São Paulo, quarta-feira, 12 de janeiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Decepção na universidade

FRANCIS HENRIK AUBERT

Em artigo publicado em 18 de novembro, Charles Barnsley Holland aponta o que considera alguns dos problemas de nosso ensino universitário, destacando o desinteresse dos alunos, as salas vazias e os pátios cheios, os feriados emendados, as "semanas do saco cheio" etc.. E deriva desse quadro a constatação: "Podemos concluir que grande parte do nosso ensino universitário está falido."
Embora a intenção seja manifestamente boa –e não há como não endossar a declaração de que "é necessário levar a sério o ensino universitário"–, o texto do sr. Holland apresenta algumas confusões de perspectiva e algumas generalizações excessivas.
Com efeito, as faltas, as semanas disto ou daquilo não constituem um problema, mas um sintoma de um problema: a desmotivação. Tal desmotivação não se prende meramente a questões de ordem circunstancial, tais como o eventual despreparo de um ou outro docente, a precariedade das bibliotecas (nem todas!) e similares, nem necessariamente aos fatores conjunturais externos à universidade (desvalorização salarial da competência acadêmica).
Há, também, fatores internos à instituição, de natureza estrutural, que exercem um peso determinante na desmotivação do alunado. Vista na ótica do aluno, a realidade do cotidiano universitário só pode induzir à decepção. Pensando superado o trauma do vestibular, o estudante se descobre participante de uma corrida de obstáculos aparentemente acadêmicos mas, em sua essência, de natureza intrinsecamente burocrática.
Sistema de créditos, de matrículas e rematrículas, avaliação isolada por disciplina, currículos mínimos defasados, interdisciplinaridade programática travada pela atomização do saber. Esses e tantos outros obstáculos construídos sobre a ridícula premissa de que independentemente de seu efetivo desempenho acadêmico, se não cumpriu o ritual de "assinatura de ponto", isto é, se não atingir determinada frequência mínima em cada disciplina, por menos estimulantes que sejam as aulas ou por mais conhecimento prévio ou capacidade autodidata que possua, ser-lhe-á exigido refazer a mesma disciplina, pois, pela lógica do sistema, a única coisa que realmente importa para a progressão do aluno é o que se faz (ou comete?) entre as quatro paredes da sala-de-aula, campo privilegiado do autoritarismo infantilizador do magister dixit, sem qualquer espaço para sublimações mais criativas, sem qualquer incentivo para a busca da verdadeira autonomia intelectual. E ainda há quem se surpreenda com o grau de evasão da universidade, mesmo quando pública e gratuita!!

Texto Anterior: Pernambuco 1; 2; Sergipe 1; 2
Próximo Texto: PM vai apurar agressão a presos em SP
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.