLUM
FREE-LANCE PARA A FOLHINHA

Sabe quando você perde o caderno da escola ou o brinquedo preferido some de repente? E quando sua mãe deixa a comida queimar no fogão sem mais nem menos? Ou um pé do tênis desaparece do nada? Em alguns lugares, dizem que tudo isso é culpa do saci...
Endiabrado, levado da breca, arteiro dos bons, ele adora fazer estripulias e assustar as pessoas. É uma peste! Se vê um cavalo sozinho no pasto, lá vai ele fazer tranças nas crinas. Quebra louças da cozinha, bota fogo na roça, derrama sal nas panelas. Êta, serzinho danado. Você já viu um saci por aí?
Para quem não conhece, o saci é um dos mitos mais famosos do Brasil, assim como a mula-sem-cabeça e o lobisomem, entre outros. Mitos são seres criados pelo povo de uma região para explicar fenômenos da natureza ou aspectos da vida. Cada país tem vários mitos e lendas que ajudam a contar sua própria história. Por isso é importante conservá-los.
Pensando nisso, um grupo de historiadores se uniu para divulgar e preservar o saci. "Sabemos o que é Halloween e Dia das Bruxas, festas norte-americanas", diz a historiadora da USP Marcia Camargos, da Sosaci (Sociedade dos Observadores de Saci, www.sosaci.org). "Estamos esquecendo os personagens da nossa cultura popular."
Existe ainda a Associação Nacional dos Criadores de Saci, que também divulga tudo o que envolve esse diabinho de uma perna só.
A Sosaci já promoveu o Grito do Saci, em São Luís do Paraitinga, e outras "aparições" do personagem. Agora, luta para criar um dia nacional para o Saci.
O saci surgiu há cerca de 200 anos, na fronteira com o Paraguai. Quem o criou foram os índios guaranis, que na língua deles chamavam a pequena criatura de Çaa cy perereg.
Depois, as histórias foram conquistando fama por todo o país. Se no início o saci era índio, foi aos poucos virando negro e perneta, modificado pelas escravas africanas que adoravam contar a lenda para as crianças. Ganhou um cachimbo e até um gorro vermelho, que concentra toda a sua força.
"Como os negros escravizados, o saci não tinha total liberdade, pois era aleijado. Porém dribla todos os problemas com sua esperteza", explica a historiadora.
Séculos depois de surgir, o saci virou tema de livro de Monteiro Lobato, o inventor do "Sítio do Picapau Amarelo".
Quer pegar um saci? É só segurar uma peneira e esperar um dia de vento bem forte. Quando você vir um redemoinho de poeira, pronto! É só jogar a peneira em cima. Ah, e não se esqueça: deve-se tirar rápido o gorro de sua cabeça, assim ele fica fraquinho, fraquinho. Guarde-o numa garrafa, tapada com uma rolha marcada com uma cruz. Boa sorte!

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