São Paulo, domingo, 2 de janeiro de 1994
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Humor dá o tom nos filmes da virada de ano

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Para onde você virar o rosto, há um filme para ver neste começo de ano. A principal estréia dá o tom do começo de temporada: as comédias é que estão dando o tom. Quem está de volta é a saga da Pantera Cor-de-Rosa. Agora, é Roberto Benigni que aparece, como o filho do célebre inspetor Clouseau.
Em "O Filho da Pantera Cor-de-Rosa", Jacques Clouseau Jr. se mostra quase tão capaz quanto o pai de transformar uma investigação policial em catástrofe. Mas, vá com calma: nem Benigni consegue ser tão engraçado quanto Peter Sellers –que fez Clouseau de 1964 até morrer, em 1980–, nem o diretor Blake Edwards parece ter a energia dos outros tempos.
Edwars parece muito feliz de reencontrar seu velho personagem. Woody Allen, ao contrário, parece mais contente à medida que se distancia de Mia Farrow. Embora realizado em meio à separação mais que litigiosa do casal, "Um Assassinato Misterioso em Manhattan" transborda de energia e entusiasmo. O reencontro com Diane Keaton –ótima comediante– ajuda e a presença de Alan Alda e Anjelica Huston no elenco não faz mal algum.
Woody Allen chega a um momento em que domina plenamente o ecletismo, território que corteja há anos. Em "Assassinato" existe mistura de gêneros, referência a outros filmes, comparação, distinção. De quebra, o filme fala sobre uma preocupação permanente do diretor –a vida afetiva– sem deixar no público a impressão de que está vendo um carbono de Ingmar Bergman caído por desastre em Manhattan.
É um filme sem gênero: noir e suspense, comédia e romance. Funciona em todos os registros, mas o da comédia é privilegiado. De todo modo, a comédia é a do mal-estar afetivo, nessa história de um casal entediado que, a horas tantas, começa a suspeitar de que a morte ocorrida no apartamento ao lado foi, na verdade, um assassinato.
Quem se lembrar do "Janela Indiscreta" de Hitchcock não estará errado. Só que aqui Diane Keaton aproveita a aventura para flertar com o escritor Alda. Apesar disso, ninguém espere nenhuma referência ao "affaire" Allen/Farrow. São os delicados movimentos do coração que dão consistência à trama.
Outro que está em forma é Mario Monicelli, o decano da turma. Seu "Parente É Serpente" narra um encontro familiar de Natal: belo pretexto para atacar uma Itália cada vez mais distante da pobreza do pós-guerra (quando Monicelli filmava comédias de Totó) e onde a mesquinharia de classe média triunfa, ao menos segundo o seu olhar.
O que está ali é o melhor Monicelli: a um tempo grosso e sutil, sem qualquer complacência com as baixezas da espécie, mas capaz de arrancar gargalhadas dessa matéria-prima ingrata.
Não dá para esquecer, por fim, "Muito Barulho por Nada". O filme deve muito a Shakespeare e muito pouco a Kenneth Branagh, diretor e onipresente ator. Desta vez ele joga ralo a baixo até o talento de Emma Thompson. Mas o texto está lá para provar que aguenta qualquer parada.

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