São Paulo, sábado, 1 de janeiro de 1994
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EUA e Europa puxam recuperação em 94

PAUL SAMUELSON

Em termos econômicos, 1993 foi um mau ano para a Europa e o Japão. A produção global total não cresceu nos níveis esperados. O desemprego total agravou-se.
Surpreendentemente, foram os EUA do presidente Clinton que se deram melhor entre os países industrializados, especialmente no final do ano. No último trimestre de 1993 parece haver ocorrido uma inesperada aceleração do crescimento americano.
A confiança empresarial e dos consumidores aumentou. O índice de desemprego caiu para menos de 6,5% e a criação de empregos tem sido acelerada. O PNB do quarto trimestre pode muito bem atingir 4% anualizados.
A locomotiva americana não apenas impeliu a atividade econômica nacional –também puxou para cima a produção de outros países destinada à exportação. Infelizmente, as locomotivas alemã e japonesa estão paradas. Chegaram até a retroceder.
O que vai acontecer em 1994?
Vejo indícios de um início de recuperação européia. Reino Unido e Itália são exemplos de sucesso ao separar-se do malfadado câmbio fixo do Sistema Monetário Europeu. O Bundesbank alemão deveria passar a ver a lógica dos estímulos ao crédito através de reduções nas taxas de juros.
Ainda não há perspectiva de qualquer recuperação liderada pela Alemanha. Eu abrigo a esperança de que França, Holanda, Espanha e Bélgica desistam de sua vã cruzada para manter a paridade com o marco. Quando elas voltarem a si, começarão a arquitetar reduções das taxas de juros.
Sim, isso pode levar suas moedas a depreciar-se com relação ao marco. Mas isso não seria uma tragédia com consequências inflacionárias. Será uma oportunidade para reduzir seus níveis de desemprego e estimular a atividade comercial. Já a nova força dos EUA deverá valorizar o dólar.
Isso nos remete à questão do futuro econômico do Japão, hoje visto como uma das economias mais decepcionantes do mundo. Antes, era muito invejado.
Dizia-se que o Japão tinha novos padrões de administração de empresas. As decisões eram tomadas por consenso, em lugar de unilateralmente. O planejamento era a longo prazo. As empresas e seus bancos teriam "bolsos fundos", dos quais pacientemente tirariam dinheiro para melhorar seus produtos e sua participação no mercado até um futuro distante. O emprego vitalício seria garantido e não haveria demissões.
Essa imagem sempre foi excessivamente lisonjeira. Agora, os observadores estão indo longe demais na direção crítica.
Não só os estrangeiros ficaram desiludidos. Alguns amigos japoneses me contam que esta recessão criou uma espécie de crise de identidade. Eles se perguntam: "Será que nos tornamos confiantes demais e nos perdemos? Quando é que a obediência a um princípio convencional firme vira orgulho vão e oneroso?"
Meu diagnóstico condena o governo japonês por promover políticas erradas: pouco demais e tarde demais. Imitando o Bundesbank, com seu temor paranóico da inflação e sua indiferença quanto às fraquezas de sua produção, o Banco do Japão será condenado pela História por sua demora em facilitar o crédito.
Nas primeiras décadas do pós-guerra, apesar de não serem bem treinados em economia e finanças, os burocratas dos Ministérios das Finanças e de Indústria e Comércio Internacional fizeram um bom trabalho ao ajudar as empresas e o desenvolvimento social. Mas desde 1988 eles têm tido a tendência a operar como um Estado dentro do Estado, praticamente sem se submeter aos governantes eleitos, fracos e corruptos. Os burocratas vêm resistindo aos esforços de sucessivos primeiros-ministros para introduzir estímulos fiscais –que viriam em boa hora, para que o Japão pudesse cumprir suas promessas internacionais de diminuir sua dependência do crescimento dirigido à exportação.
Os atos do novo premiê, Morihiro Hosokawa, à frente de uma coalizão reformista, estão se revelando decepcionantes. O Japão possui reservas internacionais. Suas condições de inflação são excelentes. A dívida pública do país é uma fração menor de seu PNB do que a de qualquer outro país desenvolvido.
O governo japonês tem condições de impelir sua locomotiva econômica. Hoje, em 1994, existe uma ótima oportunidade para isso. Mas a coalizão é fraca e está dividida, enquanto o velho Partido Liberal Democrático opõe resistência às ações construtivas.
Assim, a Europa terá que depender em grande medida de si própria para uma recuperação em 1994. Devemos parar de falar numa locomotiva alemã. França, Holanda, Espanha, Portugal, Itália e Reino Unido pesam muito mais do que a Alemanha.
Quando eles e a Escandinávia ousarem agir por conta própria, será mais fácil obter bons resultados. Isso ficou comprovado em 1931-37, quando boa parte do norte da Europa juntou-se ao Reino Unido na depreciação do câmbio e conseguiu bons anos de recuperação antes das nações que (como a França) se ativeram teimosamente ao padrão-ouro.
Índices de desemprego de dois dígitos na Europa não são inevitáveis nos anos 90. O pior já deve estar para trás. Sem dúvida, 1994 deverá ser melhor do que 1993.

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