São Paulo, sábado, 1 de janeiro de 1994
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Futuro do cinema depende da relação com imagem eletrônica

JOSÉ GERALDO COUTO
DA REPORTAGEM LOCAL

O cinema tem futuro? As vésperas de seu centenário, a chamada sétima arte parece, para muitos, prestes a ser substituída pela oitava –a arte do vídeo, com todos os seus desdobramentos (TV interativa, realidade virtual etc.).
O professor de comunicação visual Arlindo Machado, da USP e da PUC, é um dos que acreditam firmemente que o cinema, "tal como o conhecemos hoje", tem seus dias contados. Em artigo publicado no último número da "Revista USP", Machado explica por que considera inevitável a substituição do espetáculo cinematográfico por outras formas de produção e recepção audiovisual.
Em primeiro lugar, os custos da produção cinematográfica crescem 16% ao ano, o que tende a inviabilizá-la economicamente. Em segundo lugar, os hábitos urbanos estão mudando –e cada vez menos pessoas estariam dispostas a sair de casa para ver um filme, quando têm a TV à mão.
Para os que consideram sombria esta perspectiva, dada a indiscutível perda de qualidade da imagem na substituição do cinema pelo vídeo, Machado responde com otimismo, e por duas vias opostas. De um lado, existe a TV de alta definição, que tende a uma nitidez de imagem semelhante à do cinema. De outro, a baixa definição da imagem eletrônica pode ser vista como um ganho, pois ajudaria o cinema a libertar-se da "concepção estética do século 19 a que está preso", e caminhar rumo à abstração, tendência geral das artes plásticas no século 20.
Se o cinema vai acabar, o certo é que não vai ser assim tão cedo. Nos EUA, pelo menos, vai-se cada vez mais ver filmes. Em 1985, 118 milhões de americanos foram ao menos uma vez ao cinema. Em 1992, segundo a revista "Première", esse número subiu para 149 milhões. Ainda em 92, foram vendidos 964,2 milhões de ingressos nos EUA, contra 957 milhões em 1977 (ano de introdução do vídeo). A indústria americana produziu 431 filmes em 92.
Se em países como os EUA, a China e a India o cinema continua sendo um entretenimento de massas, na maioria dos outros países é provável que ele esteja se convertendo aos poucos num programa restrito a uma minoria –como o teatro e a música erudita.
Como definiu em editorial a revista francesa "Cahiers du Cinéma" em seu número de outubro: "O cinema de hoje é menos um negócio público que um espaço privado que diz respeito a um espectador em particular, mais que a uma massa indiferenciada".
Para Adhemar de Oliveira, programador do Espaço Banco Nacional de Cinema e organizador da Mostra Banco Nacional, as mudanças de hábitos urbanos não estão acabando com o cinema, mas sim determinando uma redefinição de seu espaço social, ao menos no Brasil: "São as salas isoladas, sobretudo as do interior, que estão fechando. Em contrapartida, estão abrindo novas salas em shoppings. A consequência disso é que o cinema já não é uma diversão tão popular. Está cada vez mais restrito a uma determinada faixa da população".
A perda do caráter de entretenimento de massa traz, paradoxalmente, algumas vantagens. Oliveira observa que uma parte do mercado exibidor que, até três anos atrás, era ocupada só pelo cinema americano hoje exibe uma produção mais variada: filmes chineses, mexicanos, espanhóis, ou seja, títulos que atingem um público mais interessado no cinema como conhecimento do que como mera diversão.
Aníbal Massaini Neto, presidente do Sindicato da Indústria Cinematográfica de São Paulo, dá mais um motivo para a sobrevivência do cinema: mesmo que um filme seja consumido predominantemente no vídeo ou na TV, o lançamento nas salas é cada vez mais importante para sua divulgação. "O cinema é hoje uma vitrine para divulgar os títulos que irão depois às outras mídias". (JGC)

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